terça-feira, janeiro 30, 2018

"A onda conservadora e o risco de uma 'nova normalidade'

Abaixo o blog reproduz o interessante artigo do Reginaldo Moraes publicado originalmente aqui no bom e conhecido portal Carta Maior.


A onda conservadora e o risco de uma 'nova normalidade'

Há uma estória antiga, dizendo que quando a gente está com medo fica assobiando no escuro. Uma reação infantil, claro, mas acalma. Por vezes, botar no papel as ideias tem esse efeito. E pode ser que sirva também para os outros. Então, aí vai mais um assobio no escuro.

Tenho amigos que faz algum tempo passaram a reduzir a importância do que chamam de “a politica” ou da “política institucional”. Nesse rótulo o que se incluía, principalmente, eram os partidos e as eleições.

Compreensível. Por outro lado, começaram a enfatizar a importância de movimentos políticos “setoriais”, temáticos ou identitários, nichos de afirmação, etc. Compreensível. Esses espaços lhes pareciam imunes às perversões e compromissos da tal “política institucional”. Eles se multiplicaram e trouxeram temas novos e vida nova à esquerda. O que também é verdade.

Por conta dessa proliferação de movimentos pontuais, sem vínculos partidários e muitos, até, avessos aos partidos, alguns amigos comentavam, esperançosos, que as pessoas se distanciavam da “política institucional”, principalmente das eleições e partidos e que isso poderia significar um avanço e não um recuo, um avanço de politização, não o contrário. Compreensível, tem uma certa verdade, não?

Sim, tudo isso tem elementos de verdade. Contudo, para acrescentar uma dose de ceticismo preventivo, diria que o distanciamento do mundo torpe das eleições e dos partidos não foi proporcionalmente acompanhado ou compensado, de fato, por um aumento da política não institucional, daquela frequentemente identificada com associação horizontal, ação direta, democracia participativa ou coisas assim. Apenas com muito boa vontade alguém afirmaria isso, mesmo diante da proliferação desses movimentos e nichos. Não me parece correto afirmar que o descrédito da “política”, velha política, ou, resumindo, eleições, tenha sido compensada por um fervilhar equivalente de movimentos extrainstitucionais, manifestações não-eleitorais e não partidárias de participação política.

Com boa vontade, tendemos a incluir numa genérica “esquerda” tudo isso: não apenas os tradicionais partidos, sindicatos, movimentos políticos, mas, também, os movimentos sociais e setoriais (ecologistas, de gênero, de orientação sexual, etc). Isto me parece adequado. Essa soma toda seria o movimento de contestação, de contraposição aos famosos “1% de cima. Alguns de nós dizem algo parecido com isso: “somos os 99%”, foi até um lema de movimentos como o Occupy Wall Street. Servia para destacar a representação da maioria frente à minoria privilegiada. Erro tremendo. 

Primeiro, porque a minoria mandante não é nem poderia ser dos 1%. É feita de pelo menos 20% dos adultos e vacinados - dos grandes oligarcas, claro, mas também de seus acessórios funcionais, seus mordomos espalhados pelo aparato político, pela administração da vida cotidiana e pelos aparatos de hegemonia ideológica, como a mídia, a igreja e assim por diante. Segundo, porque nós, a esquerda, não chegamos nem mesmo aos 1%. Nós não somos, de fato, os 99%. Pouquíssima gente está “entre nós”, se por isso entendemos gente que, para nivelar por baixo, tem pelo menos duas ou três atividades políticas durante o ano (mobilização, passeata, o que seja). Nem de longe. Lembro de uma frase do Fidel a seus companheiros, quando estavam em Sierra Maestra, iniciando a caminhada: “se nós fossemos apenas quantos somos, seria melhor desistir; mas atrás de nós estão milhares e milhões de explorados e oprimidos”. Verdade e pode ser estimulante, mas não deve embriagar a fria reflexão.

O fenômeno central dos últimos tempos não foi o avanço da direita no terreno institucional - partidos, eleições. O eleitorado da direita, por exemplo, é fiel mas relativamente o mesmo, cresce um pouco ali, diminui acolá, mas flutua em torno do mesmo nível. O que talvez tenha crescido mais do que a média foi a disseminação da apatia, da indiferença, da desmobilização, do “tanto faz!”. Isso foi a troca relevante, mais do que vitórias da direita em eleições, por exemplo. Com esse movimento lento e quase imperceptível, tão homeopático que quase não percebemos, enraizou-se a hegemonia das ideias, valores e comportamentos conservadores.

Agora e aqui, com os últimos movimentos, essa hegemonia deu um passo mais. De certo modo, pode ter dado um salto de qualidade e veio à luz, explodiu na nossa cara – daí muita gente se espante com seu vigor, sua ousadia. A direita (e até a ultradireita) traduz agora na “política institucional” o avanço que obtivera no terreno da hegemonia social, comportamental, ideológica. A oligarquia aboliu o que restava de espaço institucional, cancelando ou tornando inócuas as disputas eleitorais, as brechas que tinham sido abertas desde as “diretas-já” dos anos 80. E essa onda não tem hora para acabar. Não vai parar na porta das politicas setoriais, identitárias, dos nichos aparentemente “apolíticos” das “políticas não institucionais”. A onda vai passar por cima e reprimir sem dó todos esses segmentos e movimentos horizontais que supostamente ficam à margem da política. Não nos iludamos, os fascismos não preservam nada que tenha cheiro de democracia, progressismo. Nem cheiro.

Para os mais velhos, melhor avivar a memória, Para os mais jovens vale a pena lembrar o que já leram nos livros: a ditadura resultante do movimento de 64 não mudou apenas os governantes. Não liquidou Jango apenas. Rapidamente “limpou” sindicatos, grêmios estudantis, o que houvesse pela frente. Fechamento, prisão, exílio, cabeça baixa. Ano e meio depois do golpe, cancelou as eleições, sem mais. E foi implantando, pouco a pouco, um medo que não se reconhecia como tal, um medo que sequer reconhecia que era medo, um medo que se tornava a aceitação de uma nova “normalidade”. Era essa a normalidade que eu vivia (tanto quanto lembro) quando comecei a participar do movimento secundarista, ali por 1966. E que se alongou por muitos anos.

No primeiro momento, o novo regime garantiu a propriedade. Depois, a tradição e a família, abafando e tornando perversões as ideias e comportamentos dissidentes. É assim que se firma a “nova realidade”, se “normaliza” o golpe.

Estamos diante dessa possibilidade. Não de uma mudança de governo. Já repetimos isso dezenas de vezes. Estamos diante de uma mudança de regime. E, agora se torna mais visível outra coisa: trata-se também de uma mudança de padrão na vida cotidiana. A instauração de um medo genérico e uma censura prévia no pensamento. Está aberto o caminho do medo e da “normalidade” ultraconservadora. Vai vingar? Depende de muita coisa, principalmente da percepção e da reação das vítimas.

segunda-feira, janeiro 29, 2018

O fim da neutralidade da internet reproduz o passado, com a captura do sonho de uma polis com uma sociabilidade sem controles e democrática

Ao tentar observar e analisar o processo histórico nas relações sociais, talvez seja possível identificar alguma analogia entre a formação das cidades – com os atrativo da convivência na polis - do passado, com a realidade das redes e da internet nos dias atuais.

Na mesma medida em que as cidades apareceram no passado como uma semente de liberdade que adiante possibilitou a destruição do feudalismo, com o sonho da possibilidade do homem livre, da liberdade de escolha, o sonho das comunicações em redes nos fez sonhar.

No passado, rapidamente, os controles e o utilitarismo mercantil se instalaram. A concentração de pessoas e a expansão das demandas deram margens para o mercantilismo e para a instalação do capitalismo com as suas conhecidas garras.

Numa até pueril analogia, se pode também afirmar que no mundo contemporâneo, a internet e as comunicações em redes nasceram em sua gênese com o estímulo à pluralidade de ideias, de ampliação do acesso às informações e trocas diretas entre produtores e consumidores das notícias que seria em benefício de todos.

Porém, repetindo o passado, novamente, se observam as garras do poder econômico e do capitalismo capturando os instrumentos. Assim, se impõem de forma ainda mais incisiva, o controle do poder econômico sobre o poder político (Estado) – ou sobre o sistema – eliminando a, já longínqua, ideia de democracia.

Desta forma, na contemporaneidade, também se observa o afastamento do princípio da neutralidade da internet (redes) com os algoritmo$ que hierarquizam, filtram e direcionam as informações que trafegam nas vias informacionais.

Assim, os algoritmo$ acabaram com a ideia do trânsito de informações de igual forma, mesma velocidade e livre acesso e autonomia para a qualquer tipo de conteúdo na rede.

A lógica do poder econômico segue quase imutável, com as redes informacionais sendo dirigidas como mercadoria (notícia) tendo como base o valor de troca e não de uso.

O eterno favorecimento aos ricos e cada vez mais bilionários, em detrimento dos milhões de desempregados e na miséria, espalhados não mais apenas nos países periféricos, mas também no capitalismo central.

Neste processo a sensação em alguns momentos é que democracia parece que se tornou algo supérfluo com a grande massa distraída em seus "brinquedinhos" falando apenas para os seus guetos.

Assim, vemos o presente repetir o passado, onde a sociabilidade enunciada pela polis continuará sendo desejo e ideal. As cidades e as redes poderiam ser melhores com a criação, transmissão e trocas de conhecimento, num mundo mais colaborativo e menos negocial, mercadológico e concorrencial.

Tendo como parâmetro a noção de totalidade - e de sistema aberto e democrático - torna-se possível (talvez necessário) imaginar nos limites, o esgarçamento e a exaustão deste sistema. Este processo pode permitir a retomada da ideia de sociabilidade para além dos interesses de mercado. 

Quem sabe pensar numa etapa adiante e também similar ao que foi a superação do feudalismo pelo capitalismo. Quem sabe na direção à uma nova etapa civilizacional que rompa com a distopia do presente e nos devolva a utopia de um imprescindível pós-capitalismo. 

sábado, janeiro 27, 2018

Número de sondas de exploração de petróleo no Brasil mostra que novo ciclo petroeconômico está por vir e encontrará a Petrobras mais vulnerável

No dia 5 de março do ano passado, portanto, há quase um ano, este blog divulgou em postagem aqui que o Brasil tinha reduzido o número de sondas de perfuração de petróleo de 92, no ano de 2012, para apenas 15, naquele início do ano de 2017. [1]
Gráfico nº 6 da tese do autor, P. 112. [2],
Um quadro como versão preliminar deste gráfico
foi publicado na postagem do blog em 5 mar. 2017.

As sondas são embarcações que realizam perfurações e preparação de poços de petróleo para a produção que a seguir será feita com interligação de equipamentos desde a cabeça dos poços às plataformas de produção.

O fato demonstrava como funciona o processo com a inversão de fases do ciclo petroeconômico. Preços mais baixos do barril de petróleo reduzem os investimentos na procura de novas reservas. Isto acontece em todo o mundo.

É bom lembrar que isto faz com que que as reservas sejam reduzidas, o que ajudará a valorizar as reservas e levar a uma nova fase de expansão dos preços, em novo ciclo petroeconômico.

Pois bem, nesta semana, a empresa americana (para-petroleira) Baker Hughes divulgou que o Brasil terminou o ano passado com 14 sondas de perfuração em atividade. Enquanto isto, no mundo, a ampliação das contratações de sondas já estão aumentando de forma paulatina, mas relativamente constante.

Já a Agência Nacional de Petróleo (ANP) divulgou e o site PetroNotícias repercutiu que do total de sondas de perfuração em atividade atualmente no País, 11 estão em blocos terrestres e cinco em marítimos (ffshore). Ao todo, 5 delas estão realizando perfuração, enquanto as demais trabalham em restauração, avaliação, completação e teste de longa duração. [3]

Em março do ano passado, o blog informou que um total de 10 corporações eram as donas destes 15 navios-sonda. A Odebrech Drilling possuía 3 fretadas sendo duas para a Petrobras e uma para a francesa Total. A Transocean; Seadril; ODN GMBH e Queiroz Galvão possuíam cada um duas sondas fretadas. As outras cinco proprietárias de navios-sonda operando no Brasil são: Caroline Marine; Etesco; Drilling Hydra; Drilling Skopelose Schain Engenharia. 

De lá para cá estes contratos tendem a ser alterados com os interesses das petroleiras privadas estrangeiras que ganharam da Petrobras ativos (campos) em várias áreas, inclusive do pré-sal. As petroleiras estrangeiras fazem acordos comerciais ligados a seus negócios nos países ondem possuem ativos, pouco se importando com o país onde explora e por isso tanto lutaram para derrubar as exigências que o Brasil fazia na Política de Conteúdo Local (PCL).

Para se ter uma ideia da repercussão dos valores dos contratos das sondas nas diferentes fases do ciclo petroeconômico, vale relembrar que no período de boom da exploração de petróleo no mundo, o custo médio de afretamento deste navios-sondas custavam em torno de US$ 500 mil por dia. Na fase de baixa do ciclo do petróleo com a baixa do valor do barril, o custo médio de afretamento caiu pela metade, entre US$ 250 mil/US$ 300 mil.

Por estes dados é possível identificar como o Brasil e a Petrobras entrarão muito mais vulneráveis, quando uma nova fase de expansão de preços do barril de petróleo, em novo ciclo petroeconômico, se instalarem. 

Os preços do barril em trono dos U$ 70, já demonstram a ultrapassagem da fase de colapso e o início de um novo ciclo, cuja fase de boom (expansão) pode ser estimada para a próxima década.  

Se desejarem leiam a postagem feita aqui no blog em 14 jul 2017, com o título "A geopolítica da energia: os reflexos do ciclo do petróleo e sua relação com o Brasil" [4] que oferece mais informações, interpretações e análises sobre o ciclo petroeconômico e sua relação com a geopolítica. A postagem aponta dados e indicadores que demonstram como as reservas de petróleo está mais escassas e como cada vez está mais caro descobrir petróleo no mundo e ainda como estes fatos ajudam a explicar as pressões e os golpes políticos para controle das nações.


Referências:
[1] Postagem no blog em 5 mar. 2017. Contratos de sondas de petróleo no Brasil caem de 92 em 2012, para apenas 15, em 2017. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/03/contratos-de-sondas-de-petroleo-no.html

[2] Tese do autor defendida em mar. 2017, no PPFH-UERJ: “A relação transescalar e multidimensional “Petróleo-porto” como produtora de novas territorialidades”. Disponível na Rede de Pesquisa em Políticas Públicas (RPP)-UFRJ: http://www.rpp.ufrj.br/library/view/a-relacao-transescalar-e-multidimensional-petroleo-porto-como-produtora-de-novas-territorialidades

[3] Matéria do Oil Prices em 26 jan. 2018. Geiger, Julianne. U.S. Rig Count Rises As Oil Holds Firm. Número de plataformas nos EUA aumenta à medida que o preço do petróleo se mantém firme. Trecho da reportagem: "O número de plataformas de petróleo nos Estados Unidos aumentou em 12 esta semana após a queda na semana passada. O número de plataformas de gás diminuiu num único equipamento. O número de plataformas de petróleo é de 759 contra 566 há um ano. O número de plataformas de gás nos EUA agora é de 188, um aumento de 145 há um ano". Disponível em: https://oilprice.com/Energy/Energy-General/US-Rig-Count-Rises-As-Oil-Holds-Firm.html
[4] Postagem no blog em 24 jul. 2017. A geopolítica da energia: os reflexos do ciclo do petróleo e sua relação com o Brasil. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/07/a-geopolitica-da-energia-os-reflexos-do.html

PS.: Atualizado às 14: 10 e 14:18: Para acréscimos no texto original e nas referências.

sexta-feira, janeiro 26, 2018

"A Petrobras não é padaria" por Ricardo Maranhão

O blog reproduz abaixo o texto crítico do engenheiro aposentando da Petrobras, Ricardo Maranhão, que analisa a política de preços de combustíveis da atual diretoria da Petrobras. A quem interessaram estas mudanças? Certamente não foi ao povo brasileiro. Vale conferir!


A Petrobrás não é padaria
Por Ricardo Maranhão*

Procurando justificar a política de preços para os derivados de petróleo, adotada por sua administração, que implica na paridade com preços internacionais, o atual presidente da Petrobras fez, tempos atrás, comparação esdrúxula do petróleo com o trigo.

Deu explicação simplória, reducionista: quando os preços do trigo sobem no exterior, é necessário reajustar o valor do pão.

A afirmação pode convencer incautos, cidadãos desavisados, consumidores desinformados.

Na realidade esta política de preços, de orientação entreguista, está prejudicando não apenas a revenda, constituída por milhares de empresários brasileiros, segmento fundamental de nossa economia, mas, também, milhões de consumidores. A Petrobras e a economia do país, também são sacrificadas.

Os preços elevados desgastam a imagem da Petrobras. A quase totalidade da população não sabe que a Companhia recebe menos de 25% do valor pago pelo consumidor, que inclui mais de 50% de tributos. Ocorrem, em todo o país, justos protestos contra esta política, com bloqueios nas estradas, greves de caminhoneiros, cercos às bases de distribuição da Petrobrás.

Aponto alguns aspectos negativos desta política, que somente favorece as grandes distribuidoras privadas, importadores de derivados e fornecedores estrangeiros, notadamente os norte-americanos. Cerca de 82% das importações brasileiras de diesel são provenientes dos Estados Unidos. Por isto o Corpo Técnico da Petrobrás classifica esta política como “AMÉRICA FIRST”.

Em 2017 foram nada menos de 127 alterações nos preços nas refinarias, desorganizando o mercado, confundindo revendedores e consumidores. As distribuidoras se aproveitam das freqüentes mudanças de preços para aumentar seus lucros, com prejuízos para a revenda.

Esta política, todos sabem, é uma velha aspiração das companhias multinacionais, que desejam globalizar os preços do petróleo, derivados e gás natural, desconsiderando as peculiaridades de cada país;
Será razoável submeter os consumidores e a economia brasileira aos preços internacionais, sabidamente voláteis, sensíveis a fatores múltiplos sobre os quais não temos qualquer controle?

Por que preços internacionais, se não temos salários, renda per capita, IDH nivelados aos dos países ricos?

O que tem o consumidor brasileiro a ver com as tensões no Oriente Médio, os furacões no Caribe e nos USA, as disputas internas na Arábia Saudita, as bravatas e escaramuças do presidente Trump com o líder norte coreano? Temos, no Brasil, invernos severos, nevascas, temperaturas de até 50 graus negativos? Devemos punir os consumidores brasileiros pelas elevações de preços decorrentes de crescimentos sazonais da demanda?

O Brasil é um grande produtor de petróleo, a custos inferiores aos vigentes no mercado internacional e pode se aproveitar deste fato, dando competitividade à sua economia, beneficiando os consumidores e remunerando, adequadamente, a Petrobrás e demais agentes da cadeia; Preços muito elevados da energia – e o petróleo é a maior fonte de energia primária no Brasil – tiram a competitividade da economia brasileira, já tão sacrificada, por juros extorsivos, pesada carga tributária, graves deficiências de logística dentre outros inconvenientes. Ademais, reduzem a demanda, já impactada negativamente por forte recessão.

Decorrido pouco mais de um ano desta política, insensata e impatriótica, o que vemos é a maciça importação de diesel e gasolina, combinada com o absurdo, ainda maior, de uma ociosidade de mais de 25% no parque de refino nacional; Além disso as exportações de óleo cru dispararam, deixando o país de se beneficiar com o valor agregado proporcionado pelo refino.

No período de janeiro a novembro de 2017, as importações de gasolina e as de diesel explodiram, chegando ao absurdo de mais de 200 milhões de barris, nível jamais alcançado, nem mesmo quando nossa economia apresentava bom desempenho.

Esta brincadeira de mau gosto custou ao país, nos últimos doze meses pelo menos uns US$ 8,00 bilhões em importações.

Sendo o revendedor o último elo de uma cadeia que inclui, também, importadores, refinadores, formuladores, transportadores e distribuidoras, ele é, ainda, acusado de ser o vilão desta política, ditada pelos que hoje comandam a Petrobrás.

Os dados da ANP mostram que os preços da gasolina aumentaram 9,40% em 2017, quatro vezes mais do que a inflação (2,07% pelo INPC). No GLP, produto de amplo consumo pela população mais pobre, o sacrifício é ainda maior, traduzido em uma majoração superior a 16,30%, já descontada a inflação. A maior majoração dos últimos 15 anos.

É hora de rever esta insensata política, sem prejudicar a Petrobrás – e isto é possível – em benefício de nossa economia.

*Ricardo Maranhão, engenheiro é Conselheiro da Associação dos Engenheiros da Petrobrás e do Clube de Engenharia.

segunda-feira, janeiro 22, 2018

Rússia segue com a maior produção mundial de petróleo. Em 2018, o Brasil poderá avançar para 9º no ranking mundial

Em 2017, a Rússia seguiu com na posição de maior produção de petróleo do mundo batendo seu recorde fechando o ano com uma média diária de 10,98 milhões de barris por dia (bpd).

Este é o melhor resultado nas três últimas décadas, segundo o Ministério de Energia da Rússia. Em 2016, a produção média foi de 10,96 milhões de bpd em 2016; e de 10,72 milhões de bpd em 2015.

Em julho de 2017, a Arábia Saudita estava produzindo, antes do acordo da Opep, com a média de 10,67 milhões bpd, como o blog havia comentado em nota neste espaço no dia 18 de agosto de 2017. Os números finais de 2017, do segundo maior produtor a Arábia Saudita com as reduções dos últimos meses, a aprtir do acordo da Opep deve ter ficado em torno de 10,3 milhões de bpd.

Os números da produção média dos EUA em 2017 (atual terceiro maior produtor) ainda não foram fechados, mas se estima que tenham ficado em torno dos 9,3 milhões de barris por dia, depois de ter chegado em 2014 a mais de 10 milhões de bpd.

Em 2015, estes três países produtores praticamente dividiam a posição de maior produção mundial de petróleo por pequena diferença. Segundo a AIE (EIA), a previsão de 2018 é que os EUA possa ultrapassar a Arábia Saudita como segundo maior produção com uma estimativa que volte a alcançar com o tight oil (petróleo de xisto) 10,3 mi bpd em 2018 e 10,8 mibpd em 2019.

O Brasil com uma produção média (os números finais ainda estão sendo fechado pela ANP) em 2017 de cerca de 2,6 mibpd de petróleo e de 3,3 mi barris de óleo equivalentes (boe: petróleo + gás) por dia, é hoje a 10º maior produtor mundial atrás, respectivamente de: Rússia; Arábia Saudita; EUA; Canadá; Iraque; Irã; China; Emirados Árabes Unidos (EAU) e Kuwait.

Com as previsões da entrada em operação dos novos sistemas de produção com sete plataformas, este ano, nas reservas do pré-sal, o Brasil poderá avançar mais uma posição ultrapassando o Kuwait no ranking mundial do produtores de petróleo.

Há que se lamentar que a base disto tenha sido planejada e montada pela estatal Petrobras. E hoje, estes ativos estejam sendo entregues, a preço vil, para várias petroleiras estrangeiras, como temos comentado em diversas notas aqui no blog, incluindo as últimas aqui e aqui.

PS.: Atualizado às 16:32: A produção das petroleiras privadas no Brasil, em maioria expressiva estrangeiras no Brasil já se aproximam do volume de 800 mil barris por dia de óleo equivalentes (boe: óleo + gás), segundo dados do último Boletim Mensal de Produção da ANP. Cerca de metade deste volume (quase 400 mil boepd) é da Shell.

domingo, janeiro 21, 2018

Agência Internacional de Energia (AIE) prevê aumento da demanda mundial de petróleo para 100 milhões bpd (ainda em 2018) que poderá elevar ainda mais o preço do barril

A Agência Internacional de Energia (AIE) publicou nesta sexta-feira uma previsão que informa que a demanda global de petróleo pode chegar ainda no trimestre deste ano, à marca dos 100 milhões de barris por dia de petróleo.

Junto até aqui da limitação da produção do petróleo de xisto dos EUA, o fato pode colocar em definitivo um ponto final da fase de colapso de preços do ciclo petroeconômico, iniciado há 3 anos, em 2014.

Normalmente, a AIE é mais pessimista que outros órgãos e consultorias que atuam no setor de óleo e gás. Por isso, a sua avaliação está sendo mais considerada.

Assim, essa estimativa está abrindo espaço para a avaliação de que a fase de colapso de preços possa ter ficado definitivamente para trás, para dar início à uma nova fase expansão de preços.

Há nestas avaliações muita especulação, como tudo que se relaciona ao valorizado setor de petróleo e gás. Sabe-se que um movimento de alta que possa levar a novos aumentos acima da faixa US$ 70-US$ 75, por barril, pode, de outro lado, reduzir a demanda global de petróleo e derivados.

Porém, é fato que as expectativas de preço tendem a seguir em alta com esta nova avaliação da AIE. Os ministros da OPEP e os países produtores aliados estão hoje reunidos em Doha*, capital do Qatar, para avaliar o seu acordo de produção e este novo cenário do setor.

Resta saber como vai se portar tanto a economia mundial quanto a capacidade de produção do petróleo de xisto americano. Lembrando que os EUA seguem sendo disparado, o maior consumidor mundial de petróleo próximo das duas dezenas de milhões de barris de petróleo por dia. Sendo a China a segunda nação consumidora com quase 13 milhões de barris por dia.

Assim, só estas duas nações consomem, hoje mais de um terço da produção mundial de petróleo e a movimentação de suas economias acabam balizando muito todo o movimento do setor.

No meio deste cenário há que se avaliar ainda o avanço da comercialização de petróleo sem uso do dólar, como tem se ampliado as negociações entre a China com a Rússia e com a Arábia Saudita, em que esta oferece o direito do país trocar a moeda a qualquer momento por ouro, de forma a aumentar a segurança do acordo sem necessitar do dólar. O fato só está sendo possível pela fortes compras de ouro que vem sendo feita pela China e Rússia. 

Enquanto isto, no Brasil pós-golpe, a Petrobras segue entregando os ativos do Pré-sal a nossa joia da coroa. O Brasil cada vez exportando mais óleo cru e importando derivados com as refinarias cada vez mais ociosas, enquanto a gasolina e o gás de cozinha não param de aumentar para o consumidor.

Não há aí coincidência e sim o estratégia usada no tempo e no espaço em que se situa a geopolítica da energia. Enfim, seguimos acompanhando e conferindo.

PS.: Atualizado às 20:36: Para complemento no penúltimo parágrafo.
PS.: Atualizado às 00:48 de 22/01/2018 para corrigir o equívoco* que informava ser Doha, uma cidade da Suíça, em confusão com Davos, quando na verdade é Doha é a capital do Qatar, país do Oriente Médio, grande produtor de petróleo.

sexta-feira, janeiro 19, 2018

"O pré-sal e a política econômica do petróleo: coração do motivo do golpe que retirou o PT do governo federal"

Este assunto, o blog tem tratado com exposição de dados e indicadores, além de outros argumentos interpretativos desta realidade com frequência aqui neste espaço.

Porém, o texto da Maria Luiza Alencar Mayer Feitosa, professora titular do Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba acrescenta questões e abordagens que valem ser divulgadas, além de ampliar a interpretação dos fatos no campo da economia política. E faz isto de forma relativamente concisa e consistente. O texto foi publicado originalmente aqui no blog do Nassif:

O pré-sal e a política econômica do petróleo: coração do motivo do golpe que retirou o PT do governo federal


Cada um fala daquilo que lhe é mais próximo. De minha formação acadêmica interdisciplinar, transitando entre as áreas de História, Direito e Economia, extraio alguns posicionamentos para traçar rápido paralelo entre  Economia e Política pelo viés do Direito, significa que vou falar de política econômica, nomeadamente no período histórico decorrido ao longo do século XX. Tudo isso para chegar aos governos do Partido dos Trabalhadores, ao golpe que tirou Dilma Roussef do poder e dos processos judiciais contra o ex-Presidente Luiz Ignácio da Silva, ponderando os impactos que a exclusão da candidatura de Lula ao pleito de 2018, por essa via, causam sobre a democracia brasileira.

Começo afirmando que a presença do Estado no domínio econômico dá-se, em geral, por meio da regulamentação e\ou da regulação de políticas econômicas. Política econômica é, pois, a junção da política com a economia através do Direito, para compatibilizar fins e meios, com objetivos previamente traçados. Sua natureza é múltipla, com ênfase inicial para as abordagens pública ou privada. Na imbricação dessas esferas, relevam, por exemplo, as políticas orçamentárias, que manipulam as despesas públicas; tributárias, no âmbito da arrecadação de receitas; e monetárias, que realizam a gestão do custo e da quantidade de moeda corrente, assim como a política de juros, de crédito, entre outras.

Políticas econômicas podem também ser vistas nas vertentes socioeconômicas. Neste caso, o Estado compatibiliza aspectos econômicos e sociais, garantindo direitos, caso das políticas trabalhistas, previdenciárias, ambientais, consumeristas etc. Em um caso e noutro, a duração das políticas econômicas pode ser pontual (conjuntural ou circunstancial), que cuida de fatores ocorridos em dado momento; e de vida longa (ou estrutural), como as políticas de superação das desigualdades sociorregionais, a política industrial, a política ambiental, e outras planejadas para o médio ou longo prazo, de modo a interferir na estrutura e construir bases econômicas.

As políticas econômicas se relacionam com o Direito e com outros fatores, como a democracia, por exemplo, através de ligações sistêmicas, em regime de mútuas influências. As políticas econômicas privadas (lideradas pelo grande capital, assim como aquelas ditadas pelos entes internacionais) influenciam as políticas econômicas públicas e podem enfraquecer o Estado, causando descrença à Democracia.

No caso dos países periféricos (inclusive aqueles conhecidos como países em desenvolvimento ou emergentes), as políticas socioeconômicas são ditadas pelo grande capital. Duas regras se destacam nesse contexto: em primeiro lugar, os países periféricos não são livres para impor a política econômica no seu próprio território porque na geopolítica mundial, uns mandam e outros obedecem; em segundo lugar, considerados os agentes ou players mercado, Estados e sociedade civil (nacional ou internacional), nada na política econômica é neutro, tudo é contaminado por interesses dos poderosos sobre os vulneráveis.

As políticas econômicas traçadas pelo Estado encontram seus fins, objetivos e princípios estabelecidos pelos Textos Constitucionais. Os ramos do direito que lidam com a tal política econômica são vários, com destaque para o Direito Constitucional e o Direito Econômico e seus desmembramentos. No Brasil, a partir da Constituição de 1934, as Constituições econômicas (ou o trecho da Constituição dedicado à política econômica) são consideradas dirigentes, ou programáticas e idealistas. A Constituição é vista como ideário, “programa para o futuro”, cujo sentido é dar força e substrato jurídico para as mudanças sociais.

Os principais nomes do dirigismo constitucional no mundo ocidental são os alemães Peter Lerche, que criou o conceito de Constituição Dirigente, e Konrad Hesse, da ideia de força normativa da Constituição, e o português Joaquim Gomes Canotilho, que ampliou o conceito, afirmando que, não somente os capítulos disciplinadores da economia, mas todo o texto constitucional é dotado de impulso dirigente. Estes são exemplos da teoria material (social) da Constituição econômica.

No Brasil, a Carta Constitucional de 1988, que este ano faz 30 anos, foi votada por uma assembleia constituinte derivada, quando o país saía da ditadura e quando o neoliberalismo ditava as regras nos países do bloco dominante (Ronald Reagan, de 1981 a 1989, e Margareth Thatcher, de 1979 a 1990). Aprovamos uma carta híbrida, ora dirigente pro-mercado, ora pro-societatis.

O primeiro Governo sólido e duradouro depois da CF de 88 foi o de Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, que consolidou as chamadas reformas de primeira e segunda gerações, voltadas para a garantia da estabilidade do mercado e para as privatizações. O escandaloso processo de privatizações, conhecido como “privataria tucana”, revoltou o país e permitiu avançar a coalisão de forças de centro que elegeu Lula, líder popular com formação de centro-esquerda, como Presidente do país. Lula garante a paz com o grande mercado, enquanto, em paralelo, implementa a geração social das políticas econômicas, todavia, repita-se, sem romper com o mercado.

O programa de governo de Lula realizava os objetivos constitucionais fundamentais da República Federativa do Brasil, quais sejam construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização; reduzir as desigualdades sociais e regionais, entre outros. Lula propõe um tipo de desenvolvimentismo inclusivo (em contraponto desenvolvimentismo misto de feições preponderantemente monetaristas do período anterior), enfrentando o chamado "desafio furtadiano" ("Brasil: A Construção Interrompida", de Celso Furtado), que pugnava como grande tarefa do Estado brasileiro, a superação do subdesenvolvimento ou a superação de sua condição periférica.

Em termos de política econômica, um acontecimento importante marcou os anos Lula e o mercado internacional, rompendo com o pacto representado pelo slogan "Lula Paz e Amor". Trata-se da descoberta de petróleo nas águas ultra profundas do litoral brasileiro, o chamado pré-sal, e a requintada tecnologia de exploração, no ano de 2007, assim como, em 2009, o anúncio e a aprovação do novo marco regulatório do petróleo no país. A ideia era dar prioridade no processo à Petrobras, transformada em uma das maiores petrolíferas do mundo, com papel estratégico do produto para o desenvolvimento nacional, representado  na aprovação da Lei do Fundo Social e outras, no conjunto do que Lula chamou de “passaporte para o futuro”.

Era o fim da aliança com o mercado. No entanto, em 2010, Lula, com 86% de popularidade, elegeu sua sucessora, Dilma Roussef, de perfil menos negociador do que Lula, e que, em face da crise financeira internacional, inicia 2011 com dificuldades. O pacto entreguista começa a se desenhar. Por essa época, furtaram dois computadores da Petrobras, Rio de Janeiro, aqueles que possuíam os segredos do pré-sal, e avança sobre o Brasil os processos de espionagem denunciados por Julian Assange (caso Wikileaks) e Edward Snowden (caso da rede de espionagem dos EUA). Para completar, Dilma rompe com o lulismo que satisfazia ao mercado, quando forçou, em 2013, a redução dos juros da dívida à casa dos 7%, tendo que depois recuar.

As jornadas de junho de 2013 dão o mote final. Ali, como diz Roberto Amaral, o ovo da serpente estava se formando, debaixo dos nossos olhos. Nós participamos dos protestos! A crítica não vai aos protestos, mas à falta de compreensão sobre o processo e com quem nos aliávamos. Todos (governo, oposição de esquerda, movimentos sociais e lideranças políticas, salvo exceções) estávamos enganados. Consideramos pacificados os conflitos, garantidos ad eternum direitos que se conquistam na luta diária (Bobbio diz que os direitos nunca são conquistados todos de uma vez, tampouco de uma vez por todas) e vencidas as históricas contradições do capitalismo.

O fato é que os governos populares, quando tinham condições para tanto, deixaram de realizar três importantes reformas - política, fiscal e da mídia. Descuidaram das 9 indicações feitas ao Supremo Tribunal Federal.

Em 2014, vieram a copa do mundo e as eleições. Dilma, vaiada nos estádios de futebol e vilipendiada pelas acusações diárias na grande mídia, foi reeleita. Para surpresa e horror da elite, que também se enganou ao não calcular os votos do Brasil profundo, beneficiado pelos programas de recuperação social, como o Luz para Todos, Minha Casa, minha Vida, Bolsa Família e outros.
Perderam as eleições e declararam guerra.

A partir de 2014 mesmo, dois processos JURÍDICOS paralelos nos assombram: a) o processo parlamentar congressual, judicial e midiático do impeachment, que começou em 2014, quando o candidato derrotado duvidou do resultado das urnas eletrônicas e anunciou oposição sem tréguas – ela deveria sangrar viva; a oposição fez a Presidência da Câmara, Eduardo Cunha; a Presidenta cedeu ao mercado ao nomear Joaquim Levy, representante dos interesses dos setores que pediam austeridade social, como Ministro da Fazenda. A coisa toda desaguou naquele show de horrores, que foi a votação do impeachment na Câmara dos Deputados - o que veio depois tratou apenas de manter as aparências legais porque a definição se deu ali, naquele circo.

Por sua vez, a Operação Lava Jato, que começara em março de 2014 (antes das eleições), na 13.ª Vara Criminal Federal de Curitiba, para apurar desvios justamente na Petrobras, tinha um juiz coordenador que regular e estranhamente viaja aos EUA para fazer cursos. Nesse cenário, parte da imprensa anuncia que documentos do governo dos EUA, vazados pelo Wikileaks, revelam o treinamento de Sergio Moro e mostram como os trabalhos do juiz federal e da Lava Jato sofrem influência daquele país.

A Lava Jato é transformada numa longa novela nacional, diariamente exibida nos noticiários da grande mídia, com destaque privilegiado para a TV Globo, desdobrada em quase 50 fases, e títulos criativos, no conjunto de Ações que envolvem a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, como Operação Poço Seco, Operação Cobra, Operação Abate, Operação Asfixia e muitos outros. Do julgamento de desvios ocorridos na Petrobras, a instância federal de Curitiba migrou para representar o canal de derrubada do governo Dilma, depois, para exterminar o PT, e, mais recentemente, no conduto para impedir a candidatura de Lula às eleições presidenciais de 2018.

Depois do impeachment exitoso, o Governo substituto, a esta altura, fatiou e privatizou a Petrobras e afrontou de morte o Estado desenvolvimentista. Voltamos ao mais cruel monetarismo. Na estatal criada por Vargas, e representante do orgulho nacional, venderam os campos, abriram para as empresas estrangeiras, retiraram o protagonismo da Petrobras na política de petróleo e a última medida foi isentar de todos os impostos federais as petrolíferas estrangeiras. Não se diz aqui que não havia desvios e erros contábeis, o que se diz é que eles deram o mote para a ação internacional de quebrar a ousadia brasileira de querer figurar entre os sócios de um clube fechado aos periféricos  (o das maiores exploradoras de petróleo e gás do planeta) .

Não há dúvidas de que tudo é um jogo. O fato é que nenhum dos processos era contra a corrupção: nem o impeachment tampouco a lava jato.

E onde está hoje o Direito e a tal Constituição Dirigente e Democrática? Rasgada e jogada às feras, pela própria toga. Podemos ter alguma esperança nos guardiães da Constituição? Não. É preciso recordar sempre o que disse o Senador Romero Jucá, do PMDB, braço direto de Temer: "com o Supremo, com tudo". Ninguém hoje guarda ou garante a Constituição com constância e firmeza. O STF mais parece uma constelação ou um arquipélago – 11 estrelas ou 11 ilhas, com uma que se destaca sobre as outras por sua coragem e perversão, o Ministro Gilmar Mendes, nomeado por FHC e representante destemido dos interesses do PSDB.

O governo, sem o controle do judiciário (que deveria defender os direitos constitucionalmente assegurados) e aliado ao pior Congresso de todos os tempos, entrega o Brasil de bandeja, ao gosto do cliente. Foram aprovadas leis e reformas, como a reforma trabalhista; a EC que congela por vinte anos os investimentos públicos para financiamento da Saúde, Educação e Previdência Social; o perdão de dívidas bilionárias; e a caríssima reforma da previdência em curso, entre muitas outras. Leis e medidas destinadas a quebrar conquistas sociais e o pacto desenvolvimentista da CF.

Nesse contexto, a Constituição dirigente deve morrer completamente, melhor, ser abortada em sua utopia desenvolvimentista. O modelo dirigente que, lá atrás, quando foi pensado, desconfiava do legislador, visto que desejava encontrar um meio de vincular, positiva ou negativamente, o legislador à constituição, hoje, além de desconfiar do legislador, precisa desconfiar do Judiciário, o super-poder, que interfere como e quando lhe é conveniente, sobre o Executivo e sobre o Legislativo. Esse protagonismo ilegal atinge o postulado moderno da separação, independência e harmonia dos poderes do Estado.

O golpe afundou o Estado de Direito e hoje avança sobre a democracia. 2018 é ano de eleições, mas, para a elite econômica e midiática do Brasil, deve acontecer sem que Lula possa disputar, para não ocorrer a surpresa desagradável da eleição de 2014. O encarregado de tirar Lula do páreo foram a Operação Lava Jato e o Judiciário federal. Há um roteiro prefixado: a) impedir a eleição de Lula (ou quem quer que conteste o atual establishment; b) caso seja eleito um oposicionista, o presidencialismo e os poderes do presidente da República devem ser esvaziados e implantado, mediante Emenda constitucional, sem consulta popular, um tipo esdrúxulo de semipresidencialismo à moda tupiniquim.

Nesse cenário, a democracia brasileira não interessa mais ao bloco conservador.  Para ele, como lembra Boaventura Santos, a via da regra democrática das maiorias é tratada como “tirania das maiorias”. Para evitar isso, a fórmula é colocar sob suas ordens o órgão de soberania menos dependente do jogo democrático e especificamente desenhado para proteger as minorias, qual seja, os tribunais.

Por último, o que Lula tem melhor do que outros que não pode ser condenado e por que dizem que ELEIÇÃO SEM LULA É FRAUDE? Porque não há crime, não há motivo e não há isenção no julgamento. Na verdade, há o chamado "law fare", ou o uso político do poder judiciário para perseguir alguém a quem se atribui pulverizada culpa pela corrupção no país. Há um convencimento aprioristico e, no caso da Lava Jato,  há a instrumentalização do processo para garantir o desfecho de condenação.
As investigações e os processos abertos contra Lula não observam as mais básicas garantias constitucionais, como, por exemplo:
a) Lula foi levado coercitivamente INDEVIDAMENTE;
b) houve devassa na sua individualidade, com sua intimidade (e de seus familiares) brutalmente violada;
c) foi desrespeitado seu direito de defesa – pela não aceitação, pelo juiz do caso, de juntada de provas, porque o juiz “desconfiava” das provas, em face de sua “convicção”;
d) está sendo julgado por um juízo de exceção, portanto atingido o seu direito ao julgamento justo e imparcial, visto que o caso de Lula em julgamento não possui qualquer vinculação com o processo da Lava Jato.

Em suma, a espinha dorsal da acusação não sobrevive, visto que nao se prova nenhum ato concreto de Lula, na condição de Presidente da Republica, para beneficiar a OAS. Não solicitou nem recebeu qualquer vantagem indevida, o que afasta o crime de corrupção passiva.

Em 2011, o apartamento foi dado em garantia de dívida da OAS, pela própria construtora, à Caixa Econômica Federal. Significa que está onerado, somente podendo ser acionado para pagar dívidas da Construtora, fato que ocorreu esta semana, por um juízo cível de Brasília, ou seja, o juízo criminal de Curitiba condenou Lula, com base em uma prova oral (sic) sobre a propriedade de um imóvel, sendo que uma juíza cível da vara de execuções, no Distrito Federal, penhorou o mesmo imóvel para pagar dívidas da construtora OAS. Significa que o imóvel é de propriedade da OAS. Lula não pode ser condenado por auferir uma vantagem que comprovadamente não recebeu.

Este é o enredo. A ópera bufa do impeachment vai chegando ao clímax. O ponto alto será o dia 24 de janeiro, quando ocorrerá o julgamento de Lula pelo TRF 4, em Porto Alegre. Assim como em  O Fantasma da Ópera, o clímax é a parte na qual o fantasma pede que Christine escolha entre um escorpião e um gafanhoto, no nosso caso, querem colocar para nossa escolha Luciano Huck e Bolsonaro. Só nos resta reagir!
Maria Luiza Alencar Mayer Feitosa - Doutorado em Direito Econômico, pela Universidade Coimbra, concluído em 2005; Pós-doutorado em Estado e Sociedade pela UFSC (Universidade Federal da Santa Catarina), concluído em 2011; Ex-Diretora da Faculdade de Direito da UFPB (2013 a 2016); Professora titular e docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas da UFPB. 

quinta-feira, janeiro 18, 2018

Royalties a serem repassados amanhã aumentam em média 7%

Abaixo a tabela com os valores dos royalties pagos aos municípios da região. Ela foi elaborada com dados da ANP e encaminhada ao blog por Wellington Abreu. A última coluna da direita mostra os valores que serão depositados amanhã nas contas das prefeituras.

Com o aumento do valor do barril de petróleo de dois meses atrás os valores repassados aumentaram para todos os municípios. Sendo que no geral, fora alguns casos específicos, aqueles com litoral ligados à Bacia de Campos tiveram menores percentuais de aumento, em relação aos que estão no litoral da Bacia de Santos, de Cabo Frio para a direção sul do ERJ.
















Da lista apresentada na tabela, a maior receita dos royalties para janeiro de 2018 foi para Macaé com R$ 39,9 milhões. A seguir Maricá com R$ 35 milhões, Campos com R$ 32,7 milhões e Niterói com R$ 29,5 milhões.


Perspectivas de produção e receitas dos royalties para os próximos meses
Como os aumentos do barril de petróleo que levaram para o patamar próximo a US$ 70 o barril aconteceram mais recentemente, só dois meses depois eles aparecerão nas contas destes repasses dos royalties futuros.

Tirando isso, espera-se uma redução ainda maior na produção dos campos maduros da Bacia de Campos para o ano de 2018, a despeito do anúncio das medidas da Petrobras e dos acordos com as petroleiras estrangeiras.

No ano passado (2017) a produção da Petrobras na Bacia de Campos recuou em cerca de 10%, a maior queda em seis anos seguidos de declínio da produção, quando atingiu o volume de produção médio de 1,222 milhão de barris por dia.

Este volume é 27% menor do que a produção na Bacia de Campos no ano de 2011. Ou seja, se está falando numa redução média de produção de 455 mil barris por dia, quase meio milhão de barris diários, volume similar ao que o Brasil está vendendo a preço vil em termos de capacidade de produção para petroleiras estrangeiras, conforme o blog comentou em nota aqui abaixo.


PS.: Atualizado às 13:04 de 19 jan. 2018: Atendendo a pergunta de um comentário desta nota, o blog  informa que  o governo do ERJ recebeu repasse dos royalties no dia 15/01/2018 no valor de R$ 277.570.117,91. Um aumento de 8,1%, em relação à dezembro de 2017 quando o repasse da quota mensal foi de R$ 256 milhões.

Em 2018, a Petrobras terá que colocar 7 plataformas em produção para tentar se aproximar da produção atual de petróleo, depois de entregar para petroleiras estrangeiras, os sistemas que produzem quase meio milhão de barris por dia

A produção recorde da Petrobras de 2,15 milhões de barris por dia se manterá em 2018, com este mesmo nível, mesmo estando previsto para este ano, a entrada em operação de 7 novas unidades de produção (plataformas) offshore em nosso litoral.

Entre estas novas plataformas que forma projetadas desde 2013 estão a que serão instaladas nos campos de Tartaruga Verde e Tartaruga Mestiça na Bacia de Campos, Lula Norte, Berbigão, Lula Extremo Sul, Búzios-1, Búzios-2 e Búzios-3.

Colocar sete sistemas de produção para funcionar num mesmo ano exigiu um planejamento que foi feito há cerca de 5/6 anos atrás. Trata-se de um fato colossal, extraordinário e raríssimo para uma petroleira em qualquer lugar do mundo. Bom lembrar que feito por uma estatal que agora está sendo vilipendiada junto com seus trabalhadores.

A razão para o absurdo?

É que a Petrobras está entregando a preço vil vários ativos (campos e poços já estruturados) que equivalem no total a cerca de 400 mil barris por dia para outras petroleiras estrangeiras.

Incluem aí as participações nos campos de Carcará, Roncador, Lapa entre outros tanto na Bacia de Campos, quanto na colossal Bacia de Santos e reservas do Pré-sal.

Ou seja, a Petrobras terá que colocar sete novos sistemas de produção para tentar aproximar a produção que tinha até o ano de 2017.

Quanto mais se observa o movimento da direção golpista da Petrobras, após Temer, mais se observa o tamanho do absurdo que se está cometendo. Um crime extraordinariamente maior que aqueles desvios identificados até aqui.

Tratam-se de crimes graves (lesa-pátria) que só não assim considerados pelos antolhos colocados através da articulação dos parlamentares-mídia sobre o judiciário. Não creio que seja necessário referendo revogatório para romper com estes crimes.

Contribuição da iluminação pública em Campos passou a ser três vezes maior que na capital

Eu disse em postagem aqui no blog, no último dia 12 de janeiro de 2017, sobre as reclamações contra os reajustes na cobrança da contribuição da iluminação pública e IPTU em Campos, que não sou contra a carga maior de impostos sobre os que podem mais, como forma mínima de fazer Justiça Social.

Disse também que a forma autoritária, pouco participativa e tecnocrática com que havia sido formulada, mesmo sem conhecer detalhes, ela traria ainda maior rejeição especialmente da base social que tinha eleito o prefeito de Campos.

De lá para cá, as pressões só aumentam e aqui pelo blog eu percebo este movimento. As pressões se ampliaram também, com a informação de que a autorização de reajuste para as tarifas de água - que é integralmente para a concessionária Águas do Paraíba -, se deu em percentual que é mais que o dobro do índice de inflação anual, conforme comentamos em outra nota aqui, no último dia 16/01/18.

Pois bem, por conta destas postagens e de toda a pressão, o blog recebeu várias informações com outros questionamentos sobre a decisão da atual gestão da PMCG.

Através destas informações, o blog recebeu de um leitor-colaborador, a tabela de cobrança da contribuição de iluminação pública, na capital fluminense, o Rio de Janeiro. Foi repassado assim, o link (aqui) da página oficial da prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, onde consta a tabela da 
COSIP - Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública, aprovada pelo Decreto Nº 31.918, de 25 de fevereiro de 2010.
  
Tabela da Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública no Rio de Janeiro
































Tabela da Contribuição Serviço de Iluminação Pública
em Campos dos Goytacazes. DO 29 set. 2017. P.18
Comparando as tabelas das cobranças da Prefeitura de Campos cuja lei foi publicada no Diário Oficial do dia 29 de setembro de 2017, página 18 e a da Prefeitura do Rio, ambas publicadas abaixo se observa a discrepância.

No município do Rio de Janeiro, a cobrança é com valor fixo e não percentual, embora relacionado também às faixas de consumo de energia elétrica. No Rio de janeiro, com um consumo até 80 KW, o munícipe fica isento e não apenas os beneficiários da tarifa social, o que restringiu enormemente, a margem dos isentos no município de Campos dos Goytacazes.

No Rio de Janeiro, o caso do munícipe com consumo mensal entre 80 e 100 kW, a taxa fixa cobrada é de R$ 3,21. Em Campos para 100 KW de consumo domiciliar a taxa é de 2,7% do valo do consumo. Isso no final dá um valor em média entre duas e três vezes mais. Na faixa de consumo entre 100 KW e 200 KW no Rio paga um valor fixo entre R$ 4,84 e R$ 7,30. Em Campos pagará 5%. Para os consumidores comerciais e industriais estes percentuais a contribuição são quatro vezes maior que os residenciais, enquanto no Rio de Janeiro, a distinção é apenas pelo consumo de energia elétrica. 

Vale registrar que os valores cobrados pela contribuição da iluminação pública no Rio de Janeiro ou em Campos dos Goytacazes não precisam ser iguais. Nem os serviços são iguais. Aliás, nem parecidos, mesmo que distinto em ambos com relação aos bairros centrais e os da periferia. Mas, a razoabilidade determina que é inadmissível valores que ficam entre três e dez vezes maior no município de Campos dos Goytacazes.

Faço questão ainda de lembrar o que falei na postagem anterior do dia 12 de janeiro (aqui):  

"Essa ideia de que pagamos impostos demais é bobagem, se pretendemos ter uma sociedade menos desigual e administrações que cuidem das pessoas, especialmente, aquelas que mais dependem do Estado e dos governos. O problema é que esta atual administração da Prefeitura de Campos se origina de um grupamento político que chegou ao poder com a lógica de um estado mínimo e da meritocracia. O tecnocrata abomina, a princípio, a ideia da mediação política e da avaliação da repercussão de ideias que parecem excepcionais, quando observadas, sem a análise da conjuntura mais geral...”

Falei ainda nesta mesma nota (aqui) que a atual administração iria acabar sendo obrigada a voltar atrás, mesmo que em parte, da medida decidida de forma atabalhoada e tecnocrata:

“Assim, estão apanhando de todos os lados, especialmente, do lado daqueles que os bancaram econômica e politicamente. Os resultados financeiros destas correções serão razoavelmente pequenas... Mas, a base social da atual gestão é outra. Aí está o curto-circuito. Não duvido que os tecnocratas recuem do que propuseram, olhando só em tese, o que imaginaram... Estamos diante de uma gestão que tem projeto de governo ou apenas projeto de poder? Sendo um ou outro, os seus representantes terão que dar as caras para defender o prefeito. Ou admitir juntos que erraram...”

Enfim, que o caso possa servir para a atual gestão da Prefeitura de Campos descer do pedestal onde se instalou e deixe de ser um governo elitista e para poucos. 

A crise existe e precisa ser enfrentada com trabalho, criatividade e participação popular. Mesmo com ela, o tamanho do orçamento de Campos dos Goytacazes ainda é bastante significativo, quando observado, de forma comparativa, com outros de médio porte, a nível estadual e nacional.

A população de nossa Campos, especialmente, a de menor renda é a que mais precisa do governo e necessita ser olhada e atendida e não subestimada e criticada, como dependente dos programas de renda mínima. 

Essas pessoas são vítimas e não as responsáveis por quaisquer que sejam os problemas relativos às Políticas Públicas no município de Campos dos Goytacazes. É para isto que elegemos nossos representantes políticos como nossos empregados diante do erário.

quarta-feira, janeiro 17, 2018

Uma trinca de fatores segura o preço do barril de petróleo próximo dos US$ 70

De forma bem sintética é possível resumir em três, os fatores que seguram o preço do barril de petróleo, próximo aos U$70:

1) O exitoso acordo entre a Opep e demais produtores para redução de parte da produção;

2) O forte aumento da demanda por óleo e derivados na economia mundial;

3) A tendência de novo patamar de equilíbrio de preços do barril de petróleo por conta da produção do tight oil (xisto) americano.

Até onde é possível enxergar os movimentos na geopolítica da energia, este patamar parece interessar à maior parte dos envolvidos, entre (nações) produtoras e consumidoras, mais as gigantes corporações que atuam no comércio (trading) mundial desta commodity.

Para o Brasil, os resultado só não são melhores, porque estamos exportando mais óleo cru e importando os derivados, mesmo com quase 30% de capacidade ociosa das refinarias da Petrobras. 

Para os estados e municípios que recebem os royalties como parte da renda do petróleo produzido, este valor é bem melhor do que aquilo que poderia ser esperado, antes de 2020. Seguimos acompanhando.

terça-feira, janeiro 16, 2018

Reajuste da tarifa de água aprovado pela PMCG para a concessionária Águas do Paraíba é maior que o dobro (135%) do índice de inflação anual

O reajuste concedido, agora em janeiro, pela atual gestão da Prefeitura de Campos à tarifa de água e esgoto é ainda pior para o munícipe que a taxa de iluminação. Isto se dá, porque como as taxas são integralmente recolhidas pela municipalidade e pode (ou não) se transformar em melhorias.

Porém, o reajuste concedido na tarifa de água e esgoto vai todo para engordar os lucros e o caixa da concessionária Águas do Paraíba, ligada ao grupo Águas do Brasil, que é controlado pelas empresas Carioca Engenharia, Queiroz Galvão, Construtora Cowan e New Water.

O reajuste de 6,96% concedido pelo atual prefeito contra uma inflação pelo IPCA de 2,95% é 135,93% maior que o índice de inflação e assim, conseguiu superar até, o já absurdo reajuste de 131,94%, autorizado pela administração passada, da prefeita Rosinha, entre os anos de 2009 e 2016, quando a inflação deste mesmo período foi de 65,08%.

Em 15 de junho de 2017, este blog já havia chamado a atenção (aqui) para o fato que a empresa concessionária, Águas do Paraíba, já tinha tido um lucro líquido (portanto depois das despesas, impostos e outros) extraordinário de R$ 55 milhões. Por certo, graças, agora em 2018, a uma prefeitura em crise, estes lucros serão ainda maiores.

Segundo o Instituto Trata Brasil, o município de Campos dos Goytacazes já tinha, e segue tendo, uma das maiores tarifas de água do país.


Golpista e humorista no setor de óleo

Parece piada - e é - a afirmação do Parente, presidente golpista da Petrobras, que a entrega a preço de vil de ativos no Pré-sal para a francesa Total é um "aliança estratégica para a Petrobras e para o desenvolvimento da exploração em águas profundas". 

Estratégica para quem?

A Total vai ensinar o quê a Petrobras em termos de exploração offshore em águas profundas?

Perguntem aos técnicos da Petrobras (especialmente os que atuam em fluidos) o que a gerência da estatal está determinando que se ensine e entregue gratuitamente para o pessoal da petrolífera francesa.

Neocolonialismo se concentra na mente.

Orgulho de se juntar e entregar de graça o que foi desenvolvido pela estatal brasileira? 

Os entreguistas falam em modernidade por se juntar com quem vai aprender e ganhar muito dinheiro a partir da sua expertise.

Qual o quê... 

São crimes de lesa-pátria a serem punidos com rigor!

segunda-feira, janeiro 15, 2018

A quê e a quem tem servido a atividade de mineração no Brasil?

Uma breve entrevista do IHU (Unisinos) de um interessante estudo (análise) sobre a relação entre a mineração como atividade econômica exploratória e produtora de commodity e o desenvolvimento sócio-econômico nos municípios, onde existe a lavra - e são pagos os royalties (CFEM - Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais) - e onde se instalam os vários impactos sobre as comunidades.

Mina da Anglo American em Conceição do Mato Dentro, MG
A entrevista foi feita com professora-doutora, Heloísa Pinna Bernardo (UFJF) e traz observações interessantes, além de instigar e questionar o modelo de desenvolvimento agressivo derivado da atividade mineradora no território Brasileiro.

"Os achados do estudo indicam que a atividade mineradora relevante teve um efeito negativo sobre o Desenvolvimento Municipal"... "Na média, as cidades com atividade mineradora têm IDH menor do que as cidades sem atividade mineradora".

Leia a entrevista na íntegra aqui, incluindo a resposta à pergunta se é possível praticar a atividade mineradora de uma forma sustentável.

domingo, janeiro 14, 2018

"Não é ser petista, é ser justo", por Belluzzo

O bom Luiz Gonzaga Belluzzo produziu um interessante texto para falar sobre a conjuntura que envolve o julgamento do ex-presidente Lula, em Porto Alegre. Um artigo que vale ser lido e por isso reproduzo abaixo, por ser desnecessário arrumar palavras para dizer o mesmo.

Nesta linha, vários "Comitês em defesa da democracia e da candidatura de Lula" se espalham pelo país, possivelmente também em Campos dos Goytacazes.

Abaixo o texto do Belluzzo que é um chamado contra o fim da democracia que avança para a "pós-democracia" e aprofunda o golpe de 2016, porque eleição sem Lula é fraude:

Não é ser petista, é ser justo 

Defender Lula não é coisa de petista, nem de "esquerdista". Defender Lula é atitude de gente sensata, gente que sabe que o que está em jogo não é corrupção, apartamento triplex, sítio, pedalinho, nada disso.

 O que está em jogo é o sistema democrático brasileiro. O que está em jogo é a falência do sistema judiciário brasileiro que se tornou partidário e tão ou mais corrupto que o sistema político.

O que está em jogo é a imagem do Brasil perante o mundo porque nem mesmo os que acusam Lula estão convictos de que haja provas de corrupção do ex-presidente.

Vamos ser honestos, o processo é político e tem por objetivo tirar a maior liderança mundial da esquerda das eleições num país que vive um golpe de Estado, um golpe que tirou do poder uma mulher honesta, uma mulher nunca acusada, julgada e condenada por corrupção.

Sejamos honestos, o crime de Lula foi gerar ódio nessa elite que jamais aceitou que um torneiro mecânico, operário, nordestino e sem diploma tenha se tornado respeitado mundialmente, uma espécie de Nelson Mandela brasileiro, só que no combate à fome.

 Sejamos honestos, os que defendem a sua prisão são os mais corruptos, comprovadamente corruptos, homens sem amor ao povo brasileiro, homens que por dinheiro venderiam até a alma, quem dirá vender a riqueza nacional como estão a vender.

Defender Lula é hoje um dever de qualquer patriota, qualquer democrata, independente de partidarismo.

 Defender Lula é defender o Brasil e o que resta de dignidade nesse país. Lula não roubou, não recebeu dinheiro, não teve conta secreta descoberta na Suíça, nem dólares em paraísos fiscais.

Não caiu em áudio mandando matar, nem teve malas com milhões de reais com suas digitais. Lula elevou a condição de vida de milhões de brasileiros, provou que um homem de origem pobre e humilde pode ser Presidente e mais, pode ser o maior Presidente da história. Por isso a elite brasileira com seu complexo de inferioridade, com seu complexo de vira-latas jamais o perdoará.

O crime de Lula, na verdade, foi comandar um governo voltado para os mais pobres, um governo mais popular e independente, soberano e isso, amigos e amigas, jamais será aceito pela Casa Grande.

Defender Lula é defender a história, é defender a justiça, pois um homem respeitado no mundo todo não merece nos seus 72 anos de idade ser preso, condenado por um crime que não cometeu.

 Lula merece o apoio de todo o povo a quem ele tanto dedicou sua vida.

 Não é ser petista, é ser justo.

Fonte: http://mobile.valor.com.br/brasil/5251749/lula-e-um-mediador-esta-longe-de-ser-um-radical-diz-belluzzo

Soffiati segue revisitando e produzindo relatórios da eco-históra da região. Agora é a vez do eixo do complexo rio Iguaçu-lagoa Feia-rio Ururaí- lagoa de Cima-rio Imbé

O professor e ecologista Arthur Soffiati, prossegue revisitando e produzindo relatórios da eco-história das regiões do interior fluminense. Neste último relato, Soffiati explica a interpretação que faz para o eixo que liga, o que hoje é a Barra do Açu, no município de São João da Barra, até o município de Trajano de Morais na região Serrana Fluminense, passando pelo extenso município de Campos dos Goytacazes.

Assim, Soffiati detalha com vasto material visual (mapas, imagens e fotografias) sobre os recursos hídricos, a vegetação nativa e as intervenções humanas que foram produzindo transformações neste interessante território. É importante observar a integração regional a partir dos bens naturais e como o homem foi produzindo as transformações produzindo novas territorialidades a partir da forma de ocupação.

É um material muito rico que se soma aos anteriores que podem ser lidos, aqui, aqui e aqui e estão na seção, no lado direito do blog, com o título "Revisitando o Noroeste Fluminense", embora a pesquisa de campo tenha mostrado que a integração entre as regiões fluminenses exigiram que os relatos de campo fossem se estendendo para outros municípios e regiões do interior fluminense.

Vale ainda informar que logo abaixo desta nova seção, há outra com 20 textos analíticos do Soffiati que foram agrupados pelo título "Eco-história da Região São Tomé".

Afixem os cintos, abram as janelas e as mentes para viajar no espaço da geografia e no tempo da história desta região tendo como guia o bravo mestre Soffiati:


Revisitando a zona serrana do norte fluminense III: eixo do complexo rio Iguaçu-lagoa Feia-rio Ururaí- lagoa de Cima-rio Imbé
Arthur Soffiati

Explicando o eixo. De todos os eixos que ligam a zona serrana aos terrenos baixos da Ecorregião de São Tomé, o do rio Iguaçu é o mais complexo. Para compreendê-lo, é necessário um exercício de abstração, pois nem todas as partes do cordão existem em sua integralidade. O trecho territorial entre a margem direita do rio Paraíba do Sul e o primeiro estirão do rio Iguaçu, também conhecido como Barro Vermelho ou do Espinho é constituído por uma planície aluvial recente separada do mar por um alto cordão arenoso que liga duas restingas. Mas não é apenas essa dimensão que confere complexidade ao eixo, pois ele é formado pela lagoa Feia, onde nasce o Iguaçu. Também pelo rio Ururaí, que desemboca na lagoa Feia e começa na lagoa de Cima. Finalmente, o rio Imbé, que desemboca na lagoa de Cima e recebe as águas dos pequenos rios que descem da Serra do Mar (Imbé). Pois é esse eixo constituído de rios e lagoas entre a zona serrana e o mar que começamos a percorrer no dia 8 de janeiro de 2018. Ficamos apenas na parte baixa, entre Xexé e Barra do Furado.

            As localidades que pontuam o eixo, da costa para o interior, são Açu, Xexé, Farol, Barra do Furado, Ponta Grossa dos Fidalgos, Ururaí, São Benedito e Sossego do Imbé, para só assinalar os principais. Seguindo em frente, pode-se chegar a Trajano de Morais.



      

































      O rio Iguaçu, antes de 1935, quando começaram as obras de macrodrenagem da Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense, que passou a se denominar Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) em 1940, nascia da reunião de inúmeros sangradouros da lagoa Feia que se reuniam na lagoa do Lagamar. Os nomes dos principais são ou eram rios Velho, Barro Vermelho, Novo (no passado, Novo do Colégio), Furado, Pau Grande, da Onça, Caxexa, Angá, Carapebas, Bragança, Viegas, do Gil, Andreza. Depois de um desembocar no outro, todos confluíam na lagoa Lagamar. Dela, saía o rio Iguaçu propriamente dito, que recebia defluentes do rio Paraíba do Sul, formava o grande banhado da Boa Vista e desembocava no mar.





































Rio Iguaçu ou Barro Vermelho em Quissamã no verão de 2018


            Numa planície aluvial com mínima declividade entre a margem direita do rio Paraíba do Sul e o mar, corriam defluentes do grande rio para o Iguaçu. O principal deles era o Água Preta, aproveitado pelo DNOS para abrir o canal do Quitingute. O Iguaçu devia contar com grande vazão. Daí o nome I=água+guaçu=grande. Seguindo o eixo da parte baixa para a alta por água, seria preciso começar pela barra do Iguaçu (hoje, lagoa do Açu), seguir até o Lagamar, subir um sangradouro da lagoa Feia até o corpo dela, navegar o rio Ururaí até a lagoa de Cima e, dela, subir o rio Imbé. A zona serrana teria sido atingida. Trata-se de um eixo difuso e complexo, no passado perfeitamente navegável. Hoje, não mais.

Águas. Na planície entre a margem direita do rio Paraíba do Sul e o rio Barro Vermelho, havia uma profusão de canais naturais e lagoas. Tratava-se de um conjunto complexo de ecossistemas aquáticos. Todos os cartógrafos que tentaram registrar a infinidade de lagoas e canais acabaram simplificando o conjunto, já que ele mudava sensivelmente com as estiagens e as cheias. Essas águas se acumulavam e vertiam lentamente para o Lagamar, onde havia uma barra que as escoava para o mar. Ela era aberta naturalmente por força das águas ou por braços humanos. Mesmo assim, sua abertura era insuficiente para esgotar o excedente hídrico. As aguas seguiam adiante até o mar pelo rio Iguaçu, cuja foz ficava num ponto mais protegido das fortes correntes marinhas. Em 1688, o capitão José de Barcelos Machado abriu uma vala até o mar que se chamou Barra do Furado. Mesmo assim, escoadas as águas consideradas excedentes para a agropecuária, o mar vedava tanto a barra do Furado quanto a barra Velha, no Lagamar. Mesmo a barra do rio Iguaçu não se mantinha permanentemente aberta. Água e terra, portanto se misturavam antes de 1935. O DNOS tentou impor ao complexo uma ordem euclidiana, ou seja, geométrica. Essa nova ordem se superpõe à antiga, que sempre amaça voltar quando a nova ordem não recebe manutenção.


Mapa organizado por Alberto Ribeiro Lamego em 1954 retratando parte da antiga fisionomia hídrica anterior a 1935.

Vegetação nativa. A planície entre a margem direita do rio Paraíba do Sul e o rio Barro Vermelho é formada por uma zona aluvial e por uma restinga. A parte aluvial foi construída, em sua maior parte, pelo Paraíba do Sul, que transportou sedimentos da zona serrana e dos tabuleiros para dentro de uma semilaguna, a partir de 5.100 anos antes do presente. A semilaguna era demarcada por um cordão de ilhas compridas situadas além da linha da costa atual, como mostram Martin, Suguio, Dominguez e Flexor. Essas ilhas foram erodidas, consolidando-se a costa em ponto mais recuado ao sul. A parte oriental da planície aluvial foi alongada por uma grande restinga. A sudoeste da planície já existia uma planície bem mais antiga, com idade de 123 mil anos antes do presente. Ela era mais alta que os terrenos novos da baixada fluviomarinha, mas, sofrendo um processo natural de rebaixamento (subsidência), ela se nivelou à planície recente. Ondas formaram nessa restinga antiga um cordão de lagunas paralelo à costa.


Mapa sobre a formação geológica da planície dos Goytacazes organizado por Martin, Suguio, Dominguez e Flexor, 1997

            Hildebrando de Araújo Góes, em seu relatório de 1934, não levou em consideração as idades de formação das planícies, considerando como uma única baixada as terras que se estendem entre a margem direita do Paraíba do Sul e a margem esquerda do rio Macaé. Ainda não existiam estudos pormenorizados de geologia. O grau de umidade variava no interior da planície, sendo maior nos cursos d’água e lagoas e menor nas restingas, com solo arenoso.

            As formações vegetais nativas variam de acordo com a umidade. Nas desembocaduras dos rios no mar, formaram-se manguezais, classificados por Veloso como formações pioneiras de influência fluviomarinha. Nas lagoas, desenvolveu-se uma vegetação de pequena estatura denominada de pioneira de influência fluvial. Nas restingas, a influência da salinidade e do mar condicionou um tipo de vegetação denominada de pioneira de influência marinha. Nas partes mais altas da planície aluvial, cresceram tufos de florestas que podem ser chamadas de higrófilas.

De todas as formações vegetais nativas que ocorrem neste trecho da costa, a mais indicativa das transformações impostas pela economia de mercado a partir do século XVII é o manguezal. Levanto a hipótese de que este tipo de vegetação se estendia ao longo do rio Iguaçu, que corria atrás da crista arenosa no passado, da sua foz a um ponto do rio, hoje nas imediações da fazenda São Miguel, em Quissamã. Suponho que a influência de maré chegava até lá, transportando sementes (propágulos) das três espécies exclusivas de mangue mais comuns na região: o mangue vermelho (Rhizophora mangle), a siribeira (Avicennia germinans) e o mangue branco (Laguncularia racemosa).


Antigo rio Iguaçu com suas três saídas para o mar. Mapa de Bellegarde e Niemeyer-1865


Pontos da costa de Campos e de Quissamã em que ocorrem manguezais: 1- Manguezal da lagoa do Açu; 2- manguezal da Carapeba; 3- manguezal do canal da Flecha; 4- manguezal da fazenda São Miguel

            Sucede que as obras empreendidas pela Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense e pelo DNOS, a partir de 1935/1940, substituíram o rio Iguaçu pelo canal da Flecha. Os moradores mais antigos dessa costa não chegaram a conhecer tais obras e pensam que a configuração geográfica atual existe desde sempre. O Iguaçu foi abandonado e secionado em vários trechos. As marés não sobem mais pelo seu curso como antigamente.


Em mapa de A.R. Lamego, os defluentes da lagoa Feia. Em vermelho, pode-se considerar a ligação de quatro cursos d’água como o antigo rio Iguaçu. Em azul, o canal da Flecha seccionou o complexo. 

O manguezal que começava na foz do Iguaçu (hoje lagoa do Açu) corria na retaguarda do cordão sobre o qual se ergueriam as localidades de Xexé e de Farol de São Tomé e chegava à fazenda São Miguel. Dele, restaram três fragmentos: o da foz, que se estende por 10 quilômetros num canal embutido na restinga, o da ilha da Carapeba, na margem esquerda do canal da Flecha, e o da fazenda de São Miguel.


Manguezal da lagoa do Açu: população de mangue de botão entre outras espécies. Foto da década de 1990

            O fragmento com maior diversidade é o primeiro, junto à foz. Além das três espécies exclusivas desse ecossistema, encontra-se ainda o mangue de botão (Conocarpus erectus), que pode crescer em outro ambiente. No fragmento da ilha da Carapeba, até o momento, só foi encontrado o mangue branco, que forma um vasto bosque sob forte estresse. Na fazenda São Miguel, restou apenas um tufo de manguezal, com diversidade menor que o de foz, mas com diversidade maior que o da Carapeba. Esse tufo já passou por secas ingentes, levando os estudiosos (poucos) a concluir por sua extinção. Contudo, ele se renovou e apresenta exemplares de mangue branco e de siribeira florindo, frutificando e se reproduzindo em condições precárias.


Manguezal da ilha da Carapeba em 2013: na frente, areia da restinga; no fundo, população de mangue branco

            A novidade é que o canal da Flecha formou um estuário instável que permitiu a entrada de sementes de mangue branco formadores de um pequeno manguezal na margem direita do curso d’água, no lado de Quissamã, junto à vila de Barra do Furado. O autor presenciou a formação deste manguezal monoespecífico nos anos de 1990. Mesmo que moradores locais afirmem que os quatro exemplares iniciais foram plantados por mão humana, eles não têm relação com o antigo rio Iguaçu.


Exemplares de mangue branco na margem direita do canal da Flecha na década de 1990. Pais do manguezal atual


Manguezal da margem direita do canal da Flecha em 2018

Mas apenas levanto a hipótese de que o manguezal da Carapeba e da Fazenda São Miguel são fragmentos do longo manguezal que se desenvolveu no curso do antigo rio Iguaçu e seus formadores. À medida que ele se estendia nas margens dos rios, a biodiversidade ia se empobrecendo. Curioso que, na Carapeba, ele seja formado apenas pelo mangue branco e em ponto mais recôndito e impróprio, como na fazenda São Miguel, ele conte com duas espécies. Seria preciso um estudo de sedimentos (sedimentologia) e de pólen (palinologia). Alguns já foram empreendidos na região, mas não conto que outros sejam feitos para desvendar o mistério que encontrei.


Manguezal (seco) da fazenda de São Miguel na década de 1990.


Manguezal da fazenda São Miguel com duas espécies exclusivas em 2018

            A segunda hipótese está associada ao canal da Flecha. Teria ele permitido a colonização da ilha da Carapeba por mangue branco? As duas espécies de mangue na fazenda São Miguel teriam penetrado quando da abertura periódica da comporta do rio Espinho ou Iguaçu? Caso ele tenha aproveitado uma abertura de comporta, cumpre saber como resiste, floresce e se reproduz sem a influência das marés. Quanto ao manguezal da margem direita do canal da Flecha, em Quissamã, não resta dúvida de que os exemplares da espécie entraram pelo canal ou foram plantados, embora seja raro uma pessoa plantar mudas (plântulas) de manguezal. Seu crescimento foi rápido. As condições eram razoavelmente favoráveis para tanto. Embora o estuário (encontro de rio e mar) formado no canal sofra muitas variações entre o período da estiagem, quando as comportas que controlam o fluxo de água doce proveniente da lagoa Feia são fechadas, e o período de cheia, quando elas são abertas, o mangue branco resiste a essas variações.

            Crescendo sobre solo arenoso, os cinco exemplares disseminaram sementes (propágulos) e formaram um bosque, criando um substrato lamoso, típico de manguezal. Curioso notar que, antes mesmo desse bosque, já havia guaiamum na área, como a demarcar um manguezal inexistente, mas potencial. Hoje, com o substrato lamoso, podem ser encontrados vários exemplares do caranguejo-uçá, que vive no centro do manguezal. Eles ainda não são coletados para consumo porque a tradição pesqueira de Barra do Furado se volta para a pesca no mar ou no canal. A economia local ainda não descobriu essa espécie. Por enquanto, ela está protegida pelo desconhecimento.


Exemplar de caranguejo-uçá no manguezal da margem direita do canal da Flecha em 2018
           
Transformações humanas. Foi no trecho costeiro entre a margem direita do Paraíba do Sul e as cabeceiras do rio Iguaçu que começou a colonização europeia continua do futuro norte fluminense. Afirma-se, sem a devida pesquisa, que pescadores vindos de Cabo Frio fundaram São João da Barra em 1622. A atividade pesqueira já era praticada pelos índios goitacás. Portanto a pesca não era novidade nem exigia a transformação do ambiente. O volume de água interior era altamente favorável à pesca.

            Com mais documentação, pode-se sustentar que criadores de gado bovino e cavalar chegaram ao cabo de São Tomé em 1632 provenientes do Rio de Janeiro e de Cabo Frio para tomar posse das terras requeridas a título de sesmarias. Trata-se dos Sete Capitães, que deixaram um diário de viagem. Eles e seus herdeiros iniciaram a conversão de uma planície superúmida em área seca. Em 1688, um herdeiro abriu a vala do Furado para o escoamento de água doce para o mar.

            Logo em seguida, a planície foi dividida em quatro grandes propriedades rurais com pequenas propriedades alodiais entre elas. Uma das grandes propriedades pertenceu aos jesuítas até 1759, quando a ordem religiosa foi expulsa do império colonial português por iniciativa do Marquês de Pombal. Os religiosos se incumbiam da limpeza dos canais naturais valendo-se do trabalho escravo.

            Depois da expulsão da ordem, a limpeza foi negligenciada. Na primeira metade do século XIX, a aristocracia rural comandou a abertura de quatro canais para atender a economia. O maior deles foi o canal Campos-Macaé. Na segunda metade do mesmo século, as ferrovias substituíram as hidrovias, contribuindo para a revolução industrial regional com a substituição dos antigos engenhos por grandes usinas e engenhos centrais.

            A demanda por terras secas que permitissem a expansão dos canaviais levou os governos central e estadual a criar comissões de drenagem. Apenas uma se sustentou. Foi a Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense, criada pelo governo de Getúlio Vargas em 1933. Em 1935, ela começou a operar. Em 1940, ela passou a se chamar Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS), com atuação em todo o território brasileiro. Em 1950, a estrutura de canais, comportas e diques estava praticamente instalada. A parte do território escolhida foi exatamente aquela que se estende da margem direita do Paraíba do Sul ao trecho inicial do rio Iguaçu.   
  
            Este foi substituído pelo canal da Flecha, com a intenção de escoar com mais rapidez as águas da baixada para o mar. A área mais úmida e mais complexa da planície é a que conta com a maior rede de canais de drenagem da região, do Estado, da União e uma das maiores do mundo. O dessecamento da baixada permitiu o avanço da agropecuária, mas acarretou a drástica redução de áreas pesqueiras, afetando os pescadores. Acarretou também desequilíbrios ambientais que potencializam as estiagens e as cheias, hoje conhecidas como secas e enchentes.



            A urbanização também começou por este trecho da baixada. Macaé já existia enquanto arraial quando os Sete Capitães vieram tomar posse de suas terras. Logo em seguida, ergueram-se Campos e São João da Barra. Vários povoados foram surgindo ao longo da costa dessa planície, como Atafona, Gruçaí, Açu, Xexé, Farol, Barra do Furado e João Francisco. Todas começaram como pequenos aglomerados formados por casas com paredes de barro e telhado de palha, como registraram os viajantes europeus e o antropólogo Luís de Castro Faria.


Casas de palha em Ponta Grossa dos Fidalgos. Foto de Casto Faria, 1941
Nenhum alcançou o estatuto de cidade. Atualmente, a urbanização exagerada e descontrolada gera também problemas socioambientais.

O que restou do patrimônio. As intervenções da economia de mercado na área em apreço produziram transformações de tal monta que poucos testemunhos da natureza de 1500 e do patrimônio cultural posterior restaram. Quem examina uma imagem de satélite da região nota que, sob as mudanças processadas a partir de 1935, sobretudo, pulsa ainda a antiga realidade anterior profunda. Na superfície, restaram poucas amostras de ecossistemas, quase nenhuma íntegra. Da barra do rio Iguaçu, hoje conhecida como lagoa do Açu, o leito do antigo rio em cerca de 10 quilômetros, o banhado da Boa Vista e parte do rio Água Preta foram arrolados como área a ser protegida por uma Unidade de Conservação pelo Plano Diretor de Campos dos Goytacazes, datado de 2008. O Instituto Estadual do Meio Ambiente a requisitou para ser protegida pelo Parque Estadual da Lagoa do Açu.



            Daí em diante, existe um belo fragmento de vegetação de restinga imprensado entre as localidades de Xexé e do Farol, que deve ser ocupado pela especulação imobiliária, caso o poder público de Campos não crie uma UC para sua proteção. A providência deve ser rápida, já que olhares cobiçosos se debruçam sobre ele.



Daí em diante, encontra-se a lagoa Lagamar, teoricamente protegida por uma Área de Proteção Ambiental. Ela foi transformada num ponto de espetáculos musicais durante o período de veraneio e de carnaval. Com a crise econômica nacional e municipal, o local caiu no abandono, o que representa uma grande oportunidade para a Prefeitura de Campos se empenhar para que a área volte a cumprir seus objetivos originais de proteção ambiental. 
 
Por fim, o manguezal da ilha da Carapeba, listado no Plano Diretor como UC, mas completamente abandonado ao despejo de lixo dos frigoríficos do Farol principalmente. Estes quatro pontos poderiam ser administrados por um mosaico de UCs, o que baratearia o custo de manutenção.

Já quanto ao patrimônio cultural, ele é bem mais frágil que o patrimônio natural. O farol de São Tomé é um monumento que, por todos os títulos, merece proteção.

Não restou nenhuma casa de palha, como era conhecido este bem material no passado em todo núcleo populacional na planície. Com dificuldade, encontramos uma casa antiga, mesmo assim já em alvenaria que pertenceu a Cândido Manoel dos Santos (conhecido como Candu). Ele já faleceu e a casa deve estar em poder de sua família.


Antiga casa de alvenaria em Barra do Furado

A capela de São Miguel, na fazenda de mesmo nome, em Quissamã, data de 1974, mas foi erguida em homenagem a um dos primeiros pontos a serem colonizados por portugueses, no século XVII. Deveria contar com proteção especial.


Capela de São Miguel

            Por fim, a imponente sede da fazenda Capivari, às margens da lagoa Feia é um prédio que se impõe pelo seu valor cultural.


Leituras complementares
GABRIEL, Adelmo Henrique Daumas e LUZ, Margareth da (Orgs.); FREITAS, Carlos Roberto B.; SANTOS, Fabiano Vilaça dos; KNAUS, Paulo; SOFFIATI, Arthur (notas explicativas) e GOMES, Marcelo Abreu. Roteiro dos Sete Capitães. Macaé: Funemac Livros, 2012.

GÓES, Hildebrando de Araujo. Saneamento da Baixada Fluminense. Rio de Janeiro: s/e, 1934.

LAMEGO, Alberto Ribeiro. Geologia das quadrículas de Campos, São Tomé, Lagoa Feia e Xexé. Boletim nº 154. Rio de Janeiro: Departamento Nacional da Produção Mineral/Divisão de Geologia e Mineralogia, 1955.

LAMEGO, Alberto Ribeiro. Restingas na costa do Brasil. Boletim nº 96. Rio de Janeiro: Ministério da Agricultura/Departamento Nacional da Produção Mineral/Divisão de Geologia e Mineralogia, 1940.

MARTIN, Louis; SUGUIU, Kenitiro; DOMINGUEZ, José M.L. e FLEXOR, Jean-Marie. Geologia do Quaternário Costeiro do Litoral norte do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. Belo Horizonte: CPRM, 1997.

SOFFIATI, Arthur. A história ambiental de um campo nativo de planície. Anais do III Encontro da ANPPAS. Brasília: Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade, 2006.

SOFFIATI, Arthur. História das ações antrópicas sobre os ecossistemas vegetais nativos das regiões norte e noroeste do Estado do Rio de Janeiro. Perspectivas v. 4, nº 7. Institutos Superiores de Ensino do CENSA. Campos dos Goytacazes (RJ): ISE/CENSA, jan./jun. de 2005.

SOFFIATI, Arthur. Os canais de navegação do século XIX no Norte Fluminense. Boletim do Observatório Ambiental Alberto Ribeiro Lamego nº 2 (Edição Especial). Campos dos Goytacazes: CEFET Campos, jul/dez 2007.

SOFFIATI, Arthur. Os manguezais do sul do Espírito Santo e do norte do Rio de Janeiro (com alguns apontamentos sobre o norte do sul e o sul do norte), 2ª edição. Campos dos Goytacazes: Essentia, 2014.


VELOSO, Henrique Pimenta; RANGEL FILHO, Antonio Lourenço Rosa e LIMA, Jorge Carlos Alves. Classificação da vegetação brasileira, adaptada a um sistema universal. Rio de Janeiro: Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1991.