sexta-feira, junho 28, 2019

Prumo levanta a hipótese de montar planta de liquefação de gás natural no Porto do Açu: como o setor de energia, para além do petróleo, torna o território do litoral fluminense estratégico para o capital, onde a população se alimenta de uma vaga noção de "progresso"

A informação sobre a ideia de uma unidade de liquefação de gás natural no Açu foi veiculada há um mês, em matéria da revista Brasil Energia. A ideia do projeto seria de um parceria (joint venture) a ser formada pela Prumo Logística (através da Gás Natural Açu- GNA Açu), e as empresas BP e Siemens.

O projeto tem como oportunidade a identificação de uma alta produção de gás nos campos de petróleo da Bacia de Santos e Pré-sal. Depois dessa informação, aparentemente solta, o blog teve acesso à informação recente de que a ANP autorizou o Brasil a exportar GNL.

Terminal da Cheniere, Sabine Pass, em Lousiana, Texas, EUA.
Unidade de liquefação e exportação de GNL dos EUA 
A decisão pareceu estranha na medida em que o Brasil, não possui unidades de liquefação de gás natural, importando GNL através de terminais no Rio, Bahia e Ceará para suas unidades de regaseificação já instaladas e outras em implantação, inclusive junto ao Porto do Açu.

Uma unidade de liquefação tem instalação ainda muito cara, mesmo que o custo de sua instalação venha se reduzindo o que esteja tornando o transporte de gás natural mais comum de forma intercontinental pelos navios gaseiros, prescindindo assim dos gasodutos que produzem enormes impactos e conflitos socioambientais quando da sua instalação. 

O custo de uma unidade de liquefação, dependendo do porte ainda fica em torno de US$ 7 bilhões. É mais cara que a implantação de um refinaria, evidentemente, dependendo do porte e capacidades de processamento. Isso só a unidade de liquefação fora custos de fretes e transportes.

Cadeia de valor do GNL - Upstream: Extração e Liquefação;
Midistream: transporte por navios/regaseificação/gasodutos;
Downstream: Distribuição e venda aos consumidores finais.

Mesmo que seja uma unidade complexa e cara o que se faz é simples de ser compreendido pelos que não são do setor. Para tornar líquido o gás natural, para que ele possa ser transportado por navios é só reduzir a sua temperatura a cerca de menos 250º C. Depois para regaseificá-lo é só ir aproximando-o da temperatura ambiente para que o mesmo volte à condição gasosa. Esse processo bem mais simples e barato, muitas vezes é feito no próprio navio. Vale dizer que o custo de uso diário destes navios chegam a superar US$ 150 mil/dia.

Mais detalhes sobre a importância estratégica do gás natural como combustível de transição (entre o carvão, petróleo e a energia renovável) na matriz energética mundial e sobre esses processos de liquefação e transportes, podem ser acessados neste artigo que publiquei aqui no blog em 11 de julho de 2016 com o título: "A ampliação do poder estratégico e geopolítico do Gás Natural (GNL) na matriz energética mundial". [1]


O gás natural como combustível estratégico de transição
No mundo de uma maneira geral, as reservas de gás são distintas das de óleo. A Rússia possui muito mais reservas de gás do que de petróleo. O mesmo a Argentina. Em nossas bacias petrolíferas no litoral brasileiro não. As reservas de óleo e gás estão juntas, em proporções distintas.

As reservas do pré-sal possuem muito gás natural, o que inclusive pode limitar a extração de petróleo, se não houver formas de escoamento do gás natural, porque há limite de queima do gás não utilizado ou escoado definidos pela ANP. Hoje, no caso do pré-sal, uma parte expressiva do gás tem sido re-injetado no poço para auxiliar e ampliar a extração de petróleo nos poços.

No auge da fase de boom do ciclo petro-econômico no Brasil (sobre esse assunto ver tese do autor) [2], a Petrobras chegou a pensar, mesmo que superficialmente, em desenhar a implantação de uma unidade de liquefação de gás natural que seria offshore, junto ao megacampo de Libra (rico em gás), localizado na reserva do pré-sal na Bacia de Santos para processar o gás dali extraído direto para transporte até o continente nos portos do Brasil e/ou para exportação. 

O custo da unidade unidade de liquefação offshore aliado ao enorme desafio da Petrobras, na ocasião envolvida com vários projetos caros e em implantação (sondas, plataformas, petroleiros, refinarias, unidades de fertilizantes, etc.) deixou a ideia como tal, sem nenhuma consequência.

No mundo, com a ampliação da extração/produção de gás xisto nos EUA, as exportações de LNG se ampliaram muito pelo mundo. A produção de GNL dos EUA é de longe a mais alta de qualquer país, com 4,3 milhões de bpd (um subproduto do boom do gás de xisto). Isso é mais do que todo o Oriente Médio e responde por 37,6% da produção global total de GNL. Em termos apenas da produção de gás, a maior do mundo ainda é da Rússia com 11,2 milhões de bpd; seguido de perto pelo EUA com 11,0 milhões de bpd. Em terceiro a Arábia Saudita com 10,5 milhões de bpd. [3]

Abaixo um mapa sobre movimentação (fluxo) e comércio de LNG entre vários países do mundo.  

Mapa dos fluxos (comércio) de Gás Natural e GNL em 2018: em bilhões de metro cúbicos.
Fonte: Statistical Review of World Energy - 2019. p.41/62

























O gás natural como um hub no Açu e um motor econômico na região 
Voltando à ideia das empresas Prumo, Simens e BP de implantação de uma unidade de liquefação junto ao Porto do Açu. Ela pode ser novamente só uma ideia, na medida em que demandará enormes investimentos.

Porém, considerando a oferta de gás natural e as possibilidades de rentabilidade desejadas pelos investidores, o processamento, venda e/ou exportação de gás natural, pode interessar e avançar, embora hoje exista enorme concorrência no comércio mundial de LNG. Um setor oligopolizado, como é comum nesse setor que lida energia sobre a forma de commodities.

É nesse espaço que entram os interesses de investidores. Em especial os que atuam no âmbito global. Por isso, não há como analisar esse setor sem considerar as redes de produção dentro das cadeias globais de valor.

No momento parece que eles, em especial, os grandes fundos de investimentos, estão mais interessados em ter acesso - em aquisição a preços módicos - aos ativos decorrentes das privatizações da Petrobras e do setor de energia elétrica com a entrega também dos ativos da Eletrobras. São muitas e variadas as possibilidades de compras a preço de final de feira, de um "Brasil baratinho".  Fator que pode consumir os investimentos que ajudariam a bancar projetos novos de "Infraestrutura e Energia", como é o caso que estamos analisando.

Para os donos do capital é melhor e mais rentável ter aquilo que já produz lucros e acumulações no curto prazo e sem trabalho e custos (muitas vezes imprevisíveis) de implantação. Para o país é evidente que uma decisão atrapalha a outra. Há muitas pessoas e analistas que não querem entender essa lógica porque olham só o lado do investidores e não da nação. E essa lógica se reflete em decisões estratégicas de financiadores e corporações globais que olham o país, quase que somente como forma de ampliar os seus lucros e as suas acumulações que vão multiplicar os ativos financeiros globais que já ultrapassaram US$ 400 trilhões em todo o mundo.

A Prumo Logística Global é a holding (grupo) que controla o Porto do Açu e a GNA-Açu, que por sua vez, como num pirâmide de holdings, é controlada pelo fundo financeiro americano EIG Global Energy Partners. Fundo que foi se especializando em negócios de energia (que está em seu nome) e de infraestrutura em várias partes do mundo. Fato que aumenta o potencial da ideia.

Porém, foi esse fundo EIG quem desenhou financeiramente os investimentos para instalação deste seu hub de gás, com terminal portuário para regaseificação de gás natural, ramal de gasoduto interligando em Campos, o Gascav (que liga Macaé a Vitória) e duas usinas termelétricas (UTEs) à gás natural, e para isso montou através da GNA, um consórcio de parceria com a Siemens e financiamento de banco alemão KfW com intermediação do Banco Mundial (IFC) e BNDES. Sobre o assunto veja outra postagem do blog 28/12/2018 : "UTE do Porto do Açu capta R$ 1,76 bilhão com o BNDES e garantia do banco alemão KfW" [4]. Esse conjunto de projetos do hub de gás somados demandaram aportes de mais de R$ 8 bilhões que estão sendo paulatinamente utilizados.

Terminal de Cabiúnas em Macaé:
maior polo brasileiro de processamento de gás natural
Além dos projetos de gás natural no no Porto do Açu, no município de São João da Barra, o município de Macaé, base executiva da Bacia de Campos já é o maior polo de gás natural do Brasil. Ali chegam diversos gasodutos da Bacia de Campos, Santos e do Pré-sal e são processados na Unidade de Cabiúnas quase 30 milhões de m³ por dia.

Também no antigo Terminal de Cabiúnas (Tecab) atual UTGCAB (Unidade de Tratamento de Gás de Cabiúnas) há processo de liquefação de gás para ser engarrafado e vendido como botijões. Além disso, Macaé possui duas usinas termelétricas em funcionamento : UTE Mário Lago – ex-El Paso com capacidade de geração de 932 MW e UTE Norte Fluminense com capacidade de geração de 780 MW. de energia elétrica. [5] [6] [7]

Há ainda em Macaé o projeto de instalação da UTE Vale Azul, já licenciado, que era da EBTE e foi adquirido pelo fundo investimento Pátria (50,1%), Shell (29,9%) e a Mishitubishi (MHPS) com 20%. As duas UTEs ajudam a ampliar o orçamento do município de Macaé por conta dos repasses das quotas-partes de ICMS que vem do estado. Assim, a quota-parte é para Macaé sua segunda maior receita, só atrás do ISS (Imposto sobre Serviços), mas na frente das receitas dos royalties do petróleo. [8]


Energia como commodity lucrativa para as empresas (capital) e pouco retorno para a população 
Enfim, o setor de energia, de uma forma ou outra, está se tornando um enorme potencial econômico para essa parte do ERJ. Os projetos de terminais portuários, uso de gás para geração térmica, vai bem além daquilo que o circuito da Economia do Petróleo com exploração offshore foi sendo estruturado em três/quatro décadas, desde 1974.

Hoje, o setor de energia, envolvendo o gás natural, a geração de eletricidade sob a forma térmica e vários outros projetos de energia renováveis que estão em fase adiantadas de negociações e amadurecendo (eólica e solar) na região, tornam esse vetor com enorme potencial econômico. 

Há que se considerar ainda, as possibilidades de uso de estoques de terras relativamente baratas, oriundas de uma baixa utilização na atividade canavieira e/ou pecuário tem a perspectiva de se transforma numa nova forma de rentismo para os proprietários de terra.

Vários proprietários de terras em Campos dos Goytacazes, São João da Barra e São Francisco do Itabapoana foram procurados por pessoas interessadas em arrendar ou alugar terras (por até 25 anos) para a instalação de usinas eólicas e solares (fotovoltaicas).

Porém, resta saber o que fica para a região além dos impostos, na medida também que muitos desses projetos vêm acompanhados de isenções ou incentivos tributários, além das exigências assumidas pelos diferentes níveis de governo para construir acessos rodoviários e viabilizar aquilo que se chama no campo da economia de Condições Gerais de Produção. Em nome dos anúncios de empregos, muitas vezes fantasiosos divulgados pelo forte marketing promovidos pelos empreendedores, prefeitos e governadores são convocados (ou se oferecem) para reduzir impostos e oferecer garantias e apoios aos projetos.

Nessa área de energia, os empregos gerados acontecem em maiores proporções quando da construção, que aliás atrai levas de trabalhadores de fora, que já são conhecidos dos gerentes das empresas construtoras e instaladoras chegam na região onde o projeto é instalado. Porém, é fato que acabam empregando muita pouca gente (muito pouco mesmo), depois para as atividades de operação e manutenção dessas usinas de geração de eletricidade. 

As populações no geral, acabam impactadas pelos projetos das mais diferentes formas. Sofrem não apenas os efeitos socioambientais mais diretos, mas também o aumento do custo de vida na região, a competição para acesso aos equipamentos públicos de saúde e educação e ainda a pressão por investimentos em moradia, saneamento e as consequências de tudo isso na segurança pública, entre outros.

Assim, os problemas se instalam e muitas vezes são naturalizados e vistos como partes de um progresso para poucos. Os empreendedores e investidores que moram nas metrópoles do mundo aumentam seus faturamentos e lucros e se sustentam no discurso e na narrativa - paga às mídias locais/regionais - que tratam de ideia vaga de progresso em meio a imagens de vidas irreais.

Como já disse em algumas outras postagens similares a esta. Esses textos têm a intenção não apenas jogar mais uma informação solta e fragmentada como acontece no dia-a-dia. Eles guardam o objetivo o de contribuir para que as pessoas possam linkar pontas de notícias soltas que levam a interpretações muitas vezes equivocadas e distorcidas, sobre uma noção colonizada de um falso "progresso" e de um desenvolvimentismo ultrapassado, onde sempre ganha - e mais - os que sempre ganharam e perdem - e mais - os que sempre perderam.

Referências:
[1] Mais detalhes sobre o processo de liquefação e regaseificação do gás natural e o aumento do papel estratégico do uso do LGN no mundo pode ser visto aqui na postagem do blog feita em 11 de jul de 2016, com o título: A ampliação do poder estratégico e geopolítico do Gás Natural (GNL) na matriz energética mundial. No texto que é um artigo há várias referências e outras postagens que falam do aumento do poder estratégico do gás natural na matriz energética mundial e na geopolítica. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/07/a-ampliacao-do-poder-estrategico-e.html

[2] Sobre Ciclo Petro-Econômico ver tese do autor (1ª parte, capítulo 7-1.7) defendida em mar. 2017, no PPFH-UERJ: “A relação transescalar e multidimensional “Petróleo-porto” como produtora de novas territorialidades”. Disponível no Banco de Teses da UERJ: http://www.bdtd.uerj.br/tde_busca/processaPesquisa.php? pesqExecutada=1&id=7433&PHPSESSID=5vd3hsifip5hdg3n1icb57l9m6

[3] Postagem do blog em 24 de junho de 2019 que analisa a geopolítica do petróleo e gás natural à luz dos indicadores que indicaram recordes em 2018. Recordes mundiais de consumo e produção de petróleo em 2018 reforçam o seu peso sobre a geopolítica. Disponível em: https://www.robertomoraes.com.br/2019/06/recordes-mundiais-de-consumo-e-producao.html

[4] Postagem do blog em 21 de dezembro de 2018. UTE do Porto do Açu capta R$ 1,76 bilhão com o BNDES e garantia do banco alemão KfW. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2018/12/ute-do-porto-do-acu-capta-r-176-bilhao.html

[5] Postagem do blog em 1 de junho de 2015. Unidade de Gás da Petrobras em Cabiúnas, em Macaé tem autorização para operar novas unidades e ampliar processamento: mudanças espaciais no NF. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2015/06/unidade-de-gas-da-petrobras-em-cabiunas.html

[6] Postagem do blog em 3 de maio de 2016 quando afirmo que o "Terminal de Cabiúnas é o maior polo brasileiro de processamento de gás natural". O título da postagem foi: "Discussão sobre a crise em Macaé tem prioridade invertida". Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/05/discussao-sobre-crise-em-macae-tem.html

[7] Postagem do blog em 15 de maio de 2016. Gasoduto que interliga Pré-sal da Bacia de Santos ao Terminal de Cabiúnas em Macaé é simbólico e inverte relação que havia com o óleo entre o RJ e SP. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/05/gasoduto-que-interliga-pre-sal-da-bacia.html

[8] Postagem do blog em 13 de fevereiro de 2019. Fundo financeiro - e não Shell - construirá e controlará a UTE à gás anunciada para Macaé: impacto regional em empregos, impostos e no ambiente. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2019/02/fundo-financeiro-e-nao-shell-construira.html

PS.: Atualizado às 17:46 e 18:02: Para acrescentar imagem sobre a cadeia global de LNG e alguns ajustes nas informações e texto.

quinta-feira, junho 27, 2019

Fundos financeiros alcançam ativos de R$ 5 trilhões equivalentes a 75% do PIB do Brasil

O blog e seu autor vem há algum tempo chamando a atenção para o papel crescente dos fundos financeiros na economia e no capitalismo brasileiro, em especial após a crise global de 2008.

O leitor mais frequente do blog pode considerar isso uma repetição, mas o crescimento é espantoso ano a ano. Em 2017 eu chamei a atenção aqui para o fato dos fundos estarem chegando a 2/3 do PIB. Um ano depois em novembro de 2018, postei aqui que os fundos tinham captado R$ 500 bilhões, em plena crise e o patrimônio líquido total dos findos no Brasil tinham chegado a R$ 4,5 trilhões.

Pois bem, na semana passada, 18 de junho de 2019, a Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) entidade que organiza o setor, informou que o "patrimônio líquido da indústria de fundos" tinha chega a R$ 5 trilhões. Isso mesmo: R$ 5 trilhões!

No dia 21 de junho, o site especializado em notícias do setor financeiro Infomoney (veja aqui) ampliou a divulgação sobre esse volume de ativos que equivale a 3/4 do PIB anual do país em 2018.

De acordo com ranking mundial da IIFA (Associação Internacional de Fundos de Investimento) com sede em Toronto, no Canadá, o Brasil ocupa o 10º lugar entre as maiores indústrias de fundos do globo, num universo de ativos globais que chegam a US$ 53,9 trilhões.

Apenas os EUA tem quase metade desse volume com US$ 22 trilhões e é seguido em 2º lugar por Luxemburgo com US$ 5,1 trilhões e Irlanda, em 3º lugar com US$ 2,9 trilhões, que são conhecidos paraísos fiscais.

Assim no Brasil, os fundos financeiros totalizaram 16,4 milhões de contas ativas. Outro número que espanta. Só em 2019, em meio ao agravamento da crise e recessão na economia brasileira, a captação acumulada dos fundos financeiros atingiu R$ 156,2 bilhões. 

Embora os fundos financeiros existam no mundo há quase um século, foi a partir da crise financeira global de 2008 que eles ganharam potência e descobriram novas estratégias para atuar na valorização da produção material e de forma simultânea no rentismo e nas estratégias do dinheiro como mercadoria (valorização fictícia ou capitalização). 

Assim, em todo o mundo os fundos financeiros globais foram ampliando o seu volume de ativos e se tornaram o instrumento de maior potência do capitalismo contemporâneo hoje hegemonizado pelo setor financeiro.

Os fundos de investimentos promovem uma colossal mobilidade do capital pela sua articulação com o mercado de capitais, o sistema bancário, o rentismo junto com o mundo dos derivativos e mercado futuro, assim como a produção material onde ele também aporta em capital fixo, controle das corporações, investimentos em infraestruturas e fortes redes de serviços e comércio em todo o país.

Em 2008, os fundos financeiros possuíam ativos no Brasil (em valores reais e absolutos) com volume de R$ 1,1 trilhão. Já agora ao final do primeiro semestre de 2019, eles ultrapassaram R$ 5 trilhões, equivalente e 3/4 do PIB do Brasil, sendo que metade da década foi de recessão, desemprego e redução das atividades econômicas, enquanto não parou de crescer o volume de dinheiro nos fundos financeiros.

Ou seja, em pouco mais de uma década, esse volume de ativos dos fundos financeiros quase quintuplicou. Em termos de valores atualizados (corrigidos), o volume quase triplicou. Um fato muito expressivo como pode ser visto no quadro abaixo:

Quadro 1  (PESSANHA, 2019, p. 107) do livro A `indústria´ dos fundos financeiros. Atualizado com dados de 21/06/2019. 












O fato é mais significativo quando se lembra que metade dessa década foi de crise econômica no Brasil e ainda assim, os excedentes econômicos continuaram se concentrando nas mãos de poucas pessoas, que passaram a se interessar pelos fundos de investimentos, como padrão de acumulação de riquezas e de certa forma, também como de financiamento de uma parte material expressiva da economia.

Estatística da Anbima. Consolidado diário dos Fundos Financeiros em 21 junho de 2019 



























Deve-se chamar a atenção que a grande maioria dos fundos de investimentos têm como suas gestoras os bancos e forte vínculo com o mercado de capitais e com os mecanismos vinculados às rendas derivadas e aos derivativos.

Vale ainda registrar que o setor gosta de ser chamado de "indústria dos fundos", embora seja um instrumento do setor financeiro, que tem apenas uma parte vinculada ao financiamento e ao controle da produção material, onde busca valorização.

Por compreender que tudo isso vinha, até aqui, sendo pouco percebido pela sociedade e mesmo pelos pesquisadores que vêm estudando a financeirização e seus efeitos no capitalismo contemporâneo, é que resolvi aprofundar a investigação desse setor e produzir um relato que busca abrir e ampliar o debate sobre esse processo e seus significados.

E ainda, por entender que não é possível investigar as formas com que o capitalismo, sob a hegemonia das finanças, como ocorre no presente, vem se desenvolvendo sem romper as condições herméticas e poucos conhecidas desse setor.

São poucos os que  controlam e dominam o seu universo. Aliás, a pesquisa identificou, que mesmo boa parte dos operam nele, conhecem apenas a área que atuam e investem, com pouca ou nenhuma noção do todo e das relações de tudo isso com o sistema.

Assim, se viu que era necessário retirar os fundos financeiros (hoje o mais potente instrumento da financeirização) da invisibilidade, para torná-lo mais conhecido, no que diz respeito ao seu porte, a sua forma de atuar, suas estratégias e à sua hipermobilidade, que é o principal atributo, que faz com que o capital se aproxime do seu desejo utópico de operar livremente sem resistências em todo o mundo.

Os seus defensores, organizadores e controladores, alegam que os fundos financeiros, mais que os bancos, beneficiam toda a sociedade e estariam mudando o padrão de financiamento da economia.

Em contraposição, identificamos que essa fase do capitalismo financeiro gera preocupações diante do esgarçamento que promovem no sistema, em virtude do nível de captura das rendas locais/regionais, aprisionando-as e acumulando-as em colossais volumes e nas mãos de cada vez menos.

O mundo tecnologicamente desenvolvido é desigual, não inclusivo e os fundos mostram a alta e crescente concentração de riqueza.

Um processo em curso que amplia enormemente os riscos de rupturas violentas e tem ainda potencial para promover esgarçamento do processo civilizatório e de barbárie que se vinculam à dimensão política e geopolítica das consequências desse movimento transfronteiriço.

Foi com essa motivação que foi escrito o livro "A ´indústria´ dos fundos financeiros: potência, estratégias e mobilidade no capitalismo contemporâneo". O mesmo, cuja capa está à direita do blog, se encontra disponível para vendas na editora Consequência (aqui), na Amazon (aqui); na livraria Noblesse (em Campos dos Goytacazes) e/ou, através do email desse blog. 

A publicação como resultado parcial da pesquisa em andamento é uma contribuição para aprofundamento das discussões e debates sobre a financeirização e seus efeitos na atual fase do capitalismo.

Tentei produzir mais um ensaio do que um texto acadêmico, embora com o rigor científico da pesquisa que o originou, na medida em que a ideia central era de ampliar o conhecimento sobre algo que parece escondido e bem escamoteado.

Avalio que não consegui sair muito da análise mais acadêmica, mesmo que mais descritiva. Enfim, o resultado como contribuição foi este que saiu neste livro. Sendo assim, e considerando que o tema tem ainda muitas questões a serem ainda investigadas, em várias dimensões e escalas é que insisto que serão muito bem-vindas outras análises, críticas e sugestões.

quarta-feira, junho 26, 2019

A abertura (entrega) descarada do setor de gás no Brasil é um novo crime de lesa-pátria

A gente até cansa de ficar repetindo a mesma questão.

Essa história de que se deve entregar todos os investimentos nacionais em gás natural no Brasil, para as empresas estrangeiras para que esse insumo de energia estratégico fique mais barato é conto da carochinha. 

Entregaram o setor elétrico com as concessões elétricas para reduzir as tarifas de energia. E o que temos?

Entregaram o setor de água e esgotos para as concessionárias e o que aconteceu?

Entregaram o setor de telecomunicações e temos hoje uma das mais caras tarifas de telefonia e internet do mundo.

E o pior é que, em alguns casos, como a eletricidade, saneamento, gás, entre outros, você não tem mais de um fornecedor. Assim, se está falando de renda de monopólio que você entrega ao controle de uma grande corporação nacional ou estrangeira. Tira do monopólio estatal e nacional para entregar ao monopólio de grupos privados globais.

É só ver o nome e atuação destas corporações e dos seus grupos controladores para confirmar isso que já venho pesquisando há pelo menos seis anos de forma intensa.

Nem se trata de impedir a participação de empresas privadas no setor. 

Elas poderiam entrar para fazer o que não hoje não existe, ocupando espaços no mercado que eles tanto veneram.

Mas, elas não querem. 

As corporações e os fundos estrangeiros batem o pé e dizem que só entram se tiverem controle de todo o setor, acima até de quem de quem tem esse papel que é o governo com seu poder de regulação,para que a disputa se dê em bases concorrenciais. 

As corporações que controlam o setor de gás natural a nível global querem garantia de tarifas altas, rentabilidades colossais e baixa regulação, apenas das "mãos e bolsos invisíveis do mercado".
No caso do gás natural é uma aberração.

Em vários países do capitalismo central as gestões públicas estão retomando o controle de alguns destes setores que são por sua natureza monopolísticos. Porque não cabe deixar esse monopólio a favor dos lucros privados contra toda a coletividade.

Mas o caso atual do Brasil é único tamanha a velocidade e a forma descontrolada com que entregam tudo. 

Parece haver uma competição surreal entre as instituições do governo e estatais para saber quem é mais entreguista: o Cade (Ministério da Fazenda), Ministério das Minas e Energia (MME), ANP, CNPE, Petrobras, etc.

E o pior para entregar tudo o que temos e que foi construído e implantado por nossas empresas estatais e pelo governo, como são os casos dos gasodutos, unidades de processamento de gás natural, etc. 

Etapas do processo de liquefação do Gás - LNG 
As redes de distribuição até as concessionárias já foram concedidas às empresas privadas, em quase todo o país.

E o pior, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica, -sic, defesa de quem?) está agora e ainda mais proibindo que a Petrobras participe dessa etapa da cadeia desde o poço onde o gás é extraído.

Isso mesmo, no liberalismo deles, a garantia é dada às suas empresas. 

Assim, já entregaram quase 10 mil quilômetros de gasodutos. No caso da malha de 2,5 mil km da região Sudeste, a primeira parte entregue, em apenas 18 meses, a Petrobras pagou em dezoito meses de tarifas, tudo o que ainda vai receber (porque a venda foi à prazo) pelo gasoduto que construiu e ainda opera para os novos donos. E esses valores pagos como tarifas podem ser conferidos no relatório anual de prestação de contas da Petrobras. 

Sim, é difícil de acreditar, mas é real. 

Agora estão decidindo dentro do chamado novo "marco legal do gás" no Brasil - todo escrito e desenhado pelas corporações e fundos financeiros estrangeiros que atuam no Brasil - que as unidades de processamento de gás natural em funcionamento também devem ser entregues a essas empresas. 

Repito: ficando a Petrobras proibida de atuar no setor.

E dizem para você que tudo isso produzirá, daqui a quatro (4) anos - quando você não mais se lembra disso, como não se lembra das promessas de tarifas baixas de luz, água, telefone - uma redução das atuais tarifas .

Aí lá em 2023/2024, eles vão dizer e pagar a mídia para te convencer que isso de fato aconteceu, só que a correção da inflação é que elevou as tarifas.

E vou voltar a lembrar a atual diretoria da Petrobras está concordando que ela tem que ficar fora desse setor de gás natural que é estratégico, como combustível de transição, e que foi encontrado em colossais volumes no Pré-sal, também descoberto pela estatal e cujas áreas também estão sendo entregues para corporações petroleiras estrangeiras.

Em termos de bilhões de dólares, esse crime de lesa-pátria com entrega das joias da coroa, já é pelo menos, umas dez vezes maior do que os desvios feitos por larápios na Petrobras.

Repito o gás natural passou a ser nos últimos anos estratégico como combustível de transição para uma matriz mais limpa e que ganhou enorme mobilidade, depois que o processo de liquefação para transporte em navios gaseiros se tornou - mesmo que ainda cara - mais viável, podendo a sua logística de transporte prescindir dos gasodutos. 
Veja aqui artigo que publicamos no blog há 3 anos (em 11 de julho de 2016) com o tútulo "A ampliação do poder estratégico e geopolítico do Gás Natural (GNL) na matriz energética mundial".
 
Por tudo isso afirmo que é preciso expulsar e punir severamente estes vendilhões da Nação que necessita ser reconstruída para os brasileiros.

segunda-feira, junho 24, 2019

Recordes mundiais de consumo e produção de petróleo em 2018 reforçam o seu peso sobre a geopolítica

No início deste mês a BP publicou a 68ª edição a revisão estatística de 2019 sobre a energia mundial. (Statistical Review of World Energy).[1] No que diz respeito à área de petróleo e gás além dos dados e indicadores mais expressivos fazemos análises e comentários sobre evolução dos mesmos ao longo do tempo, assim como a relação com os interesses das nações e a geopolítica.

É ainda importante ainda dizer que há diferenças de tabulações entre os dados estatísticos da BP e da AIE (Agencia Internacional de Energia) que se referem à métodos de apuração e contabilização, em especial no que diz respeito às estatísticas de volume de gás, computados como m³ ou em barris de óleo equivalente que se soma aos de petróleo.

As análises sobre esses dados e indicadores relativos à produção, consumo e as reservas de petróleo, são fundamentais para uma interpretação sobre a geopolítica do petróleo (energia), como parte dos debates tanto sobre esta potente cadeia global de valor dessa fração do capital, assim como relativos à soberania, à hegemonia das nações e ainda sobre a geopolítica de uma forma ampliada.


Consumo mundial de petróleo
O relatório Statistical Review of World Energy 2019, indicou que em 2018, o mundo estabeleceu um novo recorde de consumo de petróleo de 99,8 milhões de barris por dia. É o nono ano consecutivo em que a demanda global por petróleo aumentou. A demanda por petróleo em 2018 cresceu 1,5%, acima da média de 1,2%. 

Em 2018, mais uma vez se confirmou os EUA como o maior consumidor (disparado) e também o maior produtor do mundo como será visto diante. O consumo médio de petróleo dos EUA em 2018 foi de 20,5 milhões de barris por dia (mibpd). Em 2º lugar está a China com 13,5 mibpd e em 3º lugar a Índia com 5,2 mibpd. Em 4º lugar a Arábia Saudita com 3,7 mibpd, Japão está em 5º lugar com 3,9 mibpd e a Rússia em 6º no ranking com 3,2 mibpd.

O Brasil é o sétimo maior mercado consumidor de petróleo do mundo com 3,1 mibpd, bem próximo da Rússia. Fato que também explica o interesse das petroleiras estrangeiras sobre o Brasil, mostrando que ele vai bem além do acesso às reservas do pré-sal, mas visam também chegar ao refino, às redes de distribuição e ao consumo de derivados e combustíveis.

Abaixo publicamos os dados das doze nações que mais consumiram petróleo no mundo em 2018. Para melhor visualização de como esse consumo foi relativamente pouco alterado ao longo desse período, o quadro também traz uma série histórica dos consumos dos anos de 2015, 2016 e 2017. É oportuno lembrar que esse foi o período em que houve uma grande variação nos preços do barril de petróleo no mercado internacional e mesmo assim diante dessas oscilações, praticamente, não aconteceram alterações no ranking das nações que mais consumiram petróleo na última década.



Os dados mostram ainda que o aumento geral de consumo de petróleo no mundo de 1,5%, se deve basicamente ao crescimento da demanda dos três maiores consumidores (EUA, China e Índia). Aliás, a China e a Índia tiveram uma média de crescimento do consumo de petróleo de pelo menos 5% ao ano na última década.

A região da Ásia-Pacífico tem sido o mercado de petróleo que mais cresceu na última década no mundo: crescimento médio anual de 2,7%, depois a África e o Oriente Médio. No longo prazos a China e a Índia, pela suas densidades populacionais, devem seguir como as maiores demandas de petróleo no mundo. Isso também deverá manter o movimento, já em curso de instalação de mais refinarias na Ásia (China e Índia) e também Oriente Médio.

Infográfico O Globo em 21 jun. 2019.
Matéria: "Irã derruba drone americano no golfo Pérsico".
Vale também registrar o apetite americano por petróleo que é mais de 50% superior ao da China, segundo maior consumidor mundial. Já comentamos aqui algumas vezes sobre o documentário "Pump" (bomba em inglês) do diretor Tickell [2] sobre esse vício americano e como ele foi se constituindo historicamente a partir do acordo dos Rockfellers e Ford na década de 20.

Além disso, esses dados também reforçam a explicação sobre como o capitalismo foi sendo lubrificado pelo petróleo; a hegemonia e o "império" estadunidense foram se ampliando, e desta forma, aumentando a relação com a geopolítica, quando o país hegemônico, visa ter controle sobre os demais, especialmente, sobre aqueles que possuem as maiores reservas.

Não por outro motivo, os EUA possuem hoje 30 mil militares no Oriente Médio. Veja ao lado, no infográfico publicado em O Globo, em 21/06/2019, os dados numéricos e espaciais que buscavam explicar as consequências do conflito dos EUA com o Irã naquela região rica em petróleo e gás [3].

Os EUA querem não apenas se suprir da mercadoria que mais necessita (o petróleo, a mercadoria lícita mais comercializada no mundo), como também ter segurança energética para o futuro, e por isso agem geopoliticamente, para controlar antigas reservas (Oriente Médio) e novas reservas (Pré-sal brasileiro).




Produção mundial de petróleo 
O Statistical Review da BP (WE 2019) também chamou a atenção para o novo recorde mundial de produção de petróleo em 2018, que atingiu o volume de 94,7 milhões de barris de petróleo por dia (bpd), um aumento de 2,22 milhões de barris por dia em relação ao ano anterior.

Nos dados sobre produção de petróleo da BP - WE 2019 estão incluídos petróleo bruto, óleo de xisto, areias betuminosas, condensados ​​(condensado de arrendamento e condensado de gás) e LGNs (líquidos de gás natural - etano, GLP e nafta separados da produção de gás natural). Porém, estão excluídos os combustíveis líquidos de outras fontes, como biomassa e derivados de carvão e também gás natural.

Os EUA ampliaram sua liderança como o maior produtor de petróleo do mundo para um recorde de 15,3 milhões de barris diários de petróleo (bpd). Além disso, os EUA lideraram todos os países no aumento da produção em relação ao ano anterior, com um ganho de 2,18 milhões de bpd (equivalente a 98% do total de adições globais). Fato explicado pela alta produção dos EUA nas reservas de xisto com o "tight oil e o "shale oil". Quase metade da produção de 15,3 mibpd têm origem no shale oil. O que é muito expressivo e reforça no presente a volta dos EUA como grande produtor de petróleo.

Em 2º lugar no ranking de produção ficou a Arábia Saudita com 12,3 mibpd; Em 3º lugar, a Rússia com 11,4 mibpd. Esses três maiores produtores mundiais lideram esse ranking há mais de uma década. Antes esse revezamento se dava basicamente entre a Arábia Saudita e a Rússia, mas desde 2014, a produção de xisto foi se ampliando nos EUA. O Canadá com o petróleo das areias betuminosas da província de Alberta seguiu em 4º lugar. E a China, desde que o petróleo caiu de preço em 2014/2015, tirou o pé do acelerador da sua produção e simultaneamente ampliou a importação, sendo hoje o maior importador mundial, ao passar os EUA que reduziu a importação com o aumento de sua produção interna.

Nesse movimento os EUA têm perspectivas, segundo alguns analistas, de até se tornar autossuficiente em termos líquidos entre produção e consumo (óleo + gás), em torno do ano de 2023 . Sobre o futuro após 2025, há muitas incertezas, considerando a redução das reservas de xisto que são rapidamente se exaurem depois que as jazidas são rompidas pelo fracking. [4] Há quem veja nesse temor, o fato dos EUA ampliarem o seu controle hegemônico sobre os países com grande reservas, numa disputa que envolve os riscos e a disputa com os países dos Brics.

O Brasil vem subindo, paulatinamente no ranking dos maiores produtores mundiais tendo ficado em 2018 na décima posição, ao ultrapassar o México e a Venezuela, se situando bem próximo da produção do Kuwait, um dos fortes produtores do Oriente Médio.

Nesse sentido o Brasil desde a descoberta do pré-sal, a maior fronteira petrolífera descoberta na última década do mundo (com seis dos dez maiores campos de petróleo), o país entrou no radar da geopolítica do petróleo. Tem uma produção crescente (10ª maior), sendo ainda o 7º maior mercado consumidor do mundo e com um enorme mercado de combustíveis e derivados. Lembrando que o Brasil explorou até aqui pouco mais de 1% de toda as reservas estimadas do Pré-sal (Veja nota do blog aqui em 18 jun. 2018). [4-1] Abaixo o quadro dos maiores produtores mundiais de petróleo e gás.


O ciclo de preços do petróleo e sua relação com o movimento de um setor de escala global - O ciclo petro-econômico e a geopolítica que o envolve [5]

Ao relembrar um período mais longo, um pouco antes da crise financeira de 2008, os preços globais do petróleo chegaram próximos a US$ 150 por barril. Depois, durante a crise do subprime (entre 2008 e 2009), os preços caíram para um patamar de US$ 40. Porém, rapidamente depois, entre 2010 e 2013, pela primeira vez na história, os preços do barril de petróleo, oscilaram sempre acima de US$ 100 o barril. Depois a partir de 2014 e 2015, veio a fase de colapso co ciclo petro-econômico, quando ele chegou a cair a US$ 27 o barril.

Ainda assim, desde então, a produção mundial de petróleo aumentou em 11,6 milhões de bpd. No mesmo período, a produção de petróleo dos EUA aumentou em 8,5 milhões de bpd - equivalente a 73,2% do aumento global da produção. Assim, se percebe que sem o boom do petróleo de xisto nos EUA, os preços do petróleo nunca teriam caído para menos de US$ 100, o barril. 

Aqui há contradições que precisam ser melhor compreendidas. A intervenção no ciclo de preços mundial do petróleo no final de 2014 interessava aos EUA e à Arábia Saudita. Aos EUA para segurar o impulso da Rússia e a força de Putin que voltava para novas articulações, em direção ao leste, por conta dos grandes excedentes que estava obtendo com a venda de petróleo a um valor acima de US$ 100, o barril. Além disso, os EUA também quebrava as ações da Venezuela de Chaves, e de quebra, mas não menos importante, tumultuaria o Brasil (lembrem de 2013 e da NSA em 2014) que avançava rapidamente na exploração do pré-sal, onde o golpe institucional parece ter sido parte dessa estratégia.

Da parte da Arábia Saudita, ela interessava criar dificuldades para o seu arqui-rial, o Irã, que na ocasião estava voltando ao mercado de petróleo após a suspensão do anterior embargo dos EUA. Assim, o Irá pretendia retomar os espaços que tinha de comércio com outras nações, que haviam trocado o fornecimento para a Arábia Saudita. Além disso, os sauditas ainda testavam os limites mínimos de custo de produção e ponto de equilíbrio (break-even) do óleo de xisto americano (seu parceiro no geral) e do pré-sal brasileiro, onde se dizia que o custo de um barril chegaria a US$ 75 e hoje se vê a US$ 8, líquido e incluindo os custos do dinheiros e participações governamentais (royalties) oscila em torno de US$ 25.. 

Pois bem, em 2019, decorridos cinco anos desta intervenção geopolítica no ciclo petro-econômico, a Arábia Saudita manteve o seu mercado, mas de outro lado, percebeu que a redução dos custos de contratos, o aumento da produtividade com novas tecnologias entre outras razões levaram tanto o pré-sal brasileiro, quanto o xisto americano a produzir muito mais e a custos bem menores. 

No caso brasileiro um colosso de produtividade nunca antes sequer sonhada. Já no caso dos EUA com a injeção de bilhões de dólares dos fundos private equity americanos junto com o relaxamento das exigências ambientais dos órgão reguladores, a expansão da produção de óleo de xisto e shale gas, também se expandiu a um nível também inimaginável, a pontos dos EUA, pela primeira vez, ter passado a autorizar a exportação de petróleo.
   
Nessa toada a Arábia Saudita vem se mantendo como segundo maior produtor, com 12,3 milhões de barris por dia, deixando de ser um regulador do mercado como antes, mas ainda forte player. A Rússia está em terceiro no ranking com uma produção de 11,4 milhões de barris por dia. O Canadá acrescentou a segunda maior produção do mundo, com um ganho de 410.000 bpd em relação a 2017. Isso foi um pouco à frente do aumento de 395.000 bpd da Arábia Saudita.

Essa nova situação dos EUA com uma produção bem maior, também vem ajudando a produzir uma relação (não esperada) maior entre Arábia Saudita e Rússia, com negócios na área de petróleo, refinarias, petroquímicas e outras infraestruturas. Antes, com o alinhamento da A.S. com os EUA que envolve proteção militar isso nunca ocorreu, com os EUA protegendo os sauditas e fazendo questão de não entender e enxergar a ditadura vigente. Agora com a A.S. disputando com os EUA a supremacia na produção mundial de petróleo e a Rússia tendo entrado em disputas no Oriente Médio que interessam os sauditas, essa equação se tornou mais complexa e menos automática.

Observando os números do lado das nações produtoras de petróleo, há que se observar os declínios da Venezuela (-582 mil de bpd), Irã (-308 mil bpd), México (-156 mil bpd), Angola (-143 mil bpd) e Noruega (-119 mil bpd) foram também compensados por essa maior oferta americana, russa, saudita e até brasileira. 

É também oportuno comentar que as diferenças entre os números do consumo mundial (99,8 milhões de barris por dia) e as estatísticas mundiais de produção (94,7 milhões de barris de petróleo por dia) se devem a alterações nos estoques, consumo de aditivos não-petrolíferos e combustíveis substitutos, assim como aquilo que a BP chama de "disparidades inevitáveis ​​na definição, medição ou conversão de dados de oferta e demanda de petróleo".

Para uma melhor visualização espacial sobre a movimentação e fluxos de petróleo cru pelo mundo, abaixo apresentamos um mapa que mostra as origens e os destinos do óleo entre nações produtoras, exportadoras, beneficiadoras e importadoras em todo o mundo. Os números entre as setas dos fluxos indicam os volumes em toneladas que é como os EUA consideram os volumes de óleo bruto.

Mapa da movimentação de petróleo cru no mundo em 2018: em milhões de toneladas.
Fonte: Statistical Review of World Energy - 2019. p.29/62.
























O aumento da produção mundial de gás natural (GN) e a enorme produção/exportação de gás liquefeito (LNG) nos EUA: o combustível de transição na matriz energética mundial [6]

Este ano, pela primeira vez, o relatório Statistical Review of World Energy da BP fez um relato da contribuição para a produção global de petróleo em função do gás natural liquefeito (GNL). A produção de GNL dos EUA é de longe a mais alta de qualquer país, com 4,3 milhões de bpd (um subproduto do boom do gás de xisto).

Isso é mais do que todo o Oriente Médio e responde por 37,6% da produção global total de GNL. Em parte o GN vai subtraindo a produção global de petróleo. Em termos apenas da produção de gás, a maior do mundo ainda é da Rússia com 11,2 milhões de bpd; seguido de perto pelo EUA com 11,0 milhões de bpd. Em terceiro a Arábia Saudita com 10,5 milhões de bpd. 

O aumento da produção de gás pelos EUA ampliou a disputa com a Rússia para fornecimento a outras partes do mundo como Europa e Ásia. Antes a exportação de gás se dava apenas através dos pipelines (dutos) e dessa forma a Rússia abastecia praticamente toda a Europa e uma parte da Ásia. Com o relativo barateamento das unidades de liquefação (LNG), o transporte do gás natural sob a forma líquida se expandiu, beneficiando atualmente os EUA a partir especialmente das exportações no porto da Louisiana, através dos navios gaseiros. Abaixo um mapa dos fluxos (comércio) de Gás natural (GN) e Gás Natural Liquefeito (LNG) - em bilhões de m³ no mundo em 2018.

Mapa dos fluxos (comércio) de Gás Natural e GNL em 2018: em bilhões de metro cúbicos.
Fonte: Statistical Review of World Energy - 2019. p.41/62.

























O relatório Statistical Review of World Energy da BP informou ainda que as reservas globais de petróleo/gás comprovadas aumentaram apenas 0,1%, para 1,73 trilhão de barris. 

O fato mostra aquilo que já vem sendo comentado. A produção continua avançando em ritmo maior do que as descobertas de novas reservas. E em segundo lugar, está cada vez mais caro prospectar novas reservas, que ainda se encontram majoritariamente nas mãos das petroleiras estatais (NOCs). A petroleiras privadas (IOCs) preferem gastar menos com exploração e investir depois em acesso aos governos e negócios com as petroleiras estatais, e/ou na privatização ou contratos de concessão para a exploração. 

Vale ainda lembrar que ainda existem enormes questionamentos sobre o que efetivamente se tratam as reservas provadas e o que de fato existe de petróleo nos campos. O volume e o potencial efetivamente só são confirmados depois dos TLD (Testes de Longa Duração), que acontecem já com o início da produção, quando as variáveis analisadas com a produção real e não indicadores permitem ter com maior precisão o potencial efetivo de produção e e reservas dos poços e campos de petróleo.


Considerações finais
Por fim, como se vê, esse setor econômico (cadeia produtiva global, ou fração do capital) tem enorme potência em várias escalas e dimensões que envolve para além da econômica, a política, geopolítica, financeira, ambiental, industrial equipamentos e instalações (refinarias, petroquímicas, dutos, portos, navios, apoio offshore, tecnológica-industrial, empregos, social, etc. 

Entender estas dimensões geopolíticas, econômicas, territoriais e de infraestruturais do petróleo, amplia também a capacidade de se avaliar o capitalismo contemporâneo e as hipóteses e limites de desenvolvimento dos Estados-nações. É um setor concentrador de poder e riqueza. O capitalismo tem sido intensamente lubrificado pelo petróleo, como diz o professor alemão Elmar Altvater (2010)[7]. 

É um setor da economia onde os oligopólios e as cadeias globais de produção atuam com enorme força. Elas dificultam e muitas vezes impedem que projetos nacionais integrados se desenvolvam. O desmonte e as privatizações de parte das atividades dessa cadeia - que é desenvolvida autonomamente nas nações - tendem a ser engolidas e controladas globalmente.

Por isso, eu tenho sustentado a interpretação de que essa fração do capital - petróleo - talvez seja, a ideal para investigar os motivos da “redefinição das escalas” e de suas consequências sobre as relações de poder Estado), econômico, político, social e o capitalismo contemporâneo.

Essa fração do capital induz a criação e/ou adensamento de circuitos econômicos extensos - e mais o menos densos - que atuam sobre o território criando dinâmicas que tanto faz circular rendas como apropriá-las para o andar superior onde estão os donos dos dinheiros.

[2] Documentário Pump. 2014. Josh Tickell e Rebecca Harrell Tickell. Informações sobre o filme na Wikipedia. Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Pump_(film)

[3] Matéria em O Globo, 21 de jun. 2019. Irã derruba drone americano no golfo Pérsico. Disponível em: https://oglobo.globo.com/mundo/ira-derruba-drone-americano-no-golfo-persico-trump-chama-de-erro-grande-mas-depois-ameniza-23753187

[4] Postagem do blog em 13 de dezembro de 2018. A disputa por narrativas sobre a hipótese da autossuficiência americana por energia. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2018/12/a-disputa-por-narrativas-sobre-hipotese.html

[4.1] Postagem do blog em 18.jun. 2019. Toda a reserva do Pré-sal equivale a 7 vezes o PIB. Só 1% foi extraído e boa parte está sendo entregue. Disponível em: https://www.robertomoraes.com.br/2019/06/toda-reserva-do-pre-sal-equivale-7.html

[5] Sobre Ciclo Petro-Econômico ver tese do autor defendida em mar. 2017, no PPFH-UERJ: “A relação transescalar e multidimensional “Petróleo-porto” como produtora de novas territorialidades”. Disponível no Banco de Teses da UERJ: http://www.bdtd.uerj.br/tde_busca/processaPesquisa.php?pesqExecutada=1&id=7433&PHPSESSID=5vd3hsifip5hdg3n1icb57l9m6

[6] Mais detalhes sobre o aumento do papel estratégico do uso do LGN no mundo pode ser visto aqui na postagem do blog feita em 11 de jul de 2016, com o título: A ampliação do poder estratégico e geopolítico do Gás Natural (GNL) na matriz energética mundial. No texto que é um artigo há várias referências e outras postagens que falam do aumento do poder estratégico do gás natural na matriz energética mundial e na geopolítica.
Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2016/07/a-ampliacao-do-poder-estrategico-e.html

[7] ALTVATER, Elmar. O fim do capitalismo como o conhecemos. 1. ed. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 2010. 364p.

RAPIER, Robert. The US accounted for 98% of global oil production growth in 2018. Peak Oil. 23 ju. 2019. Disponível em: https://peakoil.com/production/robert-rapier-the-us-accounted-for-98-of-global-oil-production-growth-in-2018


PS.: Atualizado às 02:24 de 26/06/2019: Alertado pelos comentários feitos pelo professor Marcelo Simas e Marco Aurélio -Taquil, o blog corrige a edição original, que repetiu o quadro das nações que são os maiores consumidores, onde deveria estar o quadro das nações que mais produzem petróleo. Agradeço o alerta e as boas referências ao texto-análise. Correção feita.

PS.: Atualização às 03:12: Esclarecendo um pouco mais e ajustando o texto que ficou confuso. Os dados da produção de petróleo não incluem a produção de gás natural. Portanto no quadro da produção não são de barris de óleo equivalentes por dia (boepd) e sim de barris por dia (bpd) apenas de petróleo.
Assim foi incluído no texto acima a observação que "os dados sobre produção de petróleo da BP - WE 2019 estão incluídos petróleo bruto, óleo de xisto, areias betuminosas, condensados ​​(condensado de arrendamento e condensado de gás) e LGNs (líquidos de gás natural - etano, GLP e nafta separados da produção de gás natural). Porém, estão excluídos os combustíveis líquidos de outras fontes, como biomassa e derivados de carvão e também gás natural". No caso da produção do Brasil e outros países essa alteração não é grande, mas nos EUA sim, onde há muito óleo da origem de xisto, também conhecido como "tight oil" ou "shale oil".

PS.: Atualizado às 13:02: Para alguns acréscimos ao texto original.

domingo, junho 23, 2019

"Partido da Lava Jato" atacou a política fingindo fazer Justiça e agora está exposto!

As revelações de hoje do Intercept com o jornal Folha de São Paulo são bombásticas e tornam a situação de Moro/Dallagnol insustentáveis, mesmo que tenham ido procurar socorro nos EUA.

Elas são esclarecedoras sobre as procedimentos e as armações do que deve ser chamado pelo nome correto, o "Partido da Lava Jato".

O "Partido da Lava Jato" atacava a política e alguns políticos em especial para fazer política. Nunca quiserem fazer Justiça.

Isso levou ao resultado eleitoral conhecido.

Um partido sem ser reconhecido como tal falava mal da política e dos partidos, fazendo política, como se partido fosse.

E assim agiu.

E como partido fez surgir (ou ressurgir) - de forma escamoteada e ampliada - o campo de direita, que acabou por conduzir a narrativa que gerou o golpe institucional de 2016 e foi ocupando os espaços eleitorais em 2018 no Brasil.

Esse ambiente político produziu um falso partido, falsas provas e uma falsa narrativa que levou uma falsa solução à Presidência do Brasil.

A confusão é grande, mas não há como deixar no cargo um ministro que controla a Polícia Federal que não pode deixar de investigar o seu chefe.

Por muito menos outros ministros caíram.

O Brasil precisa reencontrar um projeto de Nação.

sexta-feira, junho 21, 2019

"Brazilgate está se transformando na Russiagate 2.0", por Pepe Escobar

Abaixo artigo do jornalista Pepe Escobar sobre o que chama de "Brasilgate". O texto foi publicado ontem no site Consortiun News, especializado em jornalismo investigativo.

Como o texto original estava em inglês utilizei um tradutor automático para passá-lo para o português, de forma mais rápida, mesmo que com alguns problemas.

PEPE ESCOBAR: Brazilgate está se transformando na Russiagate 2.0

20 junho de 2019 - Por Pepe Escobar em Paris - Especial para o Consortiun News

A bomba da Intercept sobre corrupção brasileira está sendo ridicularizada pela mídia e militares do país como uma “conspiração russa”, escreve Pepe Escobar.

Era um vazamento, não um hack. Sim: Brazilgate, lançado por uma série de bombas revolucionárias publicadas pela The Intercept, pode estar se transformando em uma Russiagate tropical.

A Garganta Profunda do Intercept - uma fonte anônima - finalmente revelou em detalhes o que qualquer um com metade do cérebro no Brasil já sabia: que a máquina judicial / de lei da investigação unilateral de lavagem de carro era de fato uma farsa maciça. e a raquete criminosa empenhada em realizar quatro objetivos.

 Criar as condições para o impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2016 e a subseqüente ascensão de seu vice, manipulador de elite, Michel Temer.
 Justifique a prisão do ex-presidente Lula em 2018 - assim como ele estava pronto para vencer a mais recente eleição presidencial em um deslizamento de terra.
 Facilitar a ascensão da extrema-direita brasileira via recurso Steve Bannon (ele o chama de “capitão”) Jair Bolsonaro.
 Instale o ex-juiz Sergio Moro como ministro da Justiça com esteroides capazes de promulgar uma espécie de Patriot Act brasileiro - pesado em espionagem e luz sobre as liberdades civis.

Moro, lado a lado com o promotor Deltan Dallagnol, que liderava as 13 forças-tarefa do Ministério Público, são as estrelas vigilantes da briga de serviços de justiça. Nos últimos quatro anos, a mídia brasileira hiperconcentrada, debatendo-se em um pântano de notícias falsas, glorificou esses dois como heróis nacionais dignos do Capitão Marvel. Hubris finalmente alcançou o pântano.

Os Goodfellas brasileiros
O Intercept prometeu liberar todos os arquivos em sua posse; bate-papos, áudio, vídeos e fotos, um tesouro supostamente maior que o de Snowden. O que foi publicado até agora revela Moro / Dallagnol como um duo estratégico em sincronia, com Moro como capo di tutti i capi , juiz, júri e carrasco em um só - repleto de invenções em série de provas. Isso, por si só, é suficiente para anular todos os casos da lavagem de carros em que ele esteve envolvido - incluindo a acusação de Lula e as sucessivascondenações baseadas em “evidências” que nunca se sustentariam em um tribunal sério.

Em conjunto com uma riqueza de detalhes sangrentos, o princípio Twin Peaks - as corujas não são o que parecem - aplica-se plenamente ao Brazilgate. Porque a gênese do Car Wash envolve nada menos que o governo dos Estados Unidos (USG). E não apenas o Departamento de Justiça (DoJ) - como Lula vem insistindo há anos em todas as suas entrevistas. O op foi Deep State no seu mais baixo.
O WikiLeaks já havia revelado issodesde o início, quando a NSA começou a espionar a gigante de energia Petrobras e até mesmo o telefone inteligente de Dilma. Em paralelo, inúmeras nações e indivíduos aprenderam como a auto-atribuída extraterritorialidade do DoJ permite que ele vá atrás de qualquer pessoa, de qualquer maneira, em qualquer lugar.
Nunca foi sobre anticorrupção. Em vez disso, trata-se da “justiça” americana que interfere em todas as esferas geopolíticas e geoeconômicas. O caso mais gritante e recente é o da Huawei.

No entanto, o “comportamento maligno” de Mafiosi Moro / Dallagnol (invocar o Pentágono) atingiu um novo nível perverso na destruição da economia nacional de uma poderosa nação emergente, um membro do BRICS e líder reconhecido em todo o Sul Global.

A Lava Jato devastou a cadeia de produção de energia no Brasil, que por sua vez gerou a venda - abaixo dos prêmios de mercado - de muitas reservas valiosas de petróleo do pré-sal, a maior descoberta de petróleo do século XXI.

A Lava Jato destruiu os campeões nacionais em engenharia e construção civil e também em aeronáutica (como na Boeing, comprando a Embraer). E a Car Wash comprometeu fatalmente importantes projetos de segurança nacional, como a construção de submarinos nucleares, essencial para a proteção da “ Amazônia Azul ”.

Para o Conselho das Américas - que Bolsonaro visitou em 2017 -, bem como o Conselho de Relações Exteriores - para não mencionar os “investidores estrangeiros” - ter o garoto neoliberal de Chicago, Paulo Guedes, instalado como ministro da Fazenda, era um sonho molhado. Guedes prometeu no disco virtualmente colocar todo o Brasil à venda. Até agora, sua tarefa tem sido um fracasso absoluto.

Como abanar o cachorro
Mafiosi Moro / Dallagnol eram "apenas um peão em seu jogo", para citar Bob Dylan - um jogo que ambos ignoravam.

Lula ressaltou repetidamente que a questão-chave - para o Brasil e o Sul Global - é a soberania. Sob Bolsonaro, o Brasil foi reduzido ao status de uma neocolônia de banana - com muitas bananas. Leonardo Attuch, editor do portal líder Brasil247 , diz que “o plano era destruir Lula, mas o que foi destruído foi a nação”.

Tal como está, os BRICS - uma palavra muito suja no Beltway - perderam o seu “B”. Por mais que possam valorizar o Brasil em Pequim e Moscou, o que está entregando o momento é a parceria estratégica "RC", embora Putin e Xi também estejam fazendo o melhor para reviver "RIC", tentando mostrar à Índia Modi que a integração eurasiana é o caminho a percorrer, não desempenhando um papel de apoio na difusa estratégia indo-pacífica de Washington.

E isso nos leva ao cerne da questão do Brazilgate: como o Brasil é o cobiçado prêmio na mestra narrativa estratégica que condiciona tudo que acontece no tabuleiro de xadrez geopolítico em um futuro previsível - o confronto sem barreiras entre os EUA e a Rússia-China.
.
Já na era Obama, o Deep State dos EUA identificou que, para incapacitar os BRICS de dentro, o nó estratégico “fraco” era o Brasil. E sim; mais uma vez é o óleo, estúpido.

As reservas de petróleo do pré-sal podem valer até US $ 30 trilhões. O ponto não é apenas que o USG quer um pedaço da ação; o ponto é como controlar a maior parte do petróleo do Brasil está ligado à interferência com poderosos interesses do agronegócio. Para o Deep State, o controle do fluxo de petróleo do Brasil para o agronegócio é igual a contenção / alavancagem contra a China.

Os EUA, o Brasil e a Argentina, juntos, produzem 82% da soja mundial - e contam. A China implora a soja. Estes não virão da Rússia ou do Irã - que por outro lado pode fornecer à China petróleo e gás natural suficientes (ver, por exemplo, o poder da Sibéria I e II). O Irã, afinal, é um dos pilares da integração eurasiana. A Rússia pode eventualmente se tornar uma potência de exportação de soja, mas isso pode levar até dez anos.

Os militares brasileiros sabem que as relações próximas com a China - seu principal parceiro comercial, à frente dos EUA - são essenciais, o que quer que Steve Bannon possa reclamar. Mas a Rússia é uma história completamente diferente. O vice-presidente Hamilton Mourao, em sua recente visita a Pequim, onde se encontrou com Xi Jinping, parecia estar lendo um comunicado do Pentágono, dizendo à imprensa brasileira que a Rússia é um “ator maligno” que está implantando uma “guerra híbrida ao redor do mundo. "

Assim, o Estado dos EUA pode estar cumprindo pelo menos parte do objetivo final: usar o Brasil em suaestratégia Divide et Impera de dividir a parceria estratégica Rússia-China.

Fica muito mais picante. Lavagem de carro recondicionada como lavagem de vazamento também poderia ser decodificada como um jogo de sombras massivo; um cão abanar, com o rabo composto de dois ativos americanos.

Moro era um ativo certificado pelo FBI, CIA, DoJ e Deep State. Seu uber-chefe seria, em última análise, Robert Mueller (assim, Russiagate). No entanto, para Team Trump, ele seria facilmente dispensável - mesmo que ele seja o Capitão Justice trabalhando sob o ativo real, o menino Bannon Bolsonaro. Se ele cair, Moro terá a garantia do indispensável paraquedas de ouro - completo com residência nos EUA e palestras em universidades americanas.

Greenwald, do Intercept , é agora celebrado por todas as vertentes da esquerda como uma espécie de americano / brasileiro Simon Bolivar com esteróides - com e em maio casos sem qualquer ironia. Ainda há um problema enorme. O Intercept é de propriedade do praticante hardcore de guerra da informação, Pierre Omidyar .

De quem é a guerra híbrida?
A questão crucial à frente é o que as forças armadas brasileiras estão realmente fazendo neste pântano épico - e quão profundas elas estão subordinadas à Divide et Impera de Washington.

Ele gira em torno do todo-poderoso Gabinete de Segurança Institucional, conhecido no Brasil pela sigla GSI. Stalwarts GSI são todos os consensos de Washington. Depois dos anos "comunistas" de Lula/Dilma, esses caras estão agora consolidando um Estado profundo brasileiro supervisionando o controle político de espectro total, assim como nos EUA.

A GSI já controla todo o aparato de inteligência, bem como a Política Externa e Defesa, através de um decreto sub-repticiamente lançado no começo de junho, apenas alguns dias antes da bomba do Intercept. Até o capitão Marvel Moro está sujeito ao GSI; eles devem aprovar, por exemplo, tudo o que Moro discute com o DoJ e o Estado Profundo dos EUA.

Como discuti com alguns dos meus principais interlocutores brasileiros informados, o antropólogo do crack, Piero Leirner, que sabe em detalhes como os militares pensam, e o advogado internacional suíço e conselheiro da ONU Romulus Maya, a Deep Stateseems dos EUA está se posicionando como a mecanismo de desova para a ascensão direta das forças armadas brasileiras ao poder, assim como seus garantes. Da mesma forma, se você não segue nosso roteiro ao pé da letra - relações comerciais básicas apenas com a China; e isolamento da Rússia - podemos balançar o pêndulo a qualquer momento.

Afinal, o único papel prático que o USG teria para as forças armadas brasileiras - na verdade, para todas as forças armadas da América Latina - é como tropas de choque de “guerra às drogas”.

Não há arma fumegante - ainda.Mas o cenário de Leak Wash como parte de um psyops extremamente sofisticado, de domínio de espectro completo, um estágio avançado da Hybrid War, deve ser seriamente considerado.

Por exemplo, a extrema-direita, bem como poderosos setores militares e a Globo império de mídia de repente começou a girar que Tele INTERCEPT bombshell é uma “conspiração russa”.

Quando alguém acompanha o principal site militar do think tank - com muitas coisas praticamente copiadas e coladas diretamente da Escola de Guerra Naval dos EUA - é fácil se surpreender com a crença fervorosa em uma Guerra Híbrida Rússia-China contra o Brasil, onde a cabeça de ponte é provido por “elementos anti-nacionais” como a esquerda como um todo, bolivarianos venezuelanos, FARC, Hezbollah, LGBT, povos indígenas, o nome dele.

Depois de Leak Wash, uma blitzkrieg de notícias falsa combinada culpou o aplicativo Telegram ("eles são os russos do mal!") Por hackear os telefones de Moro e Dallagnol. O Telegram oficialmente desmascarou isso em pouco tempo.

Surgiu então que a ex-presidente Dilma Rousseff e a atual presidente do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, fizeram uma visita “secreta” a Moscou apenas cinco dias antes da bomba Leak Wash.Confirmei a visita à Duma, bem como o fato de que, para o Kremlin, o Brasil, pelo menos por enquanto, não é uma prioridade. Integração eurasiana é. Isso, por si só, desmascara o que a extrema-direita do Brasil faria como Dilma pedindo a ajuda de Putin, que então libertou seus malvados hackers.

Leak Wash - a segunda temporada da Lava Jato - pode estar seguindo o padrão Netflix e HBO. Lembre-se que a terceira temporada do True Detective foi um sucesso absoluto. Precisamos de rastreadores dignos de Mahershala Ali para detectar fragmentos de evidências sugerindo que as forças armadas brasileiras - com o total apoio do Deep State dos EUA - poderiam estar instrumentalizando uma mistura de Leak Wash e Guerra Híbrida "Russos" para criminalizar a esquerda para sempre e orquestrar um golpe silencioso para se livrar do clã Bolsonaro e seu QI coletivo de sub-zoologia. Eles querem controle total - sem intermediários clownish. Eles estarão mordendo mais bananas do que podem mastigar?

Pepe Escobar, um veterano jornalista brasileiro, é o correspondente geral do Asia Times, de Hong Kong.

Abaixo o link da publicação original:

quinta-feira, junho 20, 2019

"Privatização do pré-sal, a ditadura do mercado está instalada no país": Podcast para Sindipetro-NF

Ontem, quarta-feira (19 jun. 2019), o Sindipetro-NF colocou no ar (aqui), um podcast com uma entrevista que concedi à Juliana Maciel Rádio NF, sobre o tema da privatização do pré-sal, o desmonte e a desintegração das atividades da Petrobras com o fatiamento da estatal e repasse ao setor privado. Várias questões foram abordadas numa fala de cerca de 50 minutos.

Assim, a Rádio NF apresentou o podcast:
"As descobertas no pré-sal estão entre as mais importantes em todo o mundo na última década e trouxeram riqueza, tecnologia e novas oportunidades de emprego no Brasil. Por não conseguir melhorar as expectativas quanto ao dinamismo da economia, o governo Bolsonaro mantém essa fake news, de 'Petrobras quebrada', só para sabotar a maior estatal brasileira."

O áudio (podcast) com a entrevista pode ser ouvida aqui no site da Rádio NF, ou acessada no link abaixo:



PS.: Atualizado às 17:17. Para acrescentar o nome da jornalista Juliana Maciel.

quarta-feira, junho 19, 2019

No Brasil a democracia viaja sem mala e não diz quando volta!

Na segunda-feira (17 jun.), o desgoverno Bolsonaro vetou a volta da bagagem de 23 kg gratuita nas viagens de avião. Mostra assim mais uma vez para quem ele e Guedes governam.

No dia 12 de abril eu postei no meu perfil no Facebook, uma informação da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) com suas estatísticas. Elas registravam que o faturamento das empresas aéreas com as bagagens aumentou 120,9%, entre janeiro e setembro de 2018, enquanto a tarifa média para os voos domésticos subiu 1%. Assim, apenas nos 9 primeiros meses dessa medida entre janeiro e setembro de 2018, as empresas aéreas do Brasil faturaram R$ 511,7 milhões com despacho de bagagens.

Nessa ocasião ainda havia quem acreditasse nas empresas aéreas. Elas diziam que iam trocar ganhos dos bilhetes das passagens que seriam – seriam - mais baratas, pelas taxas para quem tinha bagagens superiores a 10 kg. Nada. O resultado está sendo e agora reconfirmado e autorizado: passagens mais caras e maiores lucros com taxas extras das passagens.

Agora o desgoverno Bolsonaro mostra que não quer regular nada e sim entregar as vantagens para o mercado e o poder econômico. Diga-se de passagem, mercado de um setor com pouquíssima concorrência, assim como acontece na áreas de telefonia e energia.

Aliás, no setor de telecomunicações, recentemente o governo através da Anatel perdoou, em algumas dezenas de bilhões, referentes às multas das operadoras de telefonia, por descumprimentos de regras básicas. Por conta disso, as concessionárias de energia estão deitando e rolando em cobranças abusivas, sem medo das multas da Aneel.

Esse é um país, onde o capitalismo vive completamente sem regulação. Com um mercado que não vive sem as tetas do Estado que serve aos donos dos dinheiros como garantia para suas concessões, isenções tributárias, perdões (waive) para fazerem o que bem entende. Estado nas mãos do mercado, regulado como os bancos e as corporações gostam: pelas mãos e os bolsos "invisíveis" do mercado.

Tem-se aí uma maximização dos lucros sobre a população desprotegida. Essas corporações globais cada vez capturam (vampirizam) mais renda de quem trabalha. Junto com os fundos (e setor financeiro) essas sociedades multinacionais vão se perpetuando como donas do mundo. Tem-se aí a ditadura do mercado e o fim da democracia.

Enquanto isso, a população e os trabalhadores pagam a conta na previdência e pela péssima qualidade dos serviços. O mercado monopolizou o poder ideológico e político e segue controlando os governos, a partir do financiamento das eleições, mas a culpa sempre é da política.

E paradoxalmente, as pessoas, ao perceberem os governos – eleitos pelos donos dos dinheiros – confiam ainda menos na política e nos políticos, numa interpretação equivocada desse processo que reforça ainda mais a ditadura do mercado expressa nas figuras ultraliberais de Trump, Bolsonaro entre outros.

terça-feira, junho 18, 2019

Toda a reserva do Pré-sal equivale a 7 vezes o PIB. Só 1% foi extraído e boa parte está sendo entregue

Há muitas pessoas que ainda não têm uma dimensão do tamanho da reserva de petróleo e gás do Brasil. 

Todo o Pré-sal equivale a cerca de 7 vezes o atual PIB do Brasil.

Isso mesmo! 

Para ser mais exato 6,9 vezes toda a riqueza material atual do país. 

O que foi explorado até agora equivale a pouco mais de 1% do total de petróleo e gás natural, mesmo considerando que o pré-sal, hoje já produz cerca de 2 milhões de barris por dia (boe), ou 60% do total da produção no país.

Infelizmente, grande parte disso está sendo entregue a preço vil para as petroleiras privadas estrangeiras (IOCs), depois de ter sido descoberto pela Petrobras. 

Assim, a renda petroleira extraída dessa riqueza passa para o controle externo. 

Como os novos donos desse petróleo e gás extraídos, as petroleiras estrangeiras decidem o que fazer de sua produção e certamente levarão a maior parte para ser beneficiada fora do país, onde suas receitas se multiplicarão, na medida em que o produto processado ganha mais valor.

Da mesma forma, serão eles que decidirão onde e com quem comprar (ou fretar) plataformas, equipamentos, serviços e tecnologia que deixarão de empregar até 8 milhões de pessoas no Brasil (em funções de altas qualificações) na próxima década.

Assim, o golpe institucional de 2016, inverteu a lógica e começou a entregar, a preço de xepa, a joia da coroa, descoberta pelos geólogos do Brasil.

segunda-feira, junho 17, 2019

EUA x China

Martin Wolf, editor e analista econômico do conhecido jornal inglês de negócios e política, Financial Times, com prestígio global, publicou artigo que foi reproduzido (e traduzido) pelo Valor, em 5 jun. 2019, P. A13 com o título: “O conflito secular entre EUA e China: ataque à China é a guerra errada, lutada de forma errada no terreno errado”.

WOLF, afirma que a China pode ser o inimigo ideológico, militar e econômico que tantos precisam nos Estados Unidos. Diz ainda que essa “rivalidade generalizada com a China vem se tornando o princípio organizador das políticas econômica, externa e de segurança dos EUA”, no governo Trump. Lembra ainda as declarações da diretora de planejamento de políticas do Departamento de Estado dos EUA, Kiron Skinner, quando esta afirmou que [esta seria] “a primeira vez que vamos ter uma grande potência concorrente que não é caucasiana”, (esquecendo, segundo Wolf, o Japão), porém colocando na ordem do dia a hipótese de “uma guerra racial e civilizacional, como um conflito insolúvel”.

WOLF afirma taxativamente que “acusar a China de trapacear é hipocrisia quando quase todas as políticas comerciais adotadas pelo governo Trump violam as regras da OMC”. Diz ainda que não é aceitável “insistir que os chineses aceitem o papel dos EUA como juiz, júri e verdugo”.

O jornalista britânico fala também dos riscos que os EUA têm ao fomentar na população chinesa uma profunda hostilidade. Para Wolf, “a acusação de roubo de propriedade intelectual reflete em grande parte, as inevitáveis tentativas de um economia ascendente em dominar as tecnologias da atualidade. Acima de tudo, uma tentativa de preservar um domínio de 4% da humanidade sobre o resto é algo ilegítimo”.

E por fim, ao pinçar partes do seu texto, Wolf diz que “o que acontece agora é que o governo americano está simultaneamente lançando um conflito entre duas potências, atacando aliados dele e destruindo as instituições de ordem mundial do pós-guerra”.

A realidade desta disputa é cada vez mais percebida e sentida em boa parte do mundo. Segundo, Pepe Escobar, jornalista brasileiro especializado em geopolítica (guerra híbrida) e Eurásia, na atualidade, tudo de mais significativo que ocorre no mundo está de uma forma ou outra vinculada à disputa EUA x China-Rússia. Inclusive a luta de todos contra todos no Brasil.