quinta-feira, dezembro 13, 2018

A disputa por narrativas sobre a hipótese da autossuficiência americana por energia

Em novembro, os EUA seguiram com a maior produção mundial de petróleo bruto, quando atingiu a marca de 11,7 milhões de barris por dia.

Um volume que é 600 mil barris de petróleo a mais que o produzido pela Arábia Saudita que chegou a 11,1 milhões de barris por dia no mês passado e tem a segunda maior produção do mundo.

Na média anual, os EUA deverá fechar o ano com 10,88 milhões de barris por dia.

Um volume alto mas que é pouco maior que a metade da demanda diária de petróleo dos EUA.

Segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), os EUA consome atualmente um volume em torno de de 20 milhões diários de barris de petróleo, que estima que essa demanda americana chegue em 2019, a um total de 20,5 milhões de bpd.
Como já dissemos, essa sede - ou apetite - da "economia americana lubrificada pelo petróleo", explica em boa parte a disputa geopolítica e de hegemonia que segue nos EUA, independente dos governos eleitos serem mais de centro ou de direita como o atual.

Para quem se interessa pelo assunto eu sugiro que assista (se ainda não viram) o documentário "Pump" (bomba de gasolina) de Dosh e Rebecca Tickell que descreve o processo histórico das origens (desde século XX) da dependência americana pelo petróleo. (Veja o link nas referências abaixo)

Apesar dessa realidade tem sido divulgado nos últimos dias, matérias na mídia corporativa, que embola esses dados e tenta fazer crer - em épocas de fake news - que os EUA teriam se tornado nesse final de ano "exportadores líquidos de petróleo".

Há aí nesse intervalo algumas confusões (e dúvidas) nos dados estatísticos americanos (dados não confiáveis não são exclusivos do Brasil), porque se diz que nessa conta não estaria contabilizada a produção de gás natural, que deveria ser levada o volume em m³ na equivalência por boe (barril equivalente em óleo).

Se diz também que deveria ser contabilizada a produção de etanol de milho, mais os ganhos de processamento nas refinarias americanas. Somados gás + etanol + ganhos de processo eles totalizariam mais 6,9 milhões de boepd (barris de óleo equivalentes por dia).

Na conta total somando esse valor aos 11,7 milhões de bpd de produção de petróleo cru, eles chegariam a 18,6 milhões de bpd, o que reduziria o déficit americano de 8 milhões de bpd para 2 milhões de bpd.

Ainda nessa narrativa, se diz que esse déficit já seria superado com outra conta (também não contabilizada) sobre exportações de produtos petrolíferos acabados.

Ao cabo, se teria o que pode ser chamado de uma efetiva "contabilidade criativa". Com ela constrói a narrativa de que na virada para este último mês do ano, segundo a Bloomberg, os EUA teria deixado, pela primeira vez em 75 anos, de ser importadora passando a ser exportadora líquida de energia.

Qual o quê. Até pela forma como os EUA se comporta no mundo real da geopolítica, fica claro, que os EUA continuam importando milhões de barris de petróleo por dia, para alimentar suas refinarias.
 
Há aí um disputa por narrativas e hegemonias em termos de petrodiplomacia que parece ter também relação com o estremecimento com a antiga aliada incondicional, a Arábia Saudita.

Mesmo que a produção de xisto americano, através do fracking, siga se ampliando na Carolina, Louisiana e Texas, a sua demanda é ainda muito maior que a sua produção.

O resto são narrativas e disputas geopolíticas por hegemonia. Além de tudo, elas não levam em conta o fato que se os EUA está produzindo todo esse petróleo, é porque já está no seu limiar ou "pico", o que redundaria num escasseamento mais rápido de suas reservas e produção. 

Isso mostraria também a desvantagem dos EUA em relação a outras nações que possuem reservas e produção em fase bem anteriores ao seu pico de produção. Como é o caso que citamos aqui em postagem ao citar o livro "Oil, Power, e War: A Dark History" (Petróleo, poder e guerra: uma história sombria) de autoria de Matthieu Auzanneau que diz que os países que ainda não atingiram o pico de produção são o Brasil, Canadá, Iraque, Cazaquistão, Malásia, Emirados Árabes Unidos e a Venezuela. 

Assim, se revê que os atuais líderes de produção mundial de petróleo, os EUA e Arábia Saudita estarão em declínio, após o pico num mundo que ainda consumirá muito petróleo nas próximas três décadas. 

Longe de um desejo, a energia fóssil continuará muito forte e dominante pelo menos por mais três décadas, até a metade deste século. Segundo estimativas de todas as maiores petroleiras do mundo, o pico da demanda por petróleo deverá acontecer só após 2050. 

Além disso, há ainda que considerar que após esse período, o petróleo e o gás ainda movimentará muitos setores e terá presença destacada e crescente também na petroquímica, para além do transportes e geração de energia elétrica e calor. Não é por outro motivo que os EUA disputam o controle da extração/produção dessas fontes de energia em qualquer lugar do planeta. 


Referências:
1 - RAPIER, Robert. Oilprice.com em 13 dez. 2018. No, The U.S. Is Not A Net Exporter Of Crude Oil. Disponível em: https://peakoil.com/consumption/last-week-the-us-ended-its-reliance-on-foreign-oil

2 - Peak Oil News em 13 dez. 2018. Last Week, The US Ended Its Reliance On Foreign Oil. Disponível em: https://peakoil.com/consumption/last-week-the-us-ended-its-reliance-on-foreign-oil

3 - Potagem do blog em 11 dez. 2018. O pico do petróleo que tem lubrificado o capitalismo. Disponível em: https://www.robertomoraes.com.br/2018/12/o-pico-do-petroleo-que-tem-lubrificado.html

4 - Documentário Pump: Link no Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=c0T9Jz3Uiyc

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