quarta-feira, julho 31, 2019

Brasil e Petrobras entregam suas riquezas na fase de baixa do ciclo petro-econômico

Para quem ainda avalia que a fase de expansão de exploração do setor petróleo e gás tenha a ver com o esquartejamento e venda (entrega) - em fatias - da Petrobras no Brasil, observe a newsletter de julho, divulgada hoje, pela importante consultoria do setor de óleo & gás, a norueguesa Rystad Energy.

A Rystad mostra no gráfico abaixo os indicativos da retomada dos projetos de exploração offshore de petróleo no mundo, mostrando que em 2019, os patamares já estão acima daqueles de 2010 e próximo dos patamares do pico na fase boom do setor entre 2011 e 2013, mesmo que gora em 2019, os preços do barril esteja na faixa dos US$ 60, o barril.

Fonte: Rystad Energy, newsletter, julho 2019.
Ou seja, o Brasil e os golpistas entregaram a joia da coroa a preço vil, num período de baixa, na fase de colapso de preços do ciclo petro-econômico.

De agora em diante, se avança para nova fase de expansão do setor em todo o mundo, só que o Brasil desintegrou toda a sua cadeia produtiva desse setor estratégico, entregando vários ativos que vão dos campos de petróleo (pré-sal), malhas de dezenas de milhares de quilômetros de oleodutos e gasodutos, todo o setor de gás natural (o combustível estratégico da transição energética), as refinarias, complexos petroquímicos e a imensa rede de distribuição dos derivados para consumo (BR Distribuidora) para os oligopólios e fundos financeiros estrangeiros.

Não há discurso do mercado que esconda essa realidade. Durante os próximos 30/40 anos, mesmo com toda a expansão dos renováveis, o petróleo ainda seguirá estratégico. Em 2030, o Brasil será o 4º maior produtor mundial de petróleo (segundo dados da ANP), mas estará mais dependente que antes do controle externo das corporações globais. Estas hoje, já impõem ao Brasil, exportações de óleo cru de cerca de 1,5 milhões de barris por dia e importação de mais de 1 milhão de barris de derivados e combustíveis (em especial diesel) do exterior e de forma mais expressiva das refinarias dos EUA. 

Não há como naturalizar e nem aceitar tudo isso.

terça-feira, julho 30, 2019

Setor químico nacional segue sendo desmontado aumentando a dependência das importações

Segue o desmonte do setor produtivo nacional. Além do setor de petróleo outros setores industriais estão sendo esquartejados e desmontados ampliando a dependência da economia nacional.

A indústria química no Brasil chegou a ganhar algum destaque, mesmo que em boa parte sob o controle de oligopólios de fortes corporações globais, mas a condução política do país há três anos vem desestruturando esse setor que produz insumos para outras indústrias.

Há dois anos (2017) eu trouxe para este espaço a informação da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) que a produção nacional de químicos de uso industrial tinha caído 2,3%, enquanto as importações tinham crescido 30,5% e batido um recorde de 28 anos.

Agora, ao final do 1º semestre de 2019, a mesma Abiquim informa que as importações brasileiras de produtos químicos alcançaram US$ 20,4 bilhões, enquanto as exportações no semestre somaram apenas US$ 6,3 bilhões.

Assim, no 1º semestre de 2019, mesmo com a economia nacional ainda claudicante, as importações cresceram 6,1%, enquanto as exportações tiveram queda de 3,6% em relação a 2018. No ano de 2018 este déficit entre exportações e importações já tinham alcançado US$ 29,6 bilhões e neste ano a estimativa é que se aproxime dos US$ 40 bilhões.

É bom que se diga que não está nesta conta as importações de combustíveis e diesel que o Brasil passou a fazer do exterior, em especial dos EUA desde 2016, quando passou a exportar enormes volumes de petróleo bruto (em 2019 o volume diário está próximo de 1,5 milhões de barris por dia), mesmo que a capacidade ociosa de nossas refinarias estejam na faixa dos 30%.

Sobre a nossa dependência dos químicos é bom que se diga que esse enorme déficit atual é ainda anterior ao acordo comercial entre Mercocul e União Europeia que deve reduzir ainda mais a produção nacional com aumento da importação de produtos químicos, incluindo os petroquímicos, que estarão isentos - de forma paulatina - de tributação quando vindo da Comunidade Europeia.

Vivemos assim, um enorme processo de desnacionalização e desindustrialização com ampliação das importações numa área de alto valor agregado e que é insumo para uma enorme gama de outros produtos.

O resultado disso é menos empregos, menor arrecadação tributária e menores valores agregados circulando na economia nacional. Assim, o Brasil ficará ainda mais dependente dos setores extrativos e primário. Um processo que se amplia de forma absurda há três anos.

Tem-se aí uma reprimarização violenta que é ainda mais danosa com as privatizações, em que os mercados nacionais passam a ser atendidos por corporações transnacionais que trabalham com a lógica da produção e distribuição globalizada conforme os interesses de seus controladores.

Um mercado do tamanho do Brasil sendo entregue assim de bandeja é quase um sonho para essas corporações. Há quem ainda não consiga compreender os resultados desse tipo de política sobre o nosso dia-a-dia e sobre o projeto abandonado de Nação. 

domingo, julho 28, 2019

Metrópoles do capitalismo central partem para regular aluguéis residenciais

Enquanto no Brasil o livre mercado dos oligopólios e da especulação se apresentam com discurso e como solução única, Berlim, Londres, Paris, Barcelona e Amsterdã, metrópoles (possivelmente "comunistas") do capitalismo central estão tomando decisões para controlar e regular os aluguéis residenciais.

Em abril milhares de alemães manifestaram em Berlim
e outas dos cidades contra a alta dos alugueis. Fonte: DW.
Estas cidades globais e seus estados nacionais consideram que o crédito da máquina das dívidas, os investimentos transfronteiriços dos fundos globais e o crescimento populacional (e migração) aumentaram a demanda por residências nessas cidades, numa espiral que "tem expulsado a classe média para a periferia", segundo uma boa matéria do jornalista Assis Moreira, correspondente do Valor, em Genebra, na Suíça. [1]

As alternativas que já estão em vigor passa por determinação de congelamento do aluguel por cinco anos, por fixação de preços superiores por bairro, data de construção do imóvel, tamanho e a condição se mobiliado.

As autoridades de Berlim dizem claramente que não querem se transformar numa Londres, onde o preço do aluguel por m² é quase igual de Paris, onde custa EU $26 por m².

Em Berlim, o preço subiu 39% em dez anos e os salários estão praticamente estáveis, segundo as autoridades, mesmo que o aluguem esteja em cerca de EU $ 9/m², um terço de Londres e Paris.
Moreira diz ainda que na "Suíça, país liberal, a alta do aluguel é fortemente regulada e precisa de justificativas".

Interessante que o centro do capitalismo mundial no Ocidente esteja regulando até o valor do aluguel como proteção às pessoas, enquanto na periferia do capitalismo, a ideia em curso é entregar tudo e de graça para o mercado.

O setor imobiliário é um dos que mais movimentam investimentos em todo o mundo. Além de oferecer garantia da propriedade, eles passaram a ter uma liquidez ampliada, na medida em que os fundos imobiliários (FIIs) passaram a se donos de muitos imóveis que eram de pessoas físicas. O fato também eliminou cobrança de impostos sobre aluguéis em muitos países.

O autor da reportagem cita que os imóveis residenciais acumulam é um dos setores que acumulam ativos na economia global, onde se estima um volume entre US$ 100 trilhões e US$ 120 trilhões. Só os investimentos para novas construções alavancam financiamentos de cerca de US$ 30 trilhões. [2]

Além do aumento dos preços dos alugueis residenciais, a nível global, também subiu o valor médio dos imóveis em cerca de 15% desde 2012, embora haja diferenças conformes as economia de diferentes países, onde há países com variações positivas, certa estabilidade em outros e redução de preços em outros grupos de países.

Porém, em meio a este conjunto de informações relevantes sobre essa importante fração capital (setor imobiliário), é interessante constatar que já há quem compreenda - no capitalismo contemporâneo - e esteja agindo para limitar e regular as ações livres do mercado, que aqui no Brasil atual, se passou a julgar que seria a solução para todos os nosso males. Qual o quê.


Referências:
[1] Matéria do Valor em 23 jul. 2019. P. A9. MOREIRA, Assis. Europa amplia controle sobre aluguel residencial: governos locais e nacionais buscam conter alta dos preços. Disponível em: https://www.valor.com.br/internacional/6360647/europa-amplia-controle-sobre-aluguel-residencial

[2] Matéria do Valor em 23 jul. 2019. P. A9. MOREIRA, Assis. Preços de imóveis está crescendo menos no mundo. Disponível em: https://www.valor.com.br/internacional/6360649/preco-de-imoveis-esta-crescendo-menos-no-mundo

quinta-feira, julho 25, 2019

Lançamento do livro "A `indústria´ dos fundos financeiros" na Livraria Travessa de Botafogo

Em tempos em que os fundos financeiros avançam sobre o controle de empresas em setores estratégicos no Brasil (petróleo, energia, infraestrutura e outros), esse tema merece ser ainda mais conhecido e aprofundado. 

O livro "A ´indústria´ dos fundos financeiros: potência, estratégias e mobilidade no capitalismo contemporâneo" é uma contribuição para este debate, sobre como os fundos de investimentos no Brasil e no mundo ampliaram (em especial depois da crise de 2008) a sua atuação e o seu controle sobre a produção material, enlaçado ao crescente rentismo neste mundo das finanças que nos cerca que é ainda muito pouco percebido. 

Aguardo aqueles que puderem comparecer!

O livro já está à venda pelo blog / email do autor, aqui no site da editora, aqui na própria livraria Travessa, aqui na Amazon e nas livrarias Noblesse e Leitura, em Campos dos Goytacazes, onde em breve teremos também um lançamento que será acompanhado de debates sobre a financeirização.




Macaé recebeu na última década R$ 21,4 bilhões de royalties do petróleo

Na última década a Prefeitura de Macaé somou um orçamento de R$ 21,4 bilhões, conforme quadro que mostra a evolução das receitas entre 2011 e 2020, sendo que esta é a previsão que consta da Lei de Diretrizes Orçamentárias do Municípios para 2020.










Não sou adepto dessas comparações em termos de análises, porque os municípios possuem suas especificidades, mas observar os dados em termos gerais também ajuda a situar melhor o que se quer observar de vários ângulos e dimensões.

Desde 2015, o orçamento em números absolutos de Macaé é maior que o de Campos. Em termos per capita é mais do dobro.Para 2020, o orçamento previsto para Macaé é de R$ 2,4 bilhões e o de Campos foi estimado em R$ 2 bilhões.

Mesmo no período do auge das receitas dos royalties do petróleo (entre 2022 e 2013), a Prefeitura de Campos recebeu para esse mesmo tempo (uma década) orçamento tão volumoso.

Em Macaé, entre os anos 2014 e 2017, a receita de ISS ultrapassou a receita dos royalties. Em 2015, a receita da cota-parte do ICMS do município também ultrapassou a receita dos royalties. 

Mas desde 2018 (e também na previsão orçamentária de 2019) em Macaé a receita dos royalties voltou a ser a maior receita do município. 

Esses dados levam a várias reflexões. Cito quatro para abrir a discussão:
1) É muito dinheiro e muito orçamento, mas as reclamações sobre a qualidade dos serviços continuam muito grandes, em especial saúde, saneamento, transporte e desenvolvimento social para um município com enormes desigualdades. O fato parece demonstrar que o problema não parece ser maior do lado das receitas.

2) O município que tem uma uma forte base de empresas daquilo que eu chamo de "economia do petróleo", volta a ser tão dependente quanto os demais municípios petrorrentistas que vivem em especial da "economia e renda dos royalties". A diversificação continua a ser retórica discursiva sem efeitos práticos.

3) De outro lado, Macaé é cada vez mais um município polo e atrativo também para estudos universitários. Macaé sair de 1,3 mil matrículas no ensino superior em 2003 para 9,5 mil em 2017.

4) Mesmo que a realidade regional aponte para a necessidade de uma maior integração regional e o desenvolvimento de políticas públicas consorciadas e colaborativas (supramunicipal) os municípios seguem isolados e com visão concorrencial. 

Antes que esquentem as disputas eleitorais do ano que vem, já existem muitas questões que merecem ser conversadas e discutidas. Não apenas em Macaé, mas em todos os nossos municípios.

quarta-feira, julho 24, 2019

Palestra "Porto Macaé & Região Norte Fluminense" no Sindipetro-NF em Macaé, RJ

Ontem, 23 de julho de 2019, fui convidado para uma Palestra (Roda de Conversa) para debater sobre a relação petróleo, porto e a cidade (região) no auditório do Sindipetro-NF em Macaé, RJ.

Foto do Sindipetro-NF.
A ideia era trazer à discussão, as demandas de infraestrutura da cadeia global do petróleo, a disputa corporativa pelos projetos portuários e região. Entender as características gerais e os impactos do projeto do porto no bairro do Barreto em Macaé (Terpor) que surgiu depois que o terminal portuário da Petrobras no município (TUP Imbetiba) deixou de ser, desde 2014, a maior base de apoio offshore para exploração de petróleo do país. Questionar as razões dos investimentos financeiros no setor serem globais, mas precisarem sempre do território para gerar riquezas. Compreender a realidade do município de Macaé diante do atual desmonte, fatiamento, redução e limitação  das atividades da estatal Petrobras em várias de suas bases operacionais. Pensar ainda as razões das dificuldades de se pensar uma maior integração regional para que os municípios colaborem entre si e não permaneçam numa lógica concorrencial. Assim, a ideia foi de levantar um conjunto de indagações para a reflexão. Entre elas: Porto por quê? Porto para quê? Porto para quem?

A decisão por fechar ou implantar empreendimentos nessa potente cadeia global que é o setor petróleo, nunca é uma decisão local, mas são as pessoas e os municípios os atingidos. Dessa forma, a escala dessas discussões é mais ampla. Como sugere esse quadro ao lado que venho apresentando já há algum tempo. O território e as pessoas ficam na base desse sistema exposto nesse esquema-gráfico sintético.


Ontem, na roda de conversa em Macaé, as boas questões levantadas e o debate em torno desse tema - que é complexo e envolve várias dimensões -, eu acabei por não fechar numa síntese sobre as questões que me parecem mais importantes de permanecer como linhas para o debate, que na verdade não é e nem pode ser apenas sobre sobre o projeto portuário do Terpor. Ele é bem mais amplo.

Assim, antes de disponibilizar a apresentação na íntegra abaixo, eu transcrevo e destaco como síntese os dois últimos slides:

Macaé para quem?

1 - A questão em 3 Dimensões:
- Política (Gestão e participação);
- Econômica (Petróleo, Infraestrutura e logística: rodoviária, ferroviária e portuária)... Mas a Economia antes de tudo é uma relação entre seres humanos (Kate Raworth);
- Sociocultural (organização comunitária, identidade e movimentos sociais);

2 – O capital é global, mas precisa do território para gerar riquezas, por isso é preciso pensar o global e o local (K financeiro e K fixo), e pensar as pessoas. É preciso equilíbrio!

3 – Como será Macaé após o fatiamento e desmonte da Petrobras-setor de petróleo, IEs e energia privatizadas?

4 - Por que não pensar numa maior integração regional ou supramunicipal? Uma nova governança colaborativa e não concorrencial?

5 – Há uma disputa por narrativas – Espaço mental: Porto para quê e para quem?

6 - É preciso pensar Macaé e a região para as pessoas. De que adiante Macaé ser polo nacional de gás natural, energia e ter centralidade como polo intermediário e crescer sem reduzir as desigualdades?

7 – A cidade pode ser melhor “com as pessoas” e num projeto acordado.


Por fim, disponibilizo abaixo a apresentação na íntegra. O Sindipetro-NF transmitiu ao vivo a palestra através do Facebook e a mesma pode ser acessada e assistida aqui. O objetivo dessa divulgação é que os estudos e as pesquisas possam contribuir para a ampliação do debate em diversas frentes e dimensões. Para ver os slides em sequência é só ir rolando a barra do lado direito do PDF abaixo no Scribd. Sigamos em frente!

Roberto Moraes
on Scribd


PS.: Atualizado às 13:25: O Sindipetro-NF transmitiu ao vivo a palestra através do Facebook e a mesmo pode ser acessada e assistida no link: https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=2491083590952456&id=258073267579840

segunda-feira, julho 22, 2019

Máquina das dívidas: fórmula de criação de valor (capitalização) no mundo contemporâneo das finanças

Percebe-se hoje e cada vez mais um moto contínuo. Uma máquina de multiplicação das dívidas que não para de trabalhar, num mundo onde as taxas de juros baixaram, mas a economia se globalizou junto com as cadeias de produção que se espalharam. Assim, as taxas de juros são menores, mas as taxas de lucros maiores.

E quem tem dinheiro precisa fazê-lo circular sob a forma de papel ou capital fixo. A máquina das dívidas é hoje quem puxa a economia e captura as rendas locais. Não necessariamente através dos juros, mas com o controle dos negócios.

As dívidas se dividem em dívidas internas (tesouro das nações) e as externas tomadas pelos governos, corporações e as famílias e pessoas.

Agora no meio do ano de 2019, o bolo da dívida mundial chegou a US$ 243 trilhões. Em dezembro do ano passado elas eram de US$ 184 trilhões, segundo dados do IIF (Institute of International Finance).

Entre os estudiosos do tema, muitos consideram esse "circuito das dívidas" algo monstruoso e incontrolável, mas é também fato que ela tem movimentado o capitalismo contemporâneo pelo lado da montante ofertando crédito, mesmo que a juros menores, que parece em parte, compensados por maiores taxas de lucros, obtidas pela captura das rendas derivadas do trabalho e da propriedade mundo afora.

Fonte: IIF. Infográfico Financial Times-Valor 16 jul. 2019, P. A9.
De um lado, as 30 maiores economias emergentes (incluindo a China) somam dívidas totais de US$ 69,1 trilhões. O Brasil também está neste bolo e a maior parte dessa dívida é interna que equivale hoje a quase 90% do PIB. 

O caso brasileiro é muito bem estudado e detalhadamente criticado, pela "Auditoria Cidadão da Dívida" uma associação criada desde 2000 e que mantém (aqui) um portal com muitas informações constantemente atualizadas que mostram que apenas os juros e amortizações das dívidas públicas tem consumido entre 40% e 50% do orçamento federal ano a ano.

De outro lado estão os EUA em que sua dívida somadas as dívidas públicas, das corporações, das famílias e financeiras chegam hoje a US$ 73,6 trilhões, equivalente a 106% do seu PIB. Nos EUA, chama ainda a atenção as dívidas estudantis que chegaram em 2018 a US$ 1,5 trilhão; o financiamento de compra de automóveis que chegou a US$ 1,1 trilhão; e a dívida geral com cartão de crédito que já ultrapassou US$ 1 trilhão. Só essas três dívidas equivalem a mais do dobro de todo o PIB do Brasil.

Esta enorme máquina das dívidas está puxando o sistema e alimentando aquilo que passei a chamar de capital helicoidal, onde a sua trajetória tem levado a um esgarçamento com capturas crescentes de rendas da economia real e da financeira e colocando o capitalismo contemporâneo noutro estágio, tanto de acumulação e lucros quanto de riscos.

Riscos de repetição da crise de 1929, superando as crises financeiras da década de 90 e de 2008. Junto com a atual crise da democracia representativa liberal que se amplia em várias partes do mundo, poderá estar nos levando a uma fase de ruptura do sistema e até à barbárie, que hoje parece estar rondando com maior frequência o desenvolvimento capitalista contemporâneo.

sexta-feira, julho 19, 2019

"Uma potência acorrentada", por José Luís Fiori

O professor José Luís Fiori publicou nesta semana no site Outras Palavras, mais um interessante artigo em que analisa a conjuntura do Brasil diante da geopolítica e as hipóteses e os ricos a que estamos submetidos, enquanto nação que flerta uma volta à condição de colônia, sob comando e submissão a um escolhido protetorado. Vale conferir e debater por isso o blog republica o exto abaixo. 


                                                      Uma “potência acorrentada”
Está em marcha o “Projeto Dominium”: Bolsonaro & Guedes minam liderança regional do Brasil para transformá-lo em protetorado dos EUA. Superar esse destino exigirá um projeto de longo prazo de país — e que a sociedade volte a caminhar por si.
Em qualquer momento da história é possível acovardar-se e submeter-se, mas, atenção, porque o preço das humilhações será cada vez maior e insuportável para a sociedade brasileira.
J.L.F. História, estratégia e desenvolvimento. São Paulo: Editora Boitempo, 2014, p. 277.

Fatos são fatos: na segunda década do século XXI, o Brasil ainda é o país mais industrializado da América Latina e é a oitava maior economia do mundo; possui um Estado centralizado, uma sociedade altamente urbanizada e é o principal player internacional do continente sul-americano. E apesar de sua situação atual, absolutamente desastrosa, segue sendo um dos países com maior potencial pela frente, se tomarmos em conta seu território, sua população e sua dotação de recursos estratégicos.

Mais do que isto: goste-se ou não, entre 2003 e 2014, o Brasil teve uma política externa que procurou aumentar seus “graus de soberania” frente às “grandes potências” e dentro do sistema internacional como um todo, através de alianças estabelecidas fora do continente americano, sobretudo no caso da criação do grupo econômico do BRICS, obedecendo a uma estratégia internacional de longo prazo, definida e exposta em documentos oficiais que foram aprovados pelo Congresso Nacional.[1] Seu objetivo explícito era aumentar e projetar a influência diplomática e o poder político e econômico do Brasil no seu “entorno estratégico”, incluindo América do Sul, África Subsaariana Ocidental, Antártida e a própria Bacia do Atlântico Sul.

O Brasil já havia ingressado no pequeno grupo dos Estados e economias nacionais que exercem liderança dentro de suas próprias regiões, e era necessário começar a atuar como uma potência em ascensão, porque dentro deste grupo existe uma lei de ferro: “quem não sobe, cai”. Por isso mesmo, já naquele momento, o país começou a experimentar as consequências de sua nova postura, ingressando num novo patamar de competição, cada vez mais feroz, com países que lutam entre si permanentemente para galgar novas posições na hierarquia do poder e da riqueza mundial.

Este foi um momento crucial da história recente do Brasil: para seguir em frente e aproveitar aquela oportunidade estratégica, era indispensável a consolidação de uma coalizão de poder interna, sólida, homogênea e decidida, com capacidade efetiva de aproveitar as brechas e avançar com decisão nos momentos oportunos. Havia que olhar para a frente e pensar grande, para não se amedrontar nem ser atropelado pelos concorrentes e pela própria história. Mas em todo momento as portas sempre estiveram abertas, e sempre foi possível acovardar-se e recuar, apesar de que o preço do recuo fosse cada vez maior.

Foi exatamente isto que aconteceu: uma parte da elite civil e militar, e da própria sociedade brasileira, decidiu recuar e pagar o preço de sua decisão. Optaram pelo caminho do Golpe de Estado, e depois redobraram sua aposta, numa coalizão formada às pressas, que culminou com a instalação de um governo “paramilitar” e de extrema-direita, que neste momento está se propondo a mudar radicalmente o rumo da política externa do Brasil, com o abandono de algumas posições tradicionais do Itamaraty e a denúncia raivosa da política externa seguida pelo país entre 2003 e 2014. Tudo isso em nome de uma cruzada contra uma espécie de ectoplasma que eles chamam de “marxismo cultural”, que foi inventado pela ultradireita norte-americana; e em nome da “salvação da civilização judaico-cristã”, segundo o novo chanceler brasileiro, que acumula asnices diárias que são objeto da risota mundial.

Foi assim que, logo de partida, o novo governo apoiou a intervenção militar na Venezuela, que havia sido anunciada pelos Estados Unidos, que acabou se transformando numa “invasão humanitária” e um gigantesco fracasso, representando uma humilhação para o Itamaraty. Este acabou sendo alijado – pela primeira vez na história da América do Sul – de uma negociação fundamental para o continente, que foi realizada na Noruega, entre o governo e a oposição venezuelanos. Simultaneamente, o novo governo se propõe a levar à frente, de forma rápida e atabalhoada, uma desmontagem “selvagem” – do tipo que foi feita na Rússia dos anos 1990 – de todos os principais instrumentos estatais de proteção e defesa da população, do território e dos recursos naturais, industriais e tecnológicos brasileiros.

Existe, no entanto, uma coisa que chama a atenção no meio da balbúrdia: o fato de que não exista ninguém dentro desse novo governo que consiga dizer minimamente qual é o seu projeto para o Brasil! Qual é, afinal, seu objetivo para o país, no médio e longo prazo? O núcleo central do governo simplesmente não fala, nem pensa, só agride e repete frases de efeito. Os militares aposentados que estão no governo – da chamada “geração Haiti” – dão murros, esbravejam, ficam apopléticos, e quando falam, os que falam, costumam dizer coisas desconexas e inoportunas. Os religiosos fundamentalistas recitam versículos bíblicos, e parece que vivem cegados por suas obsessões sexuais. Os juízes e procuradores que participaram do golpe de estado e da “operação Bolsonaro”, parece que só falam entre si e com seus tutores norte-americanos, não conseguindo enxergar um palmo além do seu nariz provinciano. E, por fim, os financistas e tecnocratas de Chicago, amigos do ministro da Economia, não conhecem o Brasil nem os brasileiros, e parecem robôs de uma ideia só. Mesmo assim, é possível deduzir o que está na cabeça daqueles que efetivamente financiaram e seguem tutelando esse verdadeiro bando de indigentes mentais, a partir dos artigos e manifestações que aparecem nos seus jornais e revistas periódicas.

Durante a República Velha, as oligarquias agrárias e as elites financeiras brasileiras sempre admiraram e invejaram o sucesso do modelo “primário-exportador” argentino de integração com a economia inglesa, bem-sucedido durante a segunda metade do século XIX. E mesmo depois da crise de 1930 e da Segunda Guerra Mundial, muitas lideranças políticas e empresariais, e muitos economistas, como Eugenio Gudin, seguiram defendendo esse modelo para o Brasil, mesmo quando a Argentina já tivesse entrado em crise e iniciado seu longo declínio, que chega até nossos dias. Basta dizer que, em pleno período desenvolvimentista, Roberto Campos, que foi presidente do BNDES e ministro do governo militar de 1964, chegou a dizer em algum momento que seu sonho seria fazer do Brasil um grande Canadá. O mesmo sonho que ainda embala a cabeça dos empresários e banqueiros que financiaram e que ainda sustentam o Sr. Guedes dentro do governo do capitão Bolsonaro. Sua proposta e sua agenda foram sempre as mesmas, e seguem sendo repetidas como uma ladainha religiosa: é necessário abrir, desregular, privatizar e desindustrializar a economia brasileira, para radicalizar o velho modelo argentino e alcançar um novo estatuto nas relações do Brasil com os Estados Unidos e com a União Europeia. Um estatuto parecido com o dos velhos Domínios da Grã-Bretanha, como foi o caso exatamente do Canadá, mas também da Austrália e da Nova Zelândia, até avançado século XX. Territórios que gozavam de uma condição diferente das demais colônias britânicas, porque mantinham seus governos e sua vida política interna autônomas, mas tinham sua economia, sua defesa e sua política externa controladas pela Inglaterra.

Este é hoje, sem dúvida, o projeto e a utopia dos segmentos da elite econômica brasileira que decidiram apostar seu futuro neste governo, que já se transformou numa verdadeira excrecência histórica. Um projeto que não é “teoricamente” impossível, mas que enfrentaria grandes obstáculos reais, situados dentro e fora do país. O Brasil é um país continental, com uma população desigual e muitas vezes superior a dos velhos domínios britânicos, com uma economia muito mais desenvolvida e heterogênea, e com grupos de interesse poderosos e que serão literalmente destruídos, caso avance este projeto ultraliberal. Por outro lado, os Estados Unidos praticam uma política econômica altamente protecionista e não se submeterão jamais a nenhum tipo de acordo que prejudique seus “interesses estratégicos”. Muito menos ainda, assumiriam a responsabilidade da tutela econômica de um país com as dimensões do Brasil, sob um governo absolutamente caótico, e com uma economia agroexportadora que compete com a americana e, em particular, com os grupos do meio-oeste que foram essenciais para a vitória eleitoral de Donald Trump.

Há ainda outra dimensão desse “Projeto Dominium”: a troca da condição de aliado militar regional, que o Brasil sempre ocupou no século XX, pela condição de “protetorado militar” dos Estados Unidos: um território autônomo que abre mão de ter sua própria política de defesa e de segurança nacional, em troca da proteção militar de um Estado mais forte, neste caso, dos Estados Unidos. Aceitou obrigações que podem variar muito, dependendo da natureza do seu relacionamento com seu protetor, e também de sua localização geográfica e geopolítica dentro do sistema internacional. Isto já aconteceu, de certa forma, no caso da participação brasileira, ao lado dos Estados Unidos, na invasão de Santo Domingo, em 1964. Mas em nenhum momento do século passado soldados brasileiros ocuparam posições na hierarquia interna de um comando militar regional dos Estados Unidos, como estão se propondo fazer neste momento. Nem tampouco, no século passado, sequer cogitou-se a abertura de bases militares estrangeiras no território brasileiro. Nesse sentido, existe uma grande diferença que precisa ser sublinhada, porque o projeto econômico do Dominium tropeça com obstáculos materiais e interesses de grupos que são reais e muito pesados.

O projeto do “protetorado militar” é perfeitamente viável do ponto de vista material e conta com a simpatia das Forças Armadas norte-americanas; depende, no entanto, de uma decisão soberana da sociedade e do Estado brasileiro, e não apenas das Forças Armadas. E tal decisão tem limites jurídicos e morais, políticos e constitucionais, até porque quem financia a existência das Forças Armadas é o povo brasileiro, com o objetivo de que cuide de sua soberania, nos termos da sua Constituição. Não cabe moralmente a um governo, por mais direitista que seja, exigir que suas Forças Armadas se submetam ao comando de outro Estado que não seja o brasileiro.

Em síntese, do ponto de vista econômico, se o Brasil levar à frente, a “ferro e fogo”, este seu projeto de autotransformação num Dominium [2], deverá destruir quase tudo que foi feito nos últimos 90 anos da história da industrialização brasileira – com a participação decisiva dos militares do passado – e deverá se transformar numa “periferia de luxo” das grandes potências, garantindo-lhes o fornecimento de alimentos, de minerais estratégicos e de petróleo, além de suas reservas biológicas da Amazônia. Mas se além disto, o atual governo também levar à frente o seu projeto de “protetorado militar”, estará acorrentando a nação e submetendo as suas Forças Armadas, e o seu próprio povo, à humilhação de bater continência para a bandeira de outro povo, e de outro estado nacional. Uma traição que deixará sua marca na história do Brasil, causando um dano irreparável à autoestima do povo brasileiro, a menos que ele se levante e volte a caminhar com suas próprias pernas. Mas quando esta hora chegar, será fundamental que se tomem algumas decisões fundamentais, e que se tenha em mente um novo projeto de longo prazo país, um projeto capaz de se sustentar com seus próprios apoios internos, sem recuar nem esmorecer. Lembrando sempre que todos os povos que conseguiram superar grandes catástrofes, para chegar a ser grandes nações tiveram primeiro que desacorrentar suas próprias mãos, e assumir o controle de sua soberania, para poder definir seus objetivos e construir o seu próprio futuro.

[1] O Plano Nacional de Defesa (PND) e a Estratégia Nacional de Defesa (END), aprovados pelo Congresso Nacional em 2005 e 2008, respectivamente.

[2] Como parece ser o caso, depois da assinatura do Acordo do Mercosul com a União Europeia, que ocorreu no momento exato em que já tínhamos concluído este artigo. Mas os primeiros cálculos já indicam como consequência de um acordo feito por um governo desqualificado internacionalmente, uma queda de 7% da participação industrial no produto nacional, junto com a criação de mais 3 milhões de desempregados, nos próximos quatro ou cinco anos.

terça-feira, julho 16, 2019

O colosso da produção de petróleo colocará o Brasil como 4º maior produtor mundial em 2030, ao mesmo tempo que o país assiste ao desmonte da Petrobras e à sua “nigerização”

Paulo César Ribeiro Lima ex-engenheiro da Petrobras, ex-consultor legislativo do Senado Federal e atual consultor da AEPET, em apresentação feita no dia 10 de julho para a Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados, sobre o panorama do Pré-Sal e as movimentações recentes da Petrobras estimou que “haverá perda de recursos dos Estados e Municípios”, que podem chegar a “R$338 bilhões”, mais R$662 bilhões para a União. Junto essas perdas totalizam R$ 1 trilhão, apenas pelo fato dos royalties serem deduzidos da base de cálculo do IRPJ” (imposto de renda de pessoa jurídica).

O fato configura um benefício que na prática desconta as participações governamentais pagas (sob a forma de royalties) do imposto pago pelas petroleiras. O fato é agora ainda mais grave porque há que se considerar que a produção cada vez mais está sendo entregue das mãos de uma empresa estatal NOC (National Oil Corporation) como maior acionista, para empresas petroleiras privadas (IOCs – International Oil Corporations).

Assim, na verdade, estas petroleiras privadas obtêm um duplo benefício: acessam quase gratuitamente às nossas reservas, para as quais tanto gastamos para descobrir, como é o caso do colosso e da cobiçada reservas do Pré-sal, quando o mercado desdenhava a sua viabilidade.

A gravidade disso tudo aumenta na medida em que a ANP faz previsão para 2030, portanto daqui a uma década que a produção nacional de óleo e gás esteja entre 6 milhões e 7,5 milhões de barris por dia e que entre 4 milhões e 5 milhões sejam exportados sob a forma cru, enquanto o país seguirá importando mais derivados de petróleo, em especial nos EUA.

Chamo este processo de “nigerização” do país como exemplo de uma nação que produz petróleo bruto basicamente para exportação

Hoje já somos um dos maiores exportadores do mundo de óleo cru com exportações acima de 1,5 milhões de barris por dia, suportando junto com os EUA quase todo o aumento da demanda mundial, em função das reduções de oferta do Irã e Venezuela. 

Atualmente, só no pré-sal, o Brasil já produziu 2,5 bilhões de barris de óleo equivalentes (óleo + gás), mais do que toda a reserva provada da Argentina e apenas cerca de 2% de toda a estimativas do pré-sal.

Com esse nível de produção de petróleo do Brasil, em torno de 7 milhões de barris por dia em 2030, provavelmente, o Brasil já terá ultrapassado a produção do Canadá e da China e deverá se colocar como quarto maior produtor mundial de petróleo, só atrás dos EUA, Arábia Saudita e Rússia e na frente de vários outros grandes produtores do Oriente Médio como Iraque, Irã, Emirados Árabes Unidos, Kuwait e outros. (Veja aqui postagem do blog sobre os maiores produtores e consumidores mundiais de petróleo em 2018). A o lado o quadro dos maiores produtores mundiais.

Hoje, em 2019, só a Petrobras dispõe de 133 plataformas instaladas no litoral brasileiro, sendo 77 fixas, 37 navios de produção tipo FPSO, 14 semisubmersíveis e 5 de outros tipos. Até 2023* estão previstas a entrada em operação de 11 novos FPSOs. Atualmente, 14 sondas de perfuração estão trabalhando em procura de novos poços produtores no litoral brasileiro.

No meio disto há quem não queira entender o porquê do desmonte e privatização da Petrobras e do golpe institucional em 2016. 

O blog sabe que esse assunto já foi tratado aqui inúmeras vezes e com diferentes abordagens. Mas não cansarei de repetir e insurgir contra o crime que esse entreguismo representa. Não é possível que esse caso seja algum dia naturalizado. Não há nada de natural e nem apenas comercial nesse processo. Os dados gritam por si só. Eles são óbvios. Há sim um crime contra a nação e contra o Brasil e sua população.

PS.: Atualizado às 23:21: * Para correção do erro de digitação onde se faz previsão de que até em 2013, quando na verdade quer dizer 2023.

segunda-feira, julho 15, 2019

Fundo H.I.G. compra Nadir Figueiredo e setor financeiro segue avançando seu controle também sobre a economia real

Os fundos financeiros seguem adquirindo empresas nos três setores da economia.

Na indústria a notícia mais recente é que a famosa marca Nadir Figueiredo fabricante de copos e utensílios de vidro, criada há mais de 100 anos, foi adquirida pelo fundo de investimento H.I.G. Capital Brasil por R$ 836,2 milhões.

Assim, a Nadir Figueiredo, que é a maior produtora de vidro do Brasil e está entre as dez maiores fabricantes mundiais de vidro para uso doméstico, passa a ter um controle de fora do país e dessa forma terá a sua produção, seu mercado e valor vinculado aos acionistas deste fundo de investimento.

O fundo H.I.G. Capital Brasil é vinculado ao fundo americano H. I.G. Capital que tem sede em Miami é do tipo private equity e possui ativos no valor de US$ 31 bilhões. 

No Brasil o H.I.G. Capital também está presente no setor do agronegócio onde comprou a Bigsal, empresa de suplementação animal em 2017, depois de já ter fechado 4 negócios no Brasil, com o aquisição da varejista Mr. Cat, a rede de escolas de idioma Cellep e a farmacêutica Hallex Istar. O fundo H.I.G. Capital também está investindo pesado no setor imobiliário onde estima investir cerca de R 3 bilhões no Brasil.

Os fundos financeiros, como tenho insistido, constituem um instrumento que deu mobilidade ao capital e maior controle aos donos do dinheiro no capitalismo na atualidade. Esse processo se acelera nesse momento em que os ativos no Brasil ficaram "baratinhos".

Entender esse processo é fundamental para outras interpretações inclusive no campo da economia política.

Esse é o tema que venho discutindo aqui neste espaço há quase dois anos e motivou escrever o livro ao lado A ´indústria´ dos fundos financeiros: potência, estratégias e mobilidade no capitalismo contemporâneo

sexta-feira, julho 12, 2019

Troca de embaixadores entre Brasil e EUA com filhos dos presidentes retoma a ideia das capitanias hereditárias, o sonho sub-imperialista de colônia

Isso é muito próximo da ideia das capitanias hereditárias da época colonial.

Aliás, fica cada vez mais claro que os atuais governantes apoiados pelo generalato sonham que o Brasil assuma aquilo que ficou conhecido como sub-imperialismo.

O país formalmente se assumir como colônia do império com o desejo de assim poder controlar sub-colônias.

As capitanias e as indicações cruzadas entre a colônia e o império são partes dessa ideia, de que o Brasil assuma, formalmente, a sua dependência incondicional à hegemonia dos EUA, esperando assim ser recompensado por tamanha submissão.

O buraco sendo cavado é cada vez mais fundo e distante da luz ou da ideia iluminista que aos trancos e barrancos produziu algo parecido com o que se passou a chamar de civilização, no esforço de superar o feudalismo e a barbárie.

quinta-feira, julho 11, 2019

Piketty também critica a reforma da Previdência no Brasil porque ela amplia a desigualdade

Piketty em artigo publicado aqui hoje no Valor (11 jul. 2019, P. A19) critica as mudanças na Previdência no Brasil que aumentam as desigualdades que ele já vem combatendo, desde o seu livro que fez enorme sucesso em todo o mundo, quando questiona os limites sobre o capitalismo. 

Não é por outro motivo que ontem o CEO do Citibank estava aqui (em outra matéria do Valor) comemorando o aumento do número de ricos e de fortunas no Brasil.

A concentração de riqueza como resultado orgânico da política no país. Essa matéria é apenas a confissão de um banqueiro alegre com o arroxo sobre a maioria da população como se faz agora na Previdência. Ricos e fortunas crescendo no Brasil acima da média global, recolhendo e apropriando os excedentes gerados de forma quase absoluta pela renda do trabalho.

Abaixo o artigo do Piketty em conjunto com outros pesquisadores, Marc Morgan e Amory Gethin do World Inequality Lab da PSE ePedro Paulo Zahluth Bastos:


A quem interessa aumentar a desigualdade? - Proposta de reforma da previdência destrói um sistema solidário

O Brasil discute uma reforma da previdência que tende a aumentar desigualdades, embora sua propaganda aluda ao combate de privilégios. O país também se prepara para debater uma reforma tributária de modo independente da previdência. Se a redução das desigualdades fosse finalidade das reformas, as mudanças na previdência deveriam ser outras. E ambas as reformas deveriam ser debatidas conjuntamente.

A reforma da previdência proposta aumenta muito a desigualdade de acesso à aposentadoria. Muitos brasileiros pobres começam a trabalhar muito cedo, mas não conseguem contribuir pelos 20 anos exigidos para obter a aposentadoria parcial, para não falar dos 40 anos para a aposentadoria integral.

Nas regras atuais, a primeira alternativa para aposentadoria é somar um tempo mínimo de contribuição (30 anos para mulheres e 35 para homens) com sua idade para alcançar um período de 86 anos para mulheres e 96 para homens, que aumentará a cada dois anos até chegar à soma 90/100 em 2027. A segunda opção é alcançar a idade mínima de 60 anos para mulheres e 65 para homens, com pelo menos 15 anos de contribuição. A desvantagem é o desconto do valor da aposentadoria pelo "fator previdenciário" que varia com a idade, o tempo de contribuição e a expectativa de sobrevida.

A proposta atual elimina a primeira opção. Aumenta a idade mínima feminina para 62 anos (com os mesmos 15 anos de contribuição) e mantem 65 anos para homens, mas exige 20 anos de contribuição. Também reduz a aposentadoria integral (obtida com 40 anos de contribuição) e aumenta o desconto da aposentadoria parcial (entre 20 e 39 anos de contribuição).

O problema é que os cidadãos que só conseguem se aposentar hoje por idade são trabalhadores precários que estão longe de alcançar o tempo de contribuição exigido nas novas regras: 56,6% dos homens e 74,82% das mulheres não alcançam. Em média os homens só conseguem contribuir 5,1 vezes por ano, e as mulheres 4,7 vezes, segundo estudo de Denise Gentil (UFRJ) e Claudio Puty (UFPA) para a Anfip.

Se precisarem contribuir mais 60 meses, supondo que continuem empregados e consigam contribuir no mesmo ritmo na velhice (o que é uma proposição absurda), a idade mínima real de aposentadoria parcial seria 74,8 anos para mulheres e 76,8 para homens, na média. Na prática, milhões não chegariam a se aposentar ou, com "sorte", seriam transferidos para a assistência social, mas suas contribuições não seriam nem devolvidas.

Como são trabalhadores em empregos precários, aumentar seu tempo de contribuição não significa combater privilégios, mas aumentar a desigualdade. Significa retirar recursos de muitos trabalhadores pobres e vulneráveis que não conseguirão se aposentar.

De nada adianta reduzir a alíquota mensal de contribuição para os pobres se a contribuição se alonga por mais 60 meses e, no fim, nem garante a aposentadoria. O incentivo é para que não contribuam, o que coloca em risco até o pagamento das atuais aposentadorias.

O risco ao sistema advém igualmente do fim da contribuição fiscal dos empregadores, como a Cofins e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Com o PIS-Pasep, somam cerca de metade das receitas da Seguridade Social.

A proposta atual retira as contribuições fiscais do financiamento das aposentadorias (mantendo-as na Seguridade). O financiamento tripartite da aposentadoria acabaria, no sentido em que a reforma deixaria apenas o contrato de trabalho formalizado entre o trabalhador e seu empregador como fonte de recursos (através da contribuição previdenciária sobre a folha salarial).

Isto tudo provavelmente já inviabilizaria o sistema, mas para completar o governo Bolsonaro promete reforma tributária que libera o empregador de contribuir para a Previdência com uma percentagem da folha salarial, além de abolir a Cofins e a CSLL.

Em um país tão desigual, deixar apenas os trabalhadores e, a depender da reforma tributária, talvez os empresários como responsáveis por um sistema contributivo de aposentadoria é condená-lo, especialmente nas circunstâncias atuais. A crise e o desemprego levaram 6,2 milhões de trabalhadores e milhares de empresas a deixaram de contribuir para o sistema, contraindo as receitas em cerca de R$ 230 bilhões entre 2014 e 2017 em termos reais.

Para completar, o desvio das contribuições sociais da Seguridade Social para o Tesouro aumentou de 20% para 30% em 2016, saltando da média de R$ 63,4 bilhões entre 2013-2015 para nada menos que R$ 113 bilhões em 2017.

Foi a crise econômica que contribuiu para o déficit, e não o contrário. Quando a crise for superada, porém, não é provável que as receitas se recuperem o suficiente caso o emprego do futuro venha sem contribuição empresarial sobre a folha salarial.

Se, como hoje, a solução proposta para a insuficiência de receitas no futuro for elevar de novo a idade mínima, a alíquota média e o tempo de contribuição, qual segurança jurídica terão os trabalhadores para serem incentivados a contribuir para a previdência pública mesmo que tenham empregos estáveis?

Em suma, trabalhadores com emprego e renda precários não terão capacidade de alcançar o tempo de contribuição requerido para se aposentar, enquanto trabalhadores com emprego estável e maior renda não terão incentivos para contribuir para um sistema insustentável.

É por isso que, se o objetivo for realmente combater privilégios e reduzir desigualdades, a proposta deveria, primeiro, explicar em detalhe as projeções atuariais e demográficas que justificam atrasar e até inviabilizar a aposentadoria de milhões de brasileiros pobres.

Segundo, deveria focar no topo do funcionalismo público e não nos trabalhadores pobres e precários. Nas projeções do governo para a proposta original, no entanto, a suposta "justiça fiscal" com o aumento das alíquotas de contribuições de funcionários públicos representa 1% da economia, enquanto 91% (R$ 4,1 trilhões em 20 anos) viria da assistência social e do regime geral, onde 90% dos aposentados recebem até 2 salários mínimos.

Terceiro, a reforma previdenciária deve ser necessariamente complementada pela reforma tributária, mantendo o financiamento tripartite da Previdência, mas combatendo os privilégios na tributação. Afinal, o Brasil parece um paraíso fiscal para detentores de capital e para a elite de profissionais de alta renda.

Quase metade da receita de impostos (49,19% em média entre 2008 e 2017) vem embutida em bens e serviços que não distinguem o consumidor miserável do endinheirado. Como o pobre consome tudo ou quase tudo o que ganha, paga proporcionalmente mais impostos que o rico.

Por sua vez, a alíquota máxima do imposto de renda (27,5%) captura tanto o assalariado de R$ 5 mil quanto o de R$ 10 milhões. Já o detentor do capital simplesmente não paga imposto pessoal sobre sua renda em lucros e dividendos. Profissionais que prestam serviços como pessoas jurídicas têm o mesmo privilégio. Outra jabuticaba brasileira é que as empresas deduzem o "pagamento" de juros sobre seu "capital próprio", o que aumenta os lucros distribuídos sem impostos.

Combater estes privilégios pode levantar bem mais de R$ 100 bilhões ao ano como quer o governo. Ademais, a sonegação se aproximou de R$ 620 bilhões em 2018, segundo nova estimativa do Sinprofaz. Isto é muito mais que a economia com o corte de aposentadorias e pensões proposto pelo governo Bolsonaro. Isto sem falar de outras isenções e das dívidas tributárias.

Ainda é tempo de debater com honestidade como combater privilégios e reduzir desigualdades. Porém, levar adiante a reforma da previdência nos termos atuais tornaria o Brasil um exemplo mundial de como destruir um sistema solidário de previdência e aumentar a desigualdade.


Thomas Piketty é diretor da l´Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales (EHESS) e professor da Paris School of Economics (PSE).
Marc Morgan e Amory Gethin são pesquisadores do World Inequality Lab da PSE.
Pedro Paulo Zahluth Bastos é professor do IE-Unicamp e pesquisador do Cecon-Unicamp.

Fonte: Valor. 11 de julho de 2019, P. A19.

terça-feira, julho 09, 2019

Uber com 600 mil motoristas faturou R$ 3,6 bilhões em 2018 no Brasil e capturou rendas locais usando plataformas território-digitais

Os números da Uber no Brasil são gigantescos. Em 2018 a empresa americana que usa o aplicativo de transportes Uber, que tem no Brasil o seu segundo maior mercado no mundo (só atrás dos EUA) teve faturamento de quase US$ 1 bilhão. Para ser mais exato US$ 959 milhões, equivalentes a R$ 3,6 bilhões.

Atualmente, o Uber totaliza 600 mil motoristas operando em sua plataforma no país. Eles estão distribuídos em 100 cidades. Um total de 22 milhões de pessoas são usuários frequentes do Uber no Brasil e 2,5 bilhões de viagens já realizadas desde que o aplicativo chegou ao país.

A plataforma digital-territorial se apresenta ao grande púbico como uma alternativa de renda para autônomos e simultaneamente como uma fórmula de transporte confiável e mais barata para quem precisa se deslocar.

Inicialmente a plataforma se apresentou como o desdobramento da ideia da economia de compartilhamento, mas logo se percebeu que se tratava de um negócio que centraliza trabalho precário que suga 25% das rendas locais, para um serviço que poderia ser gerido por cooperativas locais/regionais.

Os dados de 2018 constam de uma matéria do Valor (08/07/2019), mas já foram aqui comentados num texto com breve resenha sobre o livro do jornalista americano Tom Slee “Uberização” com o título “O engodo da economia do compartilhamento, retrato da uberização e airbnbização!”. Link: http://www.robertomoraes.com.br/…/o-engodo-da-economia-do.h…

O interessante assunto também vem sendo pesquisado e analisado há alguns anos pelo professor e pesquisador da UFMG Fábio Tozi.

A empresa-plataforma como ele gosta de se definir, Uber diz que também entrando em outros negócios relativos à deslocamento de pessoas como venda de passagens de ônibus, metrô e trens por aplicativo, além de bike e patinetes. E nos EUA também estaria sofisticando com ofertas de deslocamento por avião e helicópteros com o Uber Air e Uber Copter.

Agora, olhando por outros lados, imaginem o controle sobre fluxos financeiros que esta plataforma possui, inclusive com passeio do dinheiro (informações financeiras) em países com baixas tributações, antes do valor do motorista ser disponibilizado.

Outra preocupação deve ser sobre o poder que passa a deter o Uber ao ter controle do “big-data” com informações sobre deslocamentos de milhões (quase bilhão) de pessoas em vários lugares do mundo ao longo do tempo.

Interessante observar que o controle do território e os fluxos (deslocamentos) no seu interior é o alvo para a captura do dinheiro local. Trata-se de uma renda derivada do trabalho em diferentes partes do mundo, incluindo o Brasil, e do qual a Uber vampiriza 25% que sobe para o andar das altas finanças.

Eu já comentei aqui sobre a conta que é possível interpretar sobre estes 25%. Se 600 mil motoristas trabalham para a Uber e 25% de sua renda se dirigem aos donos dessa plataforma, isso significa que 150 mil motoristas seriam, contabilmente, escravos nessa captura do rentismo.

Sobre o assunto veja aqui outra postagem do blog em 1 de maio de 2019: "1 milhão de trabalhadores brasileiros que atuam na "economia do compartilhamento" podem ser vistos como escravos que alimentam o rentismo dos fundos financeiros".

Nessa linha é bom recordar que o Uber hoje é controlado por fundos financeiros que aportaram US$ 60 bilhões nele, antes ainda do mesmo passar a lançar esse ano as suas primeiras ações no mercado de capitais.

segunda-feira, julho 08, 2019

Repito: "O desmonte e a privatização fatiada das subsidiárias e empreendimentos de uma única empresa, a Petrobras, é o maior da história do setor petróleo no mundo"

Quando escrevi há quatro dias uma postagem (aqui) dizendo que "o fatiamento e a entrega das partes da Petrobras já era o maior caso da história deste setor em todo o mundo e de que não havia nenhum outro caso sequer similar” as centenas de compartilhamentos e curtidas (no blog ou FB) sobre o texto devem ter reproduzido uma concordância com o geral, mas fiquei com a percepção que muitos outros consideraram o mesmo como um exagero de retórica. Outros atribuíram a um desabafo.

Indignação sim, mas exagero não. Por conta disso, eu fui novamente recorrer aos dados globais sobre o setor petróleo que lubrifica o capitalismo em todo o mundo. A geopolítica do petróleo e também da energia nos ensina que o poder age nesse caso na direção entre os donos das maiores reservas, os produtores e às nações que mais consomem petróleo no mundo.

Neste esforço de observação eu identifiquei que não há registros no curto prazo (menos de meia década) de uma única corporação, fundo financeiro e/ou uma nação ter desfeito e transferido um volume tão grande de ativos do setor de petróleo no mundo.

Esse processo que se pratica contra a Petrobras desintegra sua cadeia produtiva (aquela vai do poço ao posto), entre produção, circulação, beneficiamento (industrialização) e distribuição de derivados para o consumo.

Desintegra para melhor fazer a maior volume de transferência de ativos que se verifica na história. Neste setor houve recentemente uma grande transferência de ativos, que na ocasião foi considerado o maior negócio de petróleo no mundo. Refiro-me ao fato da venda da petroleira britânica BG para a anglo-holandesa Shell, pelo valor de US$ 53 bilhões.

Tratou-se de uma transação que levou quase dois anos para ser concretizada, entre 2014 e 2016 e que aconteceu exatamente no auge do colapso de preços do barril de petróleo, quando chegou a US$ 27, o barril. Ainda assim, a Shell manteve sua proposta e o negócio foi selado.

Vale ainda recordar que a maior razão do interesse da Shell pela BG era o fato desta já estar produzindo petróleo, nas reservas na área do pré-sal, onde a petroleira britânica tinha participações em consórcios junto com a Petrobras.

Pois bem, sendo essa a maior transação em volume de recursos do setor petróleo, fica mais fácil compreender porque, que o desmonte, transferência de ativos e desinvestimentos (ou o nome que venha ter) da Petrobras para empresas privadas e fundos, que está ocorrendo desde 2016 e prossegue com força agora em 2019, ultrapassa a venda da BG para a Shell.

Assim, eu fui refazer as contas somando o valor das entregas dos chamados ativos da Petrobras. Muitos já foram transferidos, outros estão em curso e os valores, por baixo ficam acima de US$ 55 bilhões se aproximando dos US$ 60 bilhões.

Esse valor poderá ser ultrapassado conforme novas decisões de venda e de interessados em operar os negócios, como hoje tem sido feito a toque de caixa.

A lista é extensa e segue sempre com uma novidade a cada dia de novo desmonte e entrega de empresas a preço vil de final de feira. Vou listar os ativos, porém, mais adiante vou também identificar os valores da venda de cada uma delas, assim como os novos proprietários do setor no Brasil. Eles preferiram comprar o que estava pronto a fazer algo novo.

Malha de Gasodutos da NTS (2,5 mil km); subsidiária TAG incluindo a malha de 9 mil km de gasodutos; Citepe (Complexo Petroquímico se Suape); 8 refinarias (Abreu Lima, Landulfo Alves, Gabriel Passos, Getúlio Vargas, Alberto Pasqualini, Isaac Sabbá, Unidade Industrial de Xisto e Lubrificantes e Derivados do Nordeste); Ações da BR Distribuidora; Direitos sobre a Cessão Onerosa; Ativos da Transpetro; Instalações do setor de Gás Natural incluindo as Inidades de Processamento; Liquigas; Direitos de 50% sobre a Petroquímica Brasken; Ativos - ou participações - de vários campos de petróleo em diversas bacias incluindo da área do pré-sal: Carcará; Guará; Tartaruga Verde; Roncador; Maromba; Peroá, Cangoá, Polo Nordeste e campos maduros da Bacia de Campos, BA e RN.

Portanto, ouso desafiar quem afirme o contrário. O desmanche atual da Petrobras se trata do maior desmonte e privatização uma única empresa (Petrobras) na história do setor petróleo no mundo.

sábado, julho 06, 2019

Receita da Prefeitura de Campos com taxa de iluminação cresceu mais de 7 vezes. Agora a PMCG quer entregar tudo por PPP para concessão privada

A taxa de iluminação aumentou bastante e chama a atenção no orçamento atual e futuro de Campos. Ela cresceu no atual governo de uma receita de menos de R$ 5 milhões no ano de 2017 para mais de R$ 36 milhões anuais em 2019. Um crescimento em números redondos 700% em pouco mais de um ano. É difícil que alguém considere que a iluminação tenha melhorado nessa mesma proporção. 

Veja ao final dessa postagem, as publicações do Diário Oficial da Prefeitura de Campos de dezembro de 2017 informando a receita cm a taxa de iluminação de R$ 4,969 e de R$ 12,8 milhões só até o final do segundo bimestre de 2019 (até abril de 2019), o que dá uma média de R$ 3,2 milhões por mês e permite fazer a estimativa de R$ 38,4 milhões anuais, mas ainda jogando para baixo essa conta considerando a sazonalidade, é que se chega ao valor de R$ 36 milhões. 

Para termos uma ideia do que hoje pode ser considerado uma distorção, pode-se recorrer à própria LDO (Lei de Diretrizes Orçamentária) de Campos para 2020 a receita total prevista é de R$ 2,013 bilhões para o município. Lá estão também previstas receitas com a taxa de iluminação de R$ 34,8 milhões equivalendo a quase 60% de toda a receita com o IPTU que foi prevista em R$ 63,6 milhões também no ano de 2020.

Repito, agora, em 2019, até abril, a receita com a taxa de iluminação foi de 12,8 milhões no ano essa receita total deverá chegar R$ 36 milhões. Uma receita superior a sete vezes ao que se tinha até 2017.
 
Porém, é ainda mais estranho que a PMCG em audiência pública no dia 26 de junho na Câmara tenha informado aqui que planeja uma PPP (Parceria Público Privada) para a Iluminação Pública através de um contrato de concessão pública para um período de 30 anos, prevendo um valor de investimento total de R$ 238 milhões, sendo R$ 110 milhões nos primeiros 5 anos + R$ 128 milhões nos 25 anos seguintes), mais os custos com manutenção a serem bancados pela empresa concessionária em troca do recebimento dessa taxa de iluminação.

Exatamente agora com essa volumosa receita atual anual a PMCG quer entregá-la? Nesse período é possível estimar, que em 30 anos ela seria de mais de R$ 1 bilhão. A conta é simples: R$ 36 milhões x 30 anos = 1,080 bilhão. 

Assim, reduzindo os R$ 238 milhões desse total, sobrarão R$ 842 milhões para a manutenção e os lucros da concessionária, fora os acréscimos de receitas que as seguidas correções dos valores das contas nesse período até 2050. A própria PMCG prevê na LDO 2020 que a receita com esta taxa será de R$ 37,3 milhões em 2021 e R$ 39,6 milhões em 2022. Portanto, temos aí um colosso!

Vamos a outra conta simples. Em 5 anos a concessionária de iluminação pública que vier a ganhar a PPP receberá de receita R$ 36 milhões x 5 anos = R$ 180 milhões. Terão que investir R$ 128 milhões. Sobrarão R$ 52 milhões para a manutenção básica. É possível que tenha que colocar algum extra. Porém, depois terão 25 anos só de faturamento. Lembrando que o valor da receita da taxa de iluminação continuará crescente por conta das seguidas correções autorizadas pela Aneel.

Voltamos à pergunta simples. Ora, logo agora que aumentaram essa receita encima do contribuinte, eles decidem vai repassá-la na íntegra para uma concessionária? E nessa proporção? Aqui nem se trata da disputa entre serviço público e privado, na medida em que hoje esses serviços de manutenção dos 52,7 mil pontos de iluminação do município, já são feitos por empresas privadas contratadas em licitação. E sim, a troca do controle dos serviços, onde a prefeitura primeiro aumentou a receita em 7 vezes e agora chama parceiros.

É sabido que algumas empresas estão rodando vários municípios do Brasil para ajudar na elaboração dos editais destas PPPs. Elas sabem dos seus interesses. Os bancos e fundos financeiros que estão por trás destes interesses também sabem muito bem como e través de quem conseguirão capturar essa renda local.

Não seria admissível que o mesmo possa estar sendo feito em Campos. Isso seria uma repetição com o caríssimo contrato de concessão para Limpeza Pública que consome anualmente quase R$ 70 milhões do orçamento municipal, 10% a mais que toda a receita com IPTU em Campos. 

Se as empresas que estão de olho nessa PPP defendem os seus interesses, os munícipes precisam defender os seus. Uma cidade bem iluminada é direito do cidadão. Aumenta sua segurança e torna a circulação noturna mais agradável. Porém, um aumento de receita de 700% é demais, até porque ninguém viu essa mesma proporção chegar na qualidade dos serviços, em especial nos bairros da periferia e nos distritos mais afastados da área urbana mais central. Se circular à noite nesses espaços nem será preciso indagar sobre isso aos moradores.

Na verdade tem-se aí um espécie de "Venda do Futuro-2 Ampliada" e ainda mais nociva daquela ocorrida com os empréstimos obtidos com os bancos para substituir as receitas dos royalties do petróleo. 

Imagino que algumas explicações, mesmo insuficientes, possam existir para uma decisão que traz impactos para os moradores para o longo período de 3 décadas, quase uma geração. A conferir! 


Anexos: Execução orçamentária de (6º  Bimestre) de 2017 e (2º Bimestre) de 2019 da Prefeitura de Campos para comparação das receitas com taxas de iluminação pública no município.



 

quinta-feira, julho 04, 2019

Fatiamento e entrega das partes da Petrobras já é o maior caso da história deste setor em todo o mundo: não há nenhum outro caso sequer similar

A privatização da Petrobras que está em curso (de forma fatiada ou agrupada por setor: produção, logística, beneficiamento e distribuição) já é hoje, o maior desmonte de toda a história do setor petróleo no mundo todo.

A fase atual de entrega quase total (e mesmo descontrolada) executa uma dupla, simultânea e gigantesco prejuízo à Nação e à população Brasileira. Ao mesmo tempo se faz o desmonte estatal e a  transferência de seus patrimônios (estruturas e instalações, etc.).

Duplo e veloz crise. Ao mesmo tempo ela promove a desintegração da cadeia (exploração e produção: up-stream; logística e circulação: midi-stream; e beneficiamento e distribuição para o consumo downstream) que leva o petróleo e o gás do poço ao posto de combusteis e ao poste de energia elétrica, ao mesmo tempo, executa a transferência dos ativos de uma estatal (NOC) para outras petroleiras privadas (IOCs), tradings e/ou fundos financeiros articulados a esse setor estratégico da economia e geopolítica que é o petróleo.

Os fundos financeiros hoje controlam boa parte dessas corporações que assim promovem esse eixos que explicam o movimento e troca de controle desses patrimônios (capitais fixos) para as  corporações e fundos globais.

Assim, se transfere a renda de monopólio do Estado brasileiro e os entreguistas comemoram com o fajuto argumento de que se trata da promoção da concorrência. Ora, ora...

Entregam um monopólio estatal para promover uma concorrência que não virá com a simples transferência para o controle oligopolizado global e privado. 

São centenas de bilhões de dólares (possivelmente dezenas de trilhões) de riquezas entregues à prazo a perder de vista onde junto vai de graça o mercado consumidor que gerará os recursos para pagar o que estão ganhando.  

Pior, não se trata nem de acordos para o que precisa ser feito e sim, e também, o que já está feito, implantando, funcionando e sendo ampliado com expertise reconhecida internacionalmente.

O caso do gás natural, junto com a entrega dos gasodutos, refinarias, petroquímicas, distribuidora, etc. são acompanhadas também, como presentes, os campos maduros da Bacia de Campos e ainda a área da joia da coroa, o nosso pré-sal, que é ainda hoje, a maior província petrolífera do mundo descoberta na última década.

Em toda a história da economia mundial do setor petróleo, que lubrificou o capitalismo no mundo, esse é, disparado, o maior caso de desmonte e entrega vil, rápida e sem contrapartidas, sobre aquilo que foi construído com conhecimentos, recursos, tecnologia, competência, o suor e a vida dos brasileiros, para servir a interesses de capitalistas estrangeiros.

Repito: maior caso da história. 

Os prejuízos podem ultrapassar em 50 ou até 100 vezes, tudo aquilo que foi criminosamente desviado da Petrobras. Sem nenhum projeto de Nação e com uma visão estúpida de colônia que deseja apenas agradar ao império. Tem-se aí um esforço e uma narrativa para tornar legal essa imoralidade que a história já está registrando. 

Tudo isso é proporcionalmente e em termos de encadeamento na economia muito maior do que tudo que já entregamos até hoje aos interesses estrangeiros

Isso não pode e não vai ficar por isso mesmo. Esses criminosos terão que pagar por tudo isso!

quarta-feira, julho 03, 2019

O crime de Brumadinho fez a Vale aumentar seus lucros em mais de R$ 10 bilhões

Cinco meses após o crime de Brumadinho, a Vale aumentou os seus lucros em cerca de R$ 15 bilhões.

É cruel, mas real. 
Foto da BBC

A Vale sem o acidente teria lucros menores. Depois do crime da barragem de Brumadinho a Vale passou a lucrar  mais.

Nos dias seguintes ao crime do rompimento da barragem que produziu centenas de mortos, eu publiquei aqui no blog uma conta cruel, mas real.

O acidente já estava produzindo um aumento do preço da tonelada do minério de ferro em todo o mundo. Assim, mesmo com todas as despesas e indenizações, a Vale e seus investidores iriam lucrar e muito com a tragédia.

Na ocasião fiz uma conta por baixo.

Agora ultrapassados 5 meses, e o minério tendo saído de US$ 73 para cerca de US$ 124 (valor de 01 de julho 2019), a tonelada no mercado internacional, posso dizer que o lucro da Vale cresceu em mais de R$ 50 milhões por dia.

Isso mesmo. R$ 50 milhões por dia a mais como resultados de 236 mortes.

É bom lembar que o aumento do preço no mercado internacional é basicamente por decorrência da Vale que é a maior exportadora do mundo e ao reduzir sua exportação, fez o preço por tonelada quase que dobrar.

Considerando o preço de hoje do minério, para esses 150 dias se chega a um ganho a mais de mais de R$ 7 bilhões. E todo dia, enquanto cai lágrimas dos parentes e amigos das vítimas, a corporação vê cair no seu cofrinho mais R$ 50 milhões.

A CPI de Brumadinho no Senado aprovou, nesta terça-feira o relatório final. Nele pede o indiciamento do ex-presidente da Vale Fábio Schvartsman e mais 13 pessoas, sendo 11 delas da mineradora e outras duas da empresa TÜV SÜD, empresa alemã responsável por auditar a área. 

Segundo a CPI os envolvidos devem responder pelos crimes de homicídio com dolo eventual, lesão corporal culposa e crimes culposos de destruição de flora e poluição. O parecer da CPI aprovado aponta que as 14 pessoas foram “coautoras” numa “cadeia normativa de imperícia, imprudência e negligência” que levaram ao rompimento da Barragem 1, da Mina Córrego do Feijão, em Minas Gerais. 

Enquanto isso, a empresa e seus investidores continuam lucrando.

A realidade do mercado é cruel demais, mas não pode deixar de ser exposta em toda a sua extensão.

segunda-feira, julho 01, 2019

Capitalismo entra em nova fase com maior e mais violenta captura das rendas originadas do trabalho

No centro do capitalismo mundial, em especial na Europa e EUA, há nos últimos anos, uma expressiva retração nas taxas de juros que levam a rendimentos até negativos, que na prática é quando se paga para emprestar dinheiro. Pasmem!

Em 2019, os títulos das dívidas com rendimentos negativos que chegaram ao extraordinário volume de US$ 12,5 trilhões, ultrapassando o recorde de 2016, mesmo que no primeiro trimestre deste ano, o crescimento econômicos dos EUA tenha chegado a 3,1%. 

Sobre esse assunto vide artigo do colunista do Financial Times, Gillian, traduzido e publicado pelo Valor, em 28 de junho de 2019 (P.A11): Juros negativos criam território surreal: títulos da dívida com rendimento negativo cheha a recorde de US$ 12,5 tri.

Assim, temos menores taxas de juros (quando se paga para emprestar dinheiro), porém muito maiores taxas de lucros e de expropriação das rendas do trabalho. Em muito casos de espoliação das mais variadas formas. 

Assim, há necessidade de se observar a mudança de forma no capitalismo contemporâneo. Uma primeira e mais simples explicação para esse fenômeno é que o mundo capitalista está transitando para uma nova fase, onde os financistas ampliaram a sua tática. Menores juros no geral e maiores lucros em todos os lugares. 

É nesse sentido, que os fundos financeiros (assunto que temos debatido aqui neste espaço de forma ampla), embora já existissem no mundo há quase um século, só depois do crise financeira de 2008, eles passaram ganhar destaque como instrumento da articulação entre a financeirização, a produção material e o comércio global. 

No capitalismo atual e hegemonicamente financeiro (mas não exclusivamente, porque segue prescindindo das pessoas e dos espaços) os financistas passaram a enxergar para além dos ganhos com as taxas de juros. 

Os financistas passaram a mirar numa maior captura das rendas locais/nacionais, extraídas das mais variadas atividades, desde a produção material, à exploração de plataformas para a extração dos serviços Uberização, iFood, AirBnb, etc.).

Esse esquema vem ampliando enormemente a “vampirização das rendas” locais/nacionais (no caso do Uber 25% vai para os EUA), assim como trabalham pela maior produtividade global que age sobre a redução dos direitos trabalhistas, o aumento da exploração sobre as populações em diferentes setores da economia (frações do capital) e que atua de forma diferente no espaços dos estados-nações no centro e na periferia do capitalismo.

Mesmo que a máquina da dívida seja cada vez maior (pública e privada) para fazer o dinheiro circular, o que aumenta em velocidade e índices maiores são as taxas de lucros obtidas sobre os negócios, mesmo que não se descarte os lucros com os juros como antes. 

A nível global (e em volume) os juros ainda são altos. Com rendimentos negativos no centro do capitalismo e colossais na periferia, como no Brasil. Por isso, parece não ter sentido falar em taxas médias de juros. Ou taxas globais, porque elas variam quase ao mesmo número dos estados-nações.

Isso reforça a tese de que o capitalismo sempre foi um projeto claramente geográfico (SWYNGEDOUW) com uso expansivo do espaço, controle sobre os Estados-nações e garantia de ação transfronteiriça do capital.

Os fluxos materiais e imateriais são cada vez maiores. Por isso a disputa Trump (EUA) x China com a guerra comercial acaba sendo tão danosa à economia como um todo.

As rede e cadeias globais de produção e a movimentação financeira desregulada, transfronteiriça e sob os domínios das tecnologias informacionais, avançam rapidamente para a digitalização total do dinheiro, que o aproximaria ao mesmo tempo, do sonho utópico do capital de flutuar sobre o espaço sem limites, e do esgarçamento do sistema e os riscos da barbárie.

Nesse processo de mundialização, a produção material acontece em diferentes pontos do mundo sob a forma de redes e a circulação (chamada de logística) ampliou a sua importância, agora não apenas na etapa final de distribuição para o consumo, mas nas etapas intermediárias, já que a busca frenética é pela produtividade, onde os financistas conseguem capturar mais valor sobre o trabalho humano, seja egípcio, malaio ou boliviano. 

Etapas da produção com menores custos significam maior captura de lucros pelos financistas que através dos fundos financeiros hoje, já controlam boa parte das corporações que tocam a produção mundo afora.

Esse é um diagnóstico em aberto sobre a economias nacionais e globais. Porém, os estados-nações devem ter claro como pretendem participar desse jogo. De forma completamente subordinada e dependente ou num esforço de buscar algum grau de hegemonia e de articulação. 

No caso do Brasil, quase todas as inciativas nos últimos três anos, a tônica tem sido a de subordinação e dependência desmedidas, sem compreender esse fenômeno - que embora complexo - parece claro, e pior: nenhum projeto de Nação.