segunda-feira, novembro 27, 2017

As consequência do desmonte e desintegração da Petrobras para o Circuito Espacial de Produção do Petróleo na Bahia

Estou retornando hoje, depois de  uma semana na Bahia, onde participei de um simpósio em Salvador. Como é de costume, eu aproveitei, junto com amigos professores e pesquisadores, para conhecer parte do entorno que envolve o Circuito Espacial de Petróleo no estado da Bahia e municípios do Recôncavo Baiano.

Foto Wandeike Costa, Sindipetro-BA da atividade de campo dia 22 nov.2017. 
Há muita coisa para descrever sobre o tema. Assim, aqui farei uma primeira descrição sobre a visita de campo sobre a região do circuito espacial do petróleo no estado da Bahia. Um relato do Sindipetro-Bahia você pode ler aqui [1]. O informe do sindicato noticia uma parte daquilo que pretendo ainda explorar sobre o tema.

Há que se registrar, e agradecer a colaboração dos integrantes do Sindipetro-Bahia que muito auxilou na compreensão desta realidade. Em especial, ao seu coordenador David Bacelar, ao diretor André Araújo e Elizabeth Temad, à jornalista Carol Ataíde e ao fotógrafo Wandeike Costa.


A história do petróleo do Brasil começa na Bahia
A história do petróleo no Brasil se mistura ao processo histórico que fala do desenvolvimento do estado da Bahia. Bom recordar que a Refinaria Landulfo Alves foi criada em 1950 e a Petrobras em 1953, por conta da pujança que o setor demonstrou com a produção em terra.

Foi na região do Recôncavo Baiano que começou, na década de 50, a produção de petróleo no país. Ali, onde hoje é o município de Candeia foi instalada em 1950, a primeira refinaria Landulfo Alves que ainda hoje é a segunda maior em capacidade de produção de cerca de 320 mil barris por dia.

A Refinaria Landulfo Alves (Rlam) produz os seguintes derivados: diesel, gasolina, querosene de aviação (QAV), asfalto, nafta petroquímica, gases petroquímicos (propano, propeno e butano), parafinas, lubrificantes, GLP, óleos combustíveis (industriais, térmicas e bunker). [2] [3]

Todas as bases operacionais de produção, escoamento (sistema de dutos),  beneficiamento e produção de energia derivada do petróleo no estado da Bahia estão previstas para serem entregues pela Petrobras para grupos privados estrangeiros.

A venda da Refinaria Landulfo Alves, localizada no município de Candeias, região metropolitana de Salvador, junto com os poços de produção localizados em terra (onshore) que alimentam a refinaria com o mix de petróleo bruto vindo da Bacia de Campos e outros lugares representa o abandono da empresa estatal da Bahia, assim como está acontecendo em quase todo o Nordeste.

O desmonte é ainda maior com a venda da rede de dutos e dos terminais portuários localizados nos municípios de Madre de Deus. Trata-se de um dos menores municípios do Brasil com 11 km². A cidade é toda recortada por uma avenida de dutos aéreos que divide boa parte da área urbana de Madre de Deus.

Mapa extraído do wikimapia com os destaques feitos pelo autor. 



















No mapa abaixo se dá o destaque à relação porto-petróleo mostrando mais detalhadamente o Terminal Almirante Alves Câmara. É possível identificar nos dois mapas como os dutos cortam e ligam os reservatórios e terminais, convivem e são partes do cotidiano da cidade. No mapa acima a malha de dutos está em vermelho.Nas fotos abaixo se tem uma melhor dimensão desta relação dos dutos com a área urbana.

Mapa extraído do wikimapia com os destaques feitos pelo autor. 


















A avenida de dutos permite a circulação dos derivados de petróleo processados na refinaria até os reservatórios localizados nos terminais portuários do município. São dois: Terminal Marítimo Almirante Alves Câmara e o Terminal da Transpetro Temadre.

Certamente, não há no país nenhum município que conviva com proximidade tão grande com as instalações de petróleo (esta mercadoria tão especial) por dentro da cidade.

Não seria nenhum exagero que o simpático município com o sagrado nome de Madre de Deus, pudesse ser considerada como uma "Dutópolis", ou uma cidade dos dutos. Ao lado e abaixo se vê  registros fotográficos do blog, que nos apontam a a convivência da área urbana com os dutos.

Para se ter uma ideia do convívio da estatal com o município, da área de 11,1 Km² do município, a estatal controla e administra 60% disto, ou seja, 6,5 Km², cabendo menos de 5 Km², para ser administrado pela prefeitura local. 

Madre de Deus tem cerca de 18 mil habitantes e em 2017 possui um orçamento anual na faixa de R$ 159 milhões, sendo que em 2016, apenas 15,8 milhões por ano foram originários com a petrorrenda dos royalties do petróleo, quando em 2014, antes da crise com a fase de baixa de preços do ciclo-petro-econômico [4], a mesma receita dos royalties do petróleo tinha atingido a cifra de R$ 47,7 milhões.

O circuito espacial do petróleo na Bahia é bem mais amplo ainda do que a localização da sede regional da Petrobras em Salvador, estas bases operacionais da refinaria (Rlam), malha de dutos e terminais portuários em Madre de Deus e no Porto de Aratu. 

Há ainda uma unidade de regaseificação que recebe o LNG importado que atende e abastece as usinas térmicas (UTEs) que atendem à cadeia do petróleo e outros empreendimentos industriais. 

Há ainda o Polo Petroquímico no vizinho município de Camaçari, onde várias indústrias químicas e a montadora Ford funciona. Mais recentemente, o Centro Industrial de Aratu que pertence ao distrito de Candeias, também se ampliou e hoje já conta com quase uma centena de empreendimentos no distrito industrial localizado no que pode ser considerado a retroárea do Porto de Aratu. 

Mapa da região metropolitana da Bahia. 
Assim, é possível depreender aí uma disputa por localização de empreendimentos com Camaçari. Outras regiões da Bahia possuem bases também ligadas à cadeia do petróleo como Itabuna que recebe por oleodutos parte do petróleo refinado na Rlam para distribuição na região sul do estado da Bahia. Trata-se de um circuito de acumulação regional.

Madre de Deus, Candeias/Aratu, Camaçari e São Francisco do Conde pertencem à região metropolitana de Salvador e se situam ao longo da Baía de Todos os Santos que possui 1.223 km², sendo três vezes maior que a Baía da Guanabara que tem uma área de 412 km². Abaixo publicamos uma base atualizada de dados dos municípios da região metropolitana de Salvador [5].

Aliás, pode-se considerar que há muitas similaridades entre as duas regiões metropolitanas: Fluminense e Salvador e suas vinculações com as atividades produtivas ligadas à cadeia do petróleo. No caso fluminense, se tem de um lado a Refinaria de Duque de Caxias e de outro, agora o Comperj e ambas as regiões possuem rede de dutos para chegada do petróleo e escoamento dos derivados.

Além disso, possuem instalações dos terminais portuários que servem de infraestrutura logística e bases para dar mobilidade à energia gerada pelo petróleo. Além disso, também possuem UTEs que transformam a energia do óleo e do gás em eletricidade, também oferecendo mobilidade à energia.

Voltando ao caso do Circuito Espacial do Petróleo na Bahia (CEP-BA) se identifica que o petróleo é ainda base importante da produção material do estado da Bahia, mesmo que ao longo do tempo suas atividades produtivas e de serviços tenha se diversificado. 

Assim, não é difícil depreender que o desmonte e a desintegração das atividades da Petrobras, ao longo da cadeia produtiva do petróleo, trará mudanças importantes para as regiões e para as comunidades que convivem com o Circuito Espacial do Petróleo da Bahia (CEP-BA). 
Voltaremos ao assunto.


Referências
[1] Histórico da Refinaria Landuldo Alves. Portal da Petrobras. Disponível em: http://www.petrobras.com.br/pt/nossas-atividades/principais-operacoes/refinarias/refinaria-landulpho-alves-rlam.htm 

[2] Matéria da jornalista Carol Ataíde (site e jornal) do Sindipetro-Bahia. Professores visitam a Bahia para pesquisar a logística local do petróleo. Disponível em: http://www.sindipetroba.org.br/2017/noticia/8295/pesquisadores-visitam-a-bahia-para--entender-a-log%C3%ADstica-local-do-petr%C3%B3leo

[3] Sobre o desmonte do setor de refino de petróleo no Brasil ler textos do blog. Em 30 mai. 2017.
Desmonte na Petrobras atinge setor de refino. Brasil exporta petróleo cru e passa a importar cada vez mais combustíveis refinados. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/05/desmonte-na-petrobras-atinge-setor-de.html. 
Em 21 jun 2017: Brasil refina menos 550 mil barris por dia de petróleo: o desmonte não disfarçado é visto com espanto em boa parte do mundo. Disponível em: http://www.robertomoraes.com.br/2017/06/brasil-refina-menos-550-mil-barris-por.html

[4] Para compreender melhor o que se refere ao ciclo petro-econômico, ver o item 1.7 (Capitulo 1), P. 95-147, "Ciclo petro-econômico" da tese de doutoramento do autor, defendida no PPFH-UERJ: “A relação transescalar e multidimensional “Petróleo-porto” como produtora de novas territorialidades”. Disponível na Rede de Pesquisa em Políticas Públicas (RPP)-UFRJ: http://www.rpp.ufrj.br/library/view/a-relacao-transescalar-e-multidimensional-petroleo-porto-como-produtora-de-novas-territorialidades

[5] Wikipedia quadro com a base atualizada de dados dos municípios da região metropolitana de Salvador. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Regi%C3%A3o_Metropolitana_de_Salvador

PS.: Atualizada às 13:42, 13:56, 14:27 e 15:30: Para acrescentar quadro sobre dados dos municípios da região metropolitana de Salvador, referência nº 3 e outros acréscimos.

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