sábado, dezembro 15, 2018

Como defender as instituições e organizar as oposições para enfrentar a revolta conservadora de Bolsonaro no Brasil

Há dois textos pulicados essa semana que possuem diagnósticos da situação política atual no Brasil que merecem, de forma resumida, uma análise. Um deles é o artigo que já citei antes do professor da Unicamp, Marcos Nobre na revista Piauí (Dezembro, 2018, Nº 147, P.24-27), cujo título é “A revolta conservadora: Bolsonaro será o líder antiestablishment”. O outro é a entrevista de Haddad, na edição do Valor (12 dez. 2018, P. A10. Com as jornalistas Maria Cristina Fernandes e Malu Delgado), cujo título é: “Núcleo político de Bolsonaro é de tutela e intimidação: ex-candidato do PT diz que será mais fácil resistir à agenda de costumes que à econômica”.

Os dois textos reproduzem análises. Haddad sintetiza, aparentemente, mais como analista do que como líder político que “as perspectivas do governo Bolsonaro se organizam a partir de três núcleos centrais: o fundamentalista (coeso, com forte carga conservadora e ideológica); o econômico (escancaradamente liberal); e o político formado pelo Ministério da Justiça e pelos militares. E termina afirmando que será o núcleo político que dará o tom do novo governo com dias possíveis tarefas: tutela e intimidação”.

Em resumo, como na campanha, duas redes (segurança-força e igrejas) para liberar o mercado com a economia ultraliberal do posto Ipiranga, shell, esso, etc.

Já o artigo do Nobre critica o que chama de “paralisia atual da futura oposição, que considera Bolsonaro tosco, bruto... zomba da sua precariedade... e de que tem certeza de que ele não é capaz de reorganizar o sistema e nem de produzir um governo funcional”. Nobre diz ainda que “todas as forças de oposição teriam de se unir na defesa das instituições democráticas, ao mesmo tempo que teriam de chegar a uma proposta conjunta de reforma das instituições. Uma concertação democrática para defender as instituições indefensáveis na sua forma atual e propor uma renovação radical dessas mesmas instituições. Cada força política de oposição teria que ter garantir o espaço de fazer oposição à sua maneira e como bem entender, ao mesmo tempo que se perfilaria ao lado de todas as outras formas de defesa das instituições democráticas e de sua reforma. Quem pretende manter vivo o jogo democrático precisa colocar todas as suas forças em separar as duas coisas na batalha da opinião pública. Precisa convencer que o sistema político tal como funcionou até 2014 não é a única maneira de um sistema político funcionar, não é a única forma que a democracia poder ter”.

Nobre faz esse tipo de proposta, que parece, ao contrário de Haddad, a de um líder político que propõe, indo além da análise e de um diagnóstico.

E faz isso, num diagnóstico que parte, de certa forma, da mesma leitura do Haddad, mas talvez seja um pouco mais claro e por isso também parece ter mais facilidade na formulação de uma proposta de oposição.

Nobre interpreta que “Bolsonaro faz parte de um projeto de pretensões globais de construção de uma nova era internacional conservadora. O presidente eleito se alinha às novas direitas (e são muitas) que tomam como norte governos como os do Chile, EUA, Itália e da Hungria... a tática geral é simples. Não há pretensão de governar para todo mundo. Esse discurso e essa prática seriam típicos do velho mundo da velha política, que era pura enganação. Trata-se, agora, de governar para uma base social e eleitoral que não é maioria, mas que é grande o suficiente para sustentar um governo. Algo entre 30% e 40% do eleitorado. Tornar essa base fiel é fundamental para manter o poder. EM momentos críticos, como, por exemplo, as disputas eleitorais, a tática consiste em produzir inimigos odientos o suficiente para conseguir uma ampliação forçada dessa base e assim conquistar a maioria.”

Para Nobre, Bolsonaro como político de extrema direita não quer caber nas instituições e pretende se afirmar como antissistema atribuindo o sistema à esquerda, ao Estado e ao PT como sendo tudo de ruim para a vida das pessoas. Para parecer antissistema ele terceirizou a equipe ministerial, numa espécie de feudalização de responsabilidades, a quem possa trocar, conforme os resultados e assim ir ganhando tempo. Bolsonaro “colou pecha de “sistema” em tudo que não é ele, em todo mundo que não está a seu lado. O tempo é de paradoxos. O capitão-presidente vai se identificar como antissistema e ao mesmo tempo será governo. Fará um governo antiestablishment e tudo que se opuser ao seu governo será “sistema”, “velha política... se a “velha política votar com ele, não terá feito mais que obrigação. Se não votar, enfim, será a prova de que continuam os mesmos velhacos de sempre”.

Esse diagnóstico de Marcos Nobre explica como disse acima a sua proposta de coalizão das oposições mantendo os espaços de cada um. Porém, Nobre identifica dificuldades nas tarefas da oposição ao esquema Bolsonaro.

Assim, as oposições necessitariam, na opinião de Nobre, defender as instituições, mas aparecerem como reformadoras do sistema, o que é complexo diante do quadro em que o capitão faz política negando a mesma. Dessa forma, as oposições precisariam superar a armadilha do esquema Bolsonaro de forma a não oferecer, pelas vias transversas, ao novo governo, ferramentas que o permitam se manter forte e por cima das instituições, mesmo com resultados pífios de gestão que seria a tendência diante da falta de propostas e de capacidades de gestão que se apresentam até aqui.

Ou seja, as oposições precisam de instituições fortalecidas e Bolsonaro tenderá a se manter à revelia delas – que foi o que o elegeu -, para continuar a aparecer antissistema e assim se manter no poder e até, conforme também a realidade do mundo e outras nações, se reeleger para aprofundar a revolução conservadora.

Enfim, as duas matérias ajudam a pensar a conjuntura numa perspectiva de atuação entre análises e propostas. Uma boa análise de conjuntura é fundamental para organizar propostas que possam superar a anomia atual das oposições, restrita hoje, quase que somente ao combate ao falso moralismo do esquema de grana da família Bolsonaro. Só a inversão da lógica superará o conservadorismo com ou sem os bolsonaros no Brasil.

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