segunda-feira, maio 18, 2020

Cenários sombrios do crepúsculo do capital, por Douglas da Mata

Douglas da Mata traz uma boa análise sobre o cenário geopolítico de confrontação em que vivemos com riscos de explosão. O texto está no seu perfil do FB e é parte do que ele vem chamando do seu Diário da pandemia. Vale conferir!


Cenários sombrios do crepúsculo do capital

Há uma estranha simbiose entre a narrativa produzida pela fábrica de boatos (hoje mais um item "gourmetizado", chamado de "fake news"), o desenrolar das mudanças dos arranjos territoriais e financeiros do capital, e seus cenários políticos correspondentes, o que Marx chamava de superestrutura.

Olhados de maneira isolada, raramente percebemos a sinergia entre eles, e comumente percebe-se apenas os ruídos desse deslocamento de "placas tectônicas" do capital, que ruma para o inevitável "BIG 01", o grande abalo sísmico que está previsto para a região da falha (geológica) de San Andreas.

Esse terremoto teria proporções para separar parte da Califórnia, onde está a mega cidade de Los Angeles, transformando aquela península em ilha.

Chamo atenção aos sinais de que as "placas tectônicas" do capital rumam para um BIG ONE:

Quando um jornal como O Dia, que não é lá um veículo de densidade na abordagem de qualquer tema, assemelhando-se mais a um tabloide, traz notícia de que a China recomendou suas empresas de processamento e importação de grãos (leia-se, soja, dentre outras)a iniciar um processo de estocagem e provisão, algo soa muito estranho, e muito mais estranho é que ninguém se apavore com isso.

Ao mesmo tempo, Fiori (José Luiz) nos alerta, em veículo um pouco mais sério (blog do Nassif) que há uma escalada de gastos militares em andamento.

Vamos juntar as pontas.

A História não se repete, isso é óbvio.

Mas de tempos em tempos há eventos que guardam similaridade entre si, como se experimentássemos versões ampliadas e mais dramáticas, a partir de encadeamentos que sugerem um "método".

Todos os grandes conflitos globais, ou todas as grandes crises, sejam as econômicas e/ou sanitárias (quase sempre andam juntas) que os precederam, tiveram como apoio narrativo aquilo que eu chamo de "recrudescimento da racionalidade".

Crises econômicas sempre estão associadas, umas mais outras menos, ao abandono das soluções chamadas "racionais", e o apego quase que hegemônico das soluções do campo da "superstição", e quando eu falo de "superstição" não indico somente a questão religiosa, strictu sensu, mas a elevação, ou melhor dizendo, o rebaixamento da ciência ao nível comum da especulação.

Esse é um pilar fundamental na escalada de violência na Humanidade e sua História.

Não é por acaso que isso acontece.

Periodicamente, a História novamente nos ensina que os sistemas econômicos quando colapsam empurram as sociedades a um tipo de saída "evolucionista", grandes banhos de sangue destinados a "rearrumar" os canais institucionais que assentam aquele modo de produção em suas interfaces com tais sociedades.

Dentro dos limites dos países, há vários exemplos.

O esgotamento do modo escravagista e o acirramento com o modelo salarial industrializado que nascia, levou a um conflito devastador nos EUA, no fim do século XIX, A Guerra de Secessão.

A incapacidade da Rússia dos Romanov de deixar para trás os arranjos absolutistas e feudais, e a constante necessidade de participar das disputas hegemônicas entre as grandes potências capitalistas do início do século XX, levaram ao colapso e a Revolução de Outubro de 1917, dentre tantos outros motivos.

Processo parecido com o chinês.

Voltando ao eixo principal, é preciso estar alerta aos movimentos, embora essa atenção não sejam suficientes para cessar essa dinâmica.

Parece claro que uma grande parte do mundo escolheu, e a outra parte parece ignorar, o esgarçamento e abandono do que chamamos de processo civilizatório, compreendido como a capacidade de manter os conflitos políticos dentro de regras institucionalizadas pré-estabelecidas.

O que o governo do Bozo sinaliza é o constante desafio a qualquer lógica e bom senso, mas isso não é uma manifestação de loucura ou falta de inteligência, mas sim um ato deliberado, que se destina a provocar rupturas nas estruturas institucionais, até que elas não aguentem mais o próprio peso.

E por que isso?

É só um delírio de poder absoluto, advindo da concentração que deriva do caos?

É mais que isso.

O capital como modo de produção organizador das sociedades, na medida que ao longo de seu processo de acumulação histórica, quando nenhum outro modelo provocou tantas mudanças e nunca gerou tanta riqueza em tão pouco tempo, reificou TODAS as formas de relação humana e interpessoais.

Se colapso (do capital) traz a certeza, para aqueles que se preparam para o pós-capitalismo (os donos do capital), que os chamados sistemas de representação política, legislativos e judiciários não mais serão capazes de manter as hordas de expurgados dentro daquilo que eu chamo de "resiliência estrutural" (Marx chamava de alienação), bem como não serão mais capazes de garantir ao capital formas seguras de reprodução, principalmente na era de transição pós-capitalismo.

Nas periferias do capital, como sempre, esse processo é sempre muito mais violento e dramático, e daí a presença de déspotas como o Bozo, e a tentativa de colocar na direção dos países periféricos aqueles que aceitem essa "solução final".

Com eles (os Bozos), sem exceção, a aposta na piora e no genocídio econômico das populações, esperando que elas se lancem ao fratricídio, e que os aceitem como solução um Deus Ex Machina.

Um exemplo?

A aberração que representam as "carreatas" contra o isolamento, quando ricos e classes médias vociferam nas ruas que pobres retornem ao trabalho e ao risco de morte por contaminação.
Tal postura demonstra claramente que está em curso uma nova forma de organização social e econômica, onde os expurgados de qualquer vínculo com o mundo formal do trabalho (que aliás, se extingue irreversivelmente) serão jogados aos "leões" em nome da sobrevivência mais elementar.

Esse modelo se sustenta na economia GIG (dos aplicativos), que transforma as relações de produção conhecidas em plataformas de intermediações de serviços, onde a conhecida concorrência é elevada a antropofagia digitalizada.

Sob o manto da falácia do empreendedorismo individual, temos uma nova horda de "predadores", dispostas a devorar seus "concorrentes", e assim teremos "empreendadores".

Já no campo externo, da geopolítica, assistimos, como em outras épocas, a destruição paulatina da diplomacia, que dá lugar a violação sistemática dos princípios de coexistência.

Isso não quer dizer que a diplomacia fosse coisa de anjos, mas há uma sensível diferença entre o uso da diplomacia na defesa soberana de interesses, mas com viés de alguma preservação, e o que assistimos hoje.

Os acenos recentes indicam que a China se prepara para algo mais que as guerras tecnológicas e comerciais com os EEUU.

Não há o mais leve indício de que as potências envolvidas no Oriente Médio agora sequer finjam que desejam a estabilização naquele enclave.

Emoldurando todo esse quadro, as atuais guerras sanitárias e biológicas.

Enfim, preparemo-nos para o fim do mundo como o conhecemos.

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