segunda-feira, maio 04, 2020

"A encruzinhada e o humanitarismo", por Douglas da Mata

O blog reproduz o ótimo texto do Douglas Barreto da Mata, como parte da série de postagens que chamou de "Diário da pandemia".  A arte é por conta do blog, não identifiquei sua autoria.


A encruzilhada e o humanitarismo

Confesso o extremo desconforto que senti ao ver Lula e Dilma ombro a ombro com fhc e outros golpistas (ainda que indiretos, como ciro, o canalha) nos atos digitais de Primeiro de Maio.

Deu voltas no estômago.

Vociferei impropérios, como já de costume.

Disse em alto e bom som: que se fodam, foram golpeados com ajuda desses micróbios políticos, e mesmo assim ainda têm tolerância para reunirem-se a eles.

Também confesso que não pude deixar de comemorar, com certa (grande) alegria, o fato dos lacaios das empresa de comunicação estarem sob ataque das milícias bolso-moristas, que por ora se dizem rivais.

Passada a indignação com Lula e Dilma, e o regojizo com as "pedaladas fascistas" sofridas pelos porcalistas, me vejo em uma armadilha.

Sim, esse é o eterno paradoxo da chamada democracia.

Como defender o direito democrático daqueles que atacam-na, como fazem a mídia e seus lacaios?

Como entender que Lula e Dilma possam, em nome do resgate democrático, se unirem àqueles que empregaram toda sorte de ações e omissões para golpear um governo legítimo, e que respeitava os limites constitucionais do Estado de Direito?

A questão é complexa, mas as escolhas parecem óbvias.

Não construiremos, não no curto e médio prazo, um alternativa política de força que faça o fascismo jurídico-militar-bolso-morista retornar às suas cavernas, de onde foram desentocados e alimentados pelo ressentimento político de setores que hoje choram pitangas, como fhc, ciro, psol, mídia, etc.

Notem que mesmo em meio a esse furacão, esses cretinos, que deram azo ao asno que ocupa a presidência, se negam ao reconhecimento e retratação de seus equívocos políticos (ou escolhas, melhor dizendo) frente a nação brasileira, e agem como se nada tivessem a ver com esse desfecho trágico que se aproxima.

No entanto, essa constatação de que temos como "aliados" uma corja de cretinos não nos leva a nada, senão ao imobilismo do ressentimento, que por sua vez aumenta o ressentimento do imobilismo.

É preciso reunir todas as forças políticas para soterrar esse movimento político internacional, preparando as sociedades para o enfrentamento de tempos sinistros do pós-capitalismo que vem por aí, onde as pessoas serão meros objetos de avaliação algorítmica.

A raça humana, como a conhecemos, está sim em extinção.

Eu sempre me perguntei o que fazia uma pessoa como Dilma (nesse caso muito mais que Lula, que nunca foi vítima de tortura) passar por tudo que passou, e agir democraticamente, sentando ao lado de seus algozes no jogo político-institucional.

Ela que, tempos atrás, se arriscara na luta armada. O que move uma mulher como essa, que depois de chegar ao topo de sua carreira política como presidenta, caiu como vítima de violências verbais indizíveis?

Acho, vejam bem, só acho:
Talvez a sua vivência e o fato de ter experimentado a falta de opção que a levou a clandestinidade, bem como todo sofrimento ali encarnado, tenham construído uma fé inabalável que não podemos levar a experiência humana a pontos de não retorno, de falta de perspectiva que faça a violência ser a única mediadora.

Talvez seja essa a "religião" de Dilmas e de Lulas, a "religião do humanitarismo".

Me senti envergonhado, porque afinal nunca experimentei (e nem quero) situações tão precárias e tão limítrofes em minha vida, que pudessem orientar meus sentidos em escolhas em momentos de tamanha envergadura histórica.

Só me resta então confiar nesse "instinto racional" de sobrevivência (física e política) desenvolvido por eles.

Torço para estar errado, e que eles tenham razão.

Todos contra o fascismo!

Todos contra o capitão da morte!

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