sábado, dezembro 18, 2010

As mudanças políticas que as transformações da comunicação não param de gerar

Enquanto um bobo tenta distrair sua plateia com a ideia de que o importante é o furo da informação, aqui ou acolá, que dura alguns segundos ou minutos e são imediatmente superados por fatos novos, complementando ou substituindo o anterior, numa estrutura formal ou informal de rede, a discussão que mais interessa e vai sendo deixada de lado, não a propósito, é que a livre comunicação vai deixando à margem aqueles que ganhavam dinheiro filtrando as informações que lhe interessavam, num processo de cafetinagem de seus interesses econômicos e sociais. As redes cibernéticas acabam com tudo isto, mesmo que alguns tentem criar as suas redes penduradas em próprias coleiras. O entendimento mais profundo de todo este imbróglio em parte é apresentado na coluna de hoje, do Merval Pereira, em O Globo que o blog transcreve abaixo: "Novas relações de poder" Merval Pereira O ponto central dos estudos do sociólogo Manuel Castells, professor da Universidade Southern California, sempre foram as relações de poder. No seu novo livro, “Comunicação e poder”, ele chega à conclusão de que as redes de comunicação social mudam a lógica do poder na sociedade atual, e já não se pode fazer política se não se levam em conta a crescente autonomia e o dinamismo da sociedade, utilizando a desintermediação dos meios de comunicação. Com o caso WikiLeaks em plena evolução, provocando discussões sobre o papel dos novos meios de comunicação, o livro de Castells torna-se fundamental para entender o que se passa. Ele ensina que, como as redes organizam o mundo das finanças, da produção, da comunicação, da política, das relações interpessoais, só uma teoria que parta da relação nessas redes de poder pode chegar a entender a prática social e política da sociedade atual. “Cheguei à conclusão de que o poder era fundamentalmente o hábito da comunicação e necessitava entender a transformação da comunicação para entender a transformação do poder”, disse ele em recente palestra no Instituto Fernando Henrique Cardoso. Ele revelou que, durante seus estudos de neurociência para o livro, teve acesso a trabalhos que indicam que as pessoas não buscam informações para se informar, mas, sim, para confirmar o que já pensam. E também que o medo é a emoção primária fundamental, a mais importante de nossa vida a influenciar as informações que alguém recebe. Escrevendo sobre o episódio WikiLeaks para o jornal espanhol “La Vanguardia”, artigo que já citei em coluna passada, Castells afirma que a ciberguerra começou. “Não uma ciberguerra entre Estados como se esperava, mas entre os Estados e a sociedade civil internauta.” Para ele, não está em jogo a segurança dos Estados, pois considera que nada do revelado põe em perigo a paz mundial, nem era ignorado nos círculos de poder. O que se debate, segundo ele, é o direito do cidadão de saber o que fazem e pensam seus governantes. E a liberdade de informação nas novas condições da era da internet. Castells cita um comentário da secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, em janeiro deste ano: “A internet é a infraestrutura icônica da nossa era… Como acontecia com as ditaduras do passado, há governos que se voltam contra os que pensam de forma independente usando esses instrumentos.” E questiona: “Agora (depois dos vazamentos do WikiLeaks que colocaram a diplomacia americana em polvorosa) ela aplica a si mesma essa reflexão?” Castells diz que a questão fundamental é que os governos podem espionar, legal ou ilegalmente, os seus cidadãos, mas os cidadãos não têm direito à informação sobre aqueles que atuam em seu nome, a não ser na versão censurada que os governos constroem. Nesse grande debate, diz ele, vai se ver quem realmente são as empresas de internet autoproclamadas plataformas de livre comunicação e os meios de comunicação tradicionais tão zelosos de sua própria liberdade. Para Rosental Calmon Alves, professor brasileiro da Universidade do Texas, em Austin, especializado em novas mídias, o caso é muito mais complexo do que parece, pois “marca o início de uma nova era”. Ele historia: vivemos em uma sociedade calcada em bases de dados. Nossos rastros digitais vão sendo deixados por toda parte, armazenados em computadores e vão desde as imagens capturadas pelas câmeras que se espalham pelas ruas, pelos nossos locais de trabalho, pelos elevadores, por todas as partes nas cidades mais modernas, até mesmo os documentos oficiais que se criam aos milhões e milhões em todos os governos do mundo. Guardar todos esses dados em segredo torna-se um desafio cada vez mais difícil. E, quando há um vazamento, o volume de dados pode ser tão imenso quanto os desses últimos atraídos pelo WikiLeaks. Segundo Rosental, são muitos os desafios novos para os governos e as corporações, que tentam erguer defesas e criar fortalezas cibernéticas. “Não foi à toa que o presidente Obama criou um comando militar cibernético e toda uma assessoria de segurança nacional nesta área”, lembra. Fala-se abertamente de uma futura guerra cibernética mundial. Nunca mais “o mundo não será o mesmo”. E Rosental teme que muitas coisas poderão piorar, como o surgimento de leis mais estritas nos Estados Unidos sobre a publicação de segredos, “que podem afetar liberdades essenciais que estão nas bases da democracia americana”. Rosental lembra que essas liberdades “ajudam nos pesos e contrapesos (checks and balances) que fazem o sistema democrático funcionar mais eficientemente aqui que em outros lugares”. Os funcionários aqui, destaca Rosental, sabem que trabalham num ambiente relativamente aberto, que suas ações, mesmo quando secretas, serão públicas um dia, por motivos históricos ou porque algum cidadão pediu satisfações. “O funcionário sabe que trabalha para o publico e não para o governo”. Mas o problema é que os vazamentos mostram que qualquer coisa pode se tornar pública a qualquer momento, quase de imediato e de forma anônima. Como parte deste contexto, as reações exacerbadas chegam a ponto de haver políticos republicanos que falam até mesmo de uma “necessidade” de matar Julian Assange (criador do WikiLeaks), até da formulação de um processo contra o WikiLeaks, o que, na opinião de Rosental, “seria um precedente extremamente daninho para a liberdade de expressão no país e no mundo. “Tomara que os mais exaltados se acalmem e que a democracia americana saiba responder aos desafios criados por esta situação, sem abrir mão de seus princípios mais fundamentais”, espera Rosental Calmon Alves

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