domingo, maio 18, 2025

Geoeconomia e geopolítica num mundo em várias transições: Do Big Oil para as Big Techs com a intermediação do Big Money

Os EUA parecem ter escolhido o Golfo (Oriente Médio) como primeira opção para avançar na disputa contra a China deixando de lado ou passando por cima de outros antigos aliados. Na primeira viagem internacional de Trump mais sua trupe (desculpe o fraco trocadilho) de CEOs das Big Techs e Big Funds, foram em busca dos países árabes com seus trilionários/bilionários fundos soberanos que estão ansiosos pelos chips avançados, pelo poder computacional e tecnologia de IA das Big Techs americanas.

Nessa articulação em que um desconfia do outro, os EUA parecem querer ir além do acordo com os Emirados Árabes Unidos Arábia Saudita e o Qatar indo até uma negociação com o Irã, suspendendo sua sanção, para tentar afastá-lo da estruturada aliança estratégica com a China, com o sonho de voltar a ter a maioria do Golfo como seu quintal, talvez, mais até que a América Latina.

Os países árabes, em especial Emirados Árabes Unidos, usam sua vantagem comparativa de terem excedentes (riqueza) do petróleo em abundância para chegar aos chips da TSMC de tecnologia americana. Possuem, além de capital, energia e terra em abundância para as instalações de infraestrutura digital, em especial os datacenters.

As nações do Golfo almejam um salto, das petroleiras do Big Oil para as Big Techs, intermediadas pelo Big Money dos fundos.

Aparentemente, elas estão mais adiantadas do que se imagina e não dependem só dos EUA. Já montaram várias empresas e startups, além de terem instituído cursos e universidades com centro de
pesquisas em IA já com modelos de linguagem de código aberto, além de fundos setoriais (empresa de investimento em IA) para desenvolvimento de semicondutores com ativos superiores a US$ 100 bilhões.

Pelo menos, duas dessas nações do mundo árabe (AS e EAU) estão desenvolvendo políticas amplas de desenvolvimento digital e IA e já está buscando acordos com as fabricantes de chips com a TSMC de Taiwan e a coreana Samsung e também mantém conversas com as grandes corporações de tecnologia da China.

Enganam-se aqueles que imaginam que esses dois países do Golfo estão se organizando e investindo pesado e com tanto dinheiro das reservas acumuladas, apenas para se manterem como consumidoras de tecnologia digital e IA na lógica do colonialismo de dados.

Os EUA temem que microprocessadores com suas tecnologias instalados no Golfo possam também servir ao desenvolvimento das companhias chinesas de tecnologia, como forma destas, contornarem os controles de exportação dos EUA, enquanto, simultaneamente, avança e acelera sua própria fabricação de nanochips.

Porém, algumas Big Techs dos EUA, mesmo antes desses acordos firmados por Trump nessa semana nos três países do Golfo, já estavam com negócios avançados, como nos casos da Microsoft junto com a OpenAI e a IA Groq do grupo do Musk em acordo com a petroleira saudita Aramco.

Não está claro se as nações do Golfo buscam soberania cibernética com seus investimentos no desenvolvimento de pessoal, tecnologia e com os seus trunfos de capital e energia, ou se já decidiram retornar ao abrigo dos americanos. Já esses, com o império em declínio, dependem dos petrodólares dos fundos soberanos árabes para avançar na fronteira tecnológica digital que nesse atual momento tem demanda muito intensiva em capital que os americanos não possuem em quantidade suficiente. Parece haver um grau de aposta para afastar as nações árabes da Ásia Ocidental (OM) da influência dos Brics, da ASEAN e, em especial, da China com sua Iniciativa do Cinturão e nova Rota da Seda. Porém, não se deve esquecer que a China a maior importadora do petróleo do Golfo.

De outro lado, em outros tempos, os EUA não corriam riscos e nem faziam apostas, apenas decidiam por cima das nações e até da ONU. Nada garante que os países do Golfo sigam buscando acordos múltiplos numa linha de seguir mais em busca de soberania do que de dependência. 

A IA ainda está no início e pode levar a rumos e avanços em áreas e a conflitos que podem envolver as instalações dessas infraestruturas e a novos acordos que podem realinhar essas posições em termos geopolíticos. É uma dinâmica muito acelerada e de riscos em várias dimensões e escalas.  

No mesmo período, o Brasil, a CELAC e a China fizeram outros acordos baseados em infraestrutura e industrialização, mesmo que nem todos os países da AL tenham se comprometido com a nova Rota da Seda chinesa. Os EUA não se manifestaram sobre isso e não se sabe se terá interesse, para além de alguma retórica, para exigir um lá ou cá. 

Acordos e termos de compromisso podem avançar ou serem paralisados. Não duvidem que os EUA se acertem com o Irã e limite as ações de Israel, embora, hoje, algumas de suas Big Techs sejam parceiras do genocídio em Gaza.

O que é certo é que as nações precisam ter bastante claro suas estratégias e para onde querem ir. A opção pela multilateralidade parece clara, embora, cada nação tenha mais facilidade em avançar com quem já é parceiro comercial.

Não vou me estender, além disso, mas creio que todos já tenham percebido que há muitos e fortes movimentos em curso na geoeconomia e geopolítica globais que estão transformando o mundo e suas relações. 

São várias transições simultâneas, muito para além da tão falada transição energética com redução do uso dos combustíveis fósseis. Aliás, é com boa parte da riqueza do petróleo e seus excedentes que novos passos estão sendo buscados, o big oil lubrifica as big techs intermediados pelo big money no capitalismo contemporâneo de hegemonia financeira.