Atualmente, oito em cada dez bancos no Brasil, já usam IA generativa em suas operações, onde essa ferramenta desempenha um papel que deve ser interpretado como estratégico.
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Pesquisa Febraban Tecnologia Bancária - Slide 15/53. |
Os usos da GenAI no setor bancário são os mais diversos,
como pode ser visto no quadro ao lado extraído da pesquisa da Febraban sobre
tecnologia bancária. Desde o atendimento ao cliente em substituição ou
complemento ao gerente de conta, desenvolvimento de novos sistemas, marketing,
comunicação, segurança, etc.
Esse é apenas um simples exemplo empírico da investigação que venho desenvolvendo sobre os elementos que comprovariam a intensa relação e o imbricamento do setor financeiro com as plataformas
digitais (para além do financiamento). A hipótese é que o setor financeiro (e bancário) é o precursor da chamada "transformação digital" que nos dias atuais já se espalhou para a maioria dos demais setores.
Mesmo com o gigantismo das corporações de tecnologia (Big
Techs), reafirmo, com base também no caso empírico brasileiro, o que afirma o
amigo pesquisador, Edmilson Paraná, em um de seus artigos: “todos os movimentos
saem de Wall Street para o Vale do Silício e não o contrário”.
Sim, trata-se de um fenômeno que é global, mas não se pode desconsiderar que o Brasil possui uma história singular e importante nessa área, na medida em que o setor financeiro nacional, por muito
tempo serviu de exemplo e ainda hoje é referência para outros países naquilo que há quase quatro décadas se chamou de “informatização bancária”.
A evolução (linha do
tempo) da informatização/digitalização do setor financeiro no Brasil
A informatização bancária é um movimento que no Brasil vem desde a década de 80, quando vai para além dos centros de processamento de cheques dos bancos e chega ao lançamento do 1º caixa
eletrônico. Na década de 1990, tem-se a emissão dos primeiros boletos; em 1995 a implantação do Internet Banking, depois os aplicativos, as fintechs ... até chegar ao Pix, lançado em novembro de 2020, pelo Banco Central, que em maio de 2025, já tinha chegado ao colossal número de 175,4 milhões usuários, sendo 160 milhões de usuários de Pessoas Físicas (CPF) e 15,4 milhões de Pessoas Jurídicas (CNPJ.
No Brasil, o Mobile Banking, com uso dos celulares para relacionamentos e transações financeiras, já abrange quase a totalidade dos incluídos no sistema bancário. Segundo a mesma pesquisa, 90% das transações já são feitas por plataformas móveis, num quantitativo que soma a mais de 200 bilhões de transações, não apenas no Pix, embora esse seja maioria, com recorde diário de 191 mil transações por minuto segundo o Banco Central, número bem superior às transações dos cartões, embora parte delas em Pix feitos com QR Code das maquininhas. Nenhum outro setor da economia vive tão intensa
transformação digital quanto o setor financeiro. Nem no Brasil e mesmo no
mundo.
Esse uso intenso dos mecanismos móveis dos celulares e aplicativos não acontecem só com os bancos, mas com todas as empresas do setor financeiro, incluindo as gestoras e administradoras de fundos de todos os tipos e tamanhos.
Grandes fundos não operam decisões sem análises de riscos e/ou modelagem com uso digital e de IA para analisar performance de empresas onde buscam participações em ações, ou ainda em suas análises preditivas de câmbio e juros. O gigante fundo americano BlackRock trabalha, a nível global, com a sua plataforma Aladdin na administração do inigualável patrimônio de US$ 12,5 trilhões, superior ao PIB de maioria das nações do planeta.
Uso crescente e
ampliado da tecnologia digital nas finanças
Nesse processo de intensificação do uso das tecnologias
digitais, a implementação da IA nos bancos e setor financeiro como um todo, estão
avançando enormemente com o uso de redes neurais, aprendizado de máquina,
biometria, tratamento e análise de dados, chatboots, robôs, etc. Eles servem
entre outras coisas para análise de riscos, detecção de fraudes,
cibersegurança, hiperpersonalização de ofertas de negócios financeiros,
seguros, etc.
Assim, é possível intuir que a utilização mais intensa da
Inteligência Artificial (IA) no setor financeiro - e ainda da IA generativa
(GenAI) - parece nos oferecer pistas sobre como essa nova tecnologia digital da
IA que usa intensivamente dados, algoritmos, aprendizado profundo de máquinas e
as estatísticas para interpretar situações no setor financeiro, podem estar
dirigindo os caminhos também para a indústria, comércio e os vários tipos de
serviços digitalizados que observamos.
Nessa linha, a interpretação é que a relação imbricada entre
tecnologia e finanças vai muito para além do simples financiamento e do
controle sobre creditício e acionário de um setor sobre o outro. Na verdade, esse
movimento das finanças para a tecnologia e desta para todos os demais setores
em que essas duas frentes atuam de forma transversal e na maior parte do tempo
de forma livre e desregulamentada.
A questão não é o uso
da digitalização, mas a direção, o controle e quem são os ganhadores ou
perdedores
Observando o processo histórico dessa relação no Brasil e no
mundo, qualquer um pode identificar, que a tecnologia não é o problema per si. Esse
desenvolvimento tecnológico trouxe vantagens e desvantagens. Trouxe empregos e desempregos,
embora em diferentes setores. Produz continuidades e descontinuidades. Trouxe
comodidades e mudanças na forma como vivemos, aprendemos, realizamos compras,
contratamos e somos atendidos nos serviços, pagamos as contas e interagimos
socialmente em comunidades etc. O grande problema é saber a quê e a quem tudo isso
serve? Saber principalmente quem mais ganha com todos esses avanços que tem concentrado
mais renda e ampliado ainda mais as desigualdades.
Por tudo isso, entender onde tem origem esse processo e como
se desenrola parece um diagnóstico importante a ser destrinchado, num momento
em que todos nós já descobrimos a importância dos nossos dados, não apenas para
a nossa privacidade, mas também para ganhos em escalas de poucas corporações que
se tornam gigantes no centro do capitalismo.
Os chineses compreenderam e expuseram no seu Plano IA+ que
os dados devem ser vistos como fator de produção e estarem a serviço do
coletivo e do comum, além de servir para impulsionar
a transformação digital e a modernização econômica. Porém, transpor esse
princípio para a prática é algo mais complicado e exige outras dimensões de
intervenção.
Temos visto esse problema, que, na verdade, se trata de um dilema,
em todo o mundo. Praticamente todos os países do Ocidente sofrem hoje uma potente
e reacionária onda e pressão contra seus Estados, ao entenderem ser
indispensável a definição e o estabelecimento de marcos legais e regulatórios com
regras sobre a tecnologia digital e sobre o uso das plataformas de todos os
tipos desde o convívio entre pessoas, negócios e as relações de poder.
Diante desse quadro, penso junto com muitos outros que da
mesma forma que lutamos no passado para que, paulatinamente, pudéssemos garantir
os direitos sociais mínimos, desde o trabalho diário, hoje, não será sem luta
que os direitos digitais serão também garantidos para além da privacidade dos nossos
dados.
O objetivo deve ser evitar a ampliação ainda maior da já
colossal concentração de renda e as ameaças do neofascismo e da barbárie e em
defesa de relações mais humanas, solidárias e de uma vida sobre o prisma da
coletividade e do comum.
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