quarta-feira, julho 23, 2025

Altos ganhos feitos por robôs nos negócios de câmbio no dia do tarifaço expõe infraestrutura de IA no mercado financeiro: Big Techs alimentando o Big Money!

A notícia do Valor/O Globo (22/07/2025) [1] que o Banco Central constatou o uso de robôs nos ganhos com negócios com dólar no mercado financeiro, quando do anúncio do tarifaço de Trump contra o Brasil, traz indícios de ser ainda mais grave a questão original da realização deste lucro especulativo.

Essa constatação demonstra e confirma como os robôs e algoritmos com uso de IA respondem às plataformas financeiras que operam no mercado sem identificação ou controle, usando mecanismos tipo máscaras (disfarces) de seus movimentos.

Disputas no mercado com plataformas automáticas com uso de IA com tal capacidade de processamento e modelagem, confirmam a assimetria que está na base da hegemonia financeira no capitalismo contemporâneo.

Imaginem a desvantagem de pequenos aplicadores do mercado de capitais contra esses gigantes do Big Money que operam com enormes maquinários computacionais, fazendo leituras online no espaço global sobre os movimentos de todos os investidores. Um tipo de rentismo chamado de financeirização 2.0.

Na prática se confirma a IA operando na atualidade como infraestrutura financeira na realização de ganhos no mercado financeiro [2].

Uma forma similar aos que outras tecnologias fizeram no passado, porém, agora de uma forma muito singular e intensa, considerando a colossal captura de dados financeiros de pessoas e companhias com a hiperpersonalização e microssegmentação dos mesmos, modelando movimentos operados automaticamente por robôs.

Datacenters ou Big Datas capturam dados, armazenam em nuvens (clouds) que funcionam como infraestruturas digitais para seu processamento com enormes capacidades computacionais.

Com uso do treinamento de máquinas esses dados servem aos algoritmos, programados passo a passo, para a definição de regras para a tomada de decisões automáticas realizadas por robôs com o objetivo de realizar altíssimos ganhos. São movimentos de manada em curtos espaços de tempo que só a IA e suas máquinas têm condições de realizar.

Grandes gestoras de fundos financeiros, como o BlackRock, possuem potentes plataformas que trabalham com modelagens que operam automaticamente no mercado a partir de dados e direções dadas aos seus algoritmos. Esse caso empírico também reforça o conceito de assetização (transformação de tudo em ativos). [3]

O fato reforça também as desconfianças com relação à participação direta ou indireta das Big Techs como plataformas de intermediação destes negócios, assim como a profunda vinculação e interconexão entre financeirização, rentismo e plataformização.

Esse novo caso permite mais uma leitura sobre o profundo nexo entre tecnologias e finanças com uso das plataformas digitais como infraestruturas que lubrificam, dão fluidez e concentram o capital nas mãos do Big Money. Big Techs como tecnologia e infraestruturas do Big Money que dirige esse processo.

O fato da operação de câmbio originada pela oportunidade do tarifaço ter sido realizada por robôs e plataformas financeiras, não invalida a hipótese de originalmente alguém ter recebido a informação e operado no sistema (informação privilegiada "insider trading"), em que os robôs podem ter servido para esconder e embaralhar autores, ampliando a escala dos ganhos e não impede que se chegue aos seus controladora e autores da operação. Basta seguir a investigação. Follow the Money! (Siga o dinheiro)!

PS.: Atualizado às 12:20: Para breve acréscimo.


Notas:
[1] Reportagem Agência o Globo/Valor em 22 jul. 2025. Técnicos do BC identificam operações com dólar pulverizadas e feitas por robôs antes de anúncio de ‘tarifaço’ - Levantamento inicial apontou movimentação vultosa de compra e venda de dólares no mercado de câmbio americano após Trump ter sinalizado, antes do anúncio oficial, que o Brasil poderia ser taxado. Disponível em: https://valor.globo.com/financas/noticia/2025/07/22/tcnicos-do-bc-identificam-operaes-com-dlar-pulverizadas-e-feitas-por-robs-antes-de-anncio-de-tarifao.ghtml?


[1] PARANÁ, Edemilson. AI as Financial Infrastructure? Part IV, cap.31, p.386-400 In: Digital Technologies and the Future of Financial Infrastructure. Publicado on-line pela Cambridge University Press: 21 de maio de 2025. Disponível em: https://www.cambridge.org/core/books/cambridge-global-handbook-of-financial-infrastructure/ai-as-financial-infrastructure/8C428D51F19AFBA4438523BA5292AF34

[2] LANGLEY, Paul. Assets and assetization in the financialized capitalism. 2020.

segunda-feira, julho 21, 2025

Cartões de crédito x Pix e o esperneio de Trump-Bolsonaro

A facilitação dos meios de pagamento amplia a fluidez do dinheiro. O avanço da bancarização com fintechs (bancos digitais) mais a oferta de cartões de crédito e débito fazem parte dessa realidade.

Imagem gerada por IA.
Colaboração Wellington Abreu
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Essa trajetória passa pela digitalização bancária lá atrás (década de 80) chamada de informatização, a seguir chegam os caixas automáticos, acesso aos serviços dos bancos via internet, depois os aplicativos (APPs) com o celular móvel (regime online 24/7) e vão desembocar no instrumento do Pix controlado pelo Banco Central do Brasil (BCB).

Como tudo que diz respeito ao avanço da digitalização, há sempre várias contradições entre vantagens e desvantagens, riscos e oportunidades. Facilidade do usuário x exposição dos seus negócios (dados bancários) e propriedade do dinheiro e transações. Isso remete a uma antiga brincadeira entre amigos que dizia ser tal como a família: ora faz falta, ora faz raiva (sic). Ou seja, a direção e o uso da inovação e da tecnologia dependem de quem a controla.

Assim, a fluidez transfronteiriça do capital realiza um dos sonhos originais e básicos do capitalismo. O desejo que o capital no andar superior da pirâmide possa fluir sem obstáculos a qualquer tempo e lugar. Visto dessa forma, fica também um pouco mais fácil, compreender porque também chegamos à hegemonia financeira na contemporaneidade.

Pois bem, a partir desses considerandos, observemos o avanço das transações em cartões de crédito e/ou débito e também a entrada em novembro de 2020, em plena Pandemia, do instrumento do Pix no Brasil, após anos de desenvolvimento por técnicos do Banco Central e inicial rejeição dos bancos comerciais.

Em junho de 2024, segundo o Banco Central do Brasil (BCB), em seu relatório “Estatísticas de Pagamento em Varejo e Cartões de Crédito no Brasil” o número de cartões de crédito ativos no Brasil era de 221,2 milhões, maior que a população do país. Já o número de cartões de débito ativos no Brasil era de 162 milhões.

Ainda com dados de 2024, as transações em cartões de crédito tinham sido 2,8 vezes maiores que as realizadas no débito, segundo dados da Abec (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito). Também em 2024, o valor transacionado em cartões de crédito e débito chegou a R$ 4,1 trilhões, sendo R$ 2,8 trilhões em crédito; R$ 1 trilhão em débito e o restante em pré-pago e outros. É importante ainda registrar que em 2024, os parcelamentos sem juros, representou 41% do valor transacionado no cartão de crédito.

Considerando a média que fica retida pela bandeira do cartão é de aproximadamente 2,2% no crédito e 1% no débito, é possível estimar que essas grandes empresas de cartão ficaram com pelo menos R$ 75 bilhões ou US$ 13,5 bilhões, a maior parte sendo enviada aos EUA e origem da chiadeira de Trump e dos EUA na sua imperial taxação ao Brasil.

Dentro do universo de 221 milhões de cartões de crédito existentes no Brasil, as bandeiras de cartão mais fortes e presentes até aqui são das americanas Mastercard com 131,8 milhões, seguido da Visa com 72,6 milhões. Em terceiro vem a bandeira brasileira Elo, controlada pela holding EloPar (BB e Bradesco) e CEF com 9,2 milhões de cartões.

É nesse processo que o instrumento do Pix criou embaraços para o avanço dos cartões de débito e crédito no Brasil. Esse meio de pagamento crescia na ordem de 36% em 2021, tendo passado a pouco mais de 3% nos anos 2023 e depois 2024, embora ainda em crescimento. Em 2024, o número de transações via cartões foi de 45,7 bilhões. Enquanto isso, o Pix atingiu a marca de 63,8 bilhões de transações, com um crescimento de 52% em relação a 2023, tendo movimentado R$ 26,4 trilhões em 2024 com recorde diário de transações de 276,7 milhões de operações.

Assim, o Pix se consolidou, de forma definitiva, como o meio de pagamento mais utilizado no Brasil, superando a soma de todas as demais transações realizadas por cartões de crédito, débito, boletos, TED, cartão pré-pago e cheques, segundo dados da Febraban (Federação Brasileira de Bancos). 

Até aqui, o impacto do Pix foi sobre o pagamento no cartão via débito em conta. Certamente se ampliará para o crédito com a entrada em vigor, prevista pelo Banco Central (BC) para setembro próximo, da funcionalidade do parcelamento via Pix. Os dados permitem interpretar que com a entrada em vigor do parcelamento via Pix, os impactos sobre as transações nos cartões serão bem mais fortes.

Todo esse percurso que se amplia dia a dia com a maior digitalização, IA, clouds, computação quântica, etc., evidencia a hegemonia financeira no mundo contemporâneo, da propriedade do dinheiro sem a necessidade do papel-moeda, só como informação concentrada e, ao mesmo tempo, fluida.

Para terminar, vale ainda lembrar e destacar, em importante resgate histórico, que o Brasil é um dos precursores no mundo na informatização dos bancos, num processo depois copiado e ampliado, mundo afora, já como digitalização com uso de vários tipos de plataformas. Um termo, aliás, que nasce nos bancos físicos, nos espaços com um tablado acima do piso original, como destaque, onde gerentes e donos de grandes depósitos, realizavam negócios de crédito e que hoje se espalhou com as hoje conhecidas plataformas digitais. [Adiante penso em resumir num artigo este contexto histórico]

Um processo que venho chamando de plataformização, como infraestrutura de intermediação (meio de produção e meio de comunicação) conectando de forma online e ininterrupta todos durante todo o tempo e em qualquer lugar, sejam cidadãos, produtores, consumidores, fornecedores ou apanhadores de crédito, demandadores e ofertantes de serviços, etc.

Enfim, parodiando o personagem Hamlet de Shakespeare, há mais coisas entre o pix, as operadoras de cartões de crédito e os arroubos imperiais de Trump, do que supõe a nossa vã filosofia.

PS.: Atualizado às 15:24 para breve acréscimo no texto.

sexta-feira, julho 11, 2025

Segue ampliando o gigantismo, concentração e dominação das Big Techs

O gigantismo das Big Techs, maior oligopólio da história da humanidade e razão de muitas decisões geopolíticas do presente, segue se ampliando de forma cada vez mais acelerada. Processo de dominação tecnológica aliada à hegemonia financeira.

O quadro comparativo acima mostra as 10 maiores Big Techs e as 10 maiores petroleiras (as Big Oil) que historicamente exerciam essa liderança e concentração agora completamente superada.

Pela 1ª vez, uma big tech (NVidia) chega em valor de mercado (capital fictício) aos US$ 4 trilhões. NVidia e Microsoft sozinhas valem o dobro petroleira saudita Saudi Aramco. As 10 maiores Big Techs juntas valem US$ 20,4 trilhões, enquanto as 10 maiores petroleiras do mundo somam US$ 3,3 trilhões. Ou seja, as Big Techs valem 6,4 vezes mais que as Big Oil. 

Há 2 anos essa relação era de 3X. Há um 1 ano era 4X. Agora 6,4 vezes. O gigantismo e a dominação se aceleram, porque é um setor transversal que perpassa todos os demais.

São números e valores espantosos e que tendem a aumentar com a ampliação do uso da internet e das plataformas de IA. Hoje cerca de 70% (apoximadamente 2/3) da população mundial usa internet, segundo a UIT (International Telecommunication Union), que prevê que até 2030, já se tenha superado o número de 6 bilhões de usuários. 

Agora, em 2025, já se fala em 1 bilhão de usuários de plataformas de inteligência artificial (IA). Tudo isso potencializa e amplia o uso, o tempo de navegação na internet, plataformas de e-commerce, IA, etc. e acima de tudo, os lucros e os valores de mercado das Big Techs que atuam como plataformas-raiz.

Essa realidade reforça a interpretação sobre o Tripé do Capitalismo Contemporâneo, que é composto de três bases. A primeira é a digitalização (plataformização) como novo fator de produção que é parte da atual reestruturação produtiva e decorre da aceleração da inovação e da onda tecnológica atual; a segunda é a hegemonia financeira; e a terceira base do tripé é a racionalidade neoliberal.

Conforme direção e controle que se dê à enorme onda da inovação tecnológica que explodiu com a internet móvel, infraestrutura digital, extração e lógica da hiperpersonalização dos dados, algoritmos, IA, computação quântica, etc.

Nenhuma tecnologia é neutra e pode ser usada a favor da maioria das populações, assim, a sua direção e controle é que determinam as consequências da sua implantação. O crescimento que pode levar à concentração da riqueza e exploração da maioria ou à sua distribuição.

PS.: Atualizado às 16:54 e 17:08 para breves acréscimos no texto.

quarta-feira, julho 09, 2025

A relação entre o dedo mindinho, nossas cabeças e o cyborg individualizado

A deformação do dedo mindinho pelo uso sistemático do celular é uma comprovação de que, sem perceber (?), a humanidade avançou para o modelo-homem-máquina (cyborg) com a tecnologia funcionando como extensão das capacidades do humano, espécie de “homo technologicus” [1]

De uma forma geral o uso intensificado do celular e sua tela em cerca de 8/10/12 horas por dia para comunicação familiar, de trabalho, social e/ou lazer, reforça a ideia sobre como a expansão desse modelo já age fortemente sobre o nosso cérebro e sobre a forma como nos entendermos como gente e também sobre nossa posição no mundo.

Essa é uma constatação que espanta. Porém, deveria espantar mais o fato desse processo estar transformando nossa cultura e nossa ideologia sem que geralmente queiramos enxergar isso criticamente.

Entendo que não caiba se falar em maldição da tecnologia. Embora ela nunca seja neutra. O uso e o controle, em especial da tecnologia digital (incluindo IA), está produzindo transformações profundas nas relações sociais e nas relações de poder.

Não parece se tratar apenas de uma onda sobre uma nova tecnologia, depois de tantas outras como o trem, a eletricidade, o carro, telefonia, etc. São várias transformações juntas, telefonia móvel, internet, comunicação online 24/7, plataformas/aplicativos, mídias sociais, inteligência artificial que parece atingir mais profundas a sociedade. As pessoas estão conversando e já amigas "íntimas" das IAs que estão agindo por tudo que é canto, em produtos, serviços e dispositivos que usamos diariamente e nem sabemos. 

Penso que esse vagalhão de inovações tecnológicas sobrepostas deveria nos sugerir formas de repensar a administração do uso conjunto dessas ferramentas da tecnologia digital. Considero que poderíamos, avaliar melhor e só absorver aquilo que se apresenta como positivo, relativizando ou descartando, o que já se apresenta danoso. 

Nesse percurso há questões e decisões de ordem coletiva que têm que ser implantas, como a imposição de regras e regulações. Outras, podem ser encaminhadas como resoluções individuais em diversas dimensões, desde formas e tempo de uso, aos tratamentos psicológicos e/ou psiquiátricos.  

Além disso, parece que já passamos da hora de buscar formas de também re-valorizar as relações físicas entre os humanos, porque é a partir do convívio com o outro que nos enxergamos como sujeito e como parte de um contexto de relações sociais.

Observamos várias manifestações de preocupação e algumas boas iniciativas na direção de se repensar essa realidade. A proibição do uso do celular em sala de aula é uma delas, mas é preciso ir bem além. As mídias sociais controladas pelas big techs precisam urgentemente de regras claras e firmes.

Porém, volto ao início. O fato de já termos nos transformado numa espécie de cyborg, também pode ser menos importante, desde que enxerguemos que a nossa parte humana ainda mantenha a empatia e indispensável virtude da solidariedade, o extremo oposto da individualização que esse "modelão" vai nos empurrado em nosso cotidiano acelerado. É necessário superar o isolamento da individualização e é possível superar a "epidemia da solidão".

A vida pós-moderna contemporânea tem sido um emaranhado labiríntico, onde a racionalidade neoliberal se impõe produzido em larga escala, esse sujeito que se faz e vive por e para si próprio. Talvez, isso explique em boa parte o sentimento entendiante e de ansiedade que cerca boa parte da sociedade contemporânea.

Entender as causas desses sentimentos, seus significados e suas consequências, podem nos ajudar a avançar em alternativas coletivas para além dos recursos e tratamentos individuais que negam as causas coletivas do realismo capitalista [2].

 

Referências:

[1] SULEYMAN, Mustafa; BHASKAR, Michael. A próxima onda: Tecnologia, poder e o maior dilema do século XXI. Editora Record. Rio de Janeiro, 2023.

[2] FISHER, Mark. Realismo capitalista: é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo? Autonomia Literária. São Paulo, 2022.