terça-feira, março 05, 2013

Edital do Transporte Público em Campos: análise da opção pelo valor da outorga e não pelo menor preço

O advogado e blogueiro Cleber Tinoco acabou de postar em seu blog, "Campos em Debate", uma primeira análise a respeito da concorrência pública aberta pela PMCG para escolha das novas concessionárias do transporte público no município:

"Impressões sobre o edital de licitação do transporte público - parte 1"

"Antes de tecer alguns comentários a respeito do edital de licitação do transporte coletivo de Campos, cumpre-me esclarecer o que é uma concessão.

Em primeiro é preciso ter em mente que o serviço público tem como titular um ente estatal (União, Estados, Municípios ou Distrito Federal), mas seu exercício pode ser delegado ao particular mediante concessão, que é um contrato administrativo.  

A concessão de qualquer serviço público deve ser precedida de concorrência, uma modalidade licitatória, a fim de selecionar a proposta mais vantajosa para a coletividade. Neste processo de escolha, a Administração Pública deverá fixar necessariamente os critérios para julgamento das propostas, entre os seguintes elencados pelo art. 15, da Lei n.º 8.987/95:

Art. 15. No julgamento da licitação será considerado um dos seguintes critérios: 
I - o menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado; 
II - a maior oferta, nos casos de pagamento ao poder concedente pela outorga da concessão; 
III - a combinação, dois a dois, dos critérios referidos nos incisos I, II e VII; 
IV - melhor proposta técnica, com preço fixado no edital; 
V - melhor proposta em razão da combinação dos critérios de menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado com o de melhor técnica; 
VI - melhor proposta em razão da combinação dos critérios de maior oferta pela outorga da concessão com o de melhor técnica; ou 
VII - melhor oferta de pagamento pela outorga após qualificação de propostas técnicas.
Na concorrência em questão o critério eleito foi o do inciso VI, ou seja, “melhor proposta em razão da combinação dos critérios de maior oferta pela outorga da concessão com o de melhor técnica”, conforme o preâmbulo do edital. Note-se que não se utilizou o critério da menor valor da tarifa (que é o valor a ser cobrado do usuário) do serviço a ser prestado.

A maior oferta pela outorga constitui a remuneração oferecida pelo concorrente ao Poder concedente (Município de Campos) para ter a concessão. Este critério não é bem visto nas concessões de transporte público porque o pagamento da outorga é mais uma despesa a ser arcada pelo concessionário com reflexo sobre as tarifas. 

Neste sentido, opina Glaydson Santo Soprani Massaria, Procurador do Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas de Minas Gerais:
“O pagamento da outorga é um valor entregue pelo licitante vencedor ao poder concedente, como contrapartida ao direito de explorar o serviço. Trata-se de instituto previsto no art. 15, II, VI, VII, da Lei de Concessões.

Por se tratar de serviço essencial (art. 30, V, CR/1988), o transporte coletivo deve ser oferecido ao usuário com o menor custo possível, de forma a garantir a máxima efetividade da Constituição. Nesse sentido, o Ministério Público de Contas rejeita a utilização do pagamento da outorga nessas concessões, por consistir tal despesa em custos do operador com impacto direto sobre a tarifa, contrariando o princípio da modicidade tarifária.” 

Em matéria de concessões de transporte público, entende o referido procurador que o melhor critério para seleção da proposta vencedora é do menor tarifa, como se observa no trecho abaixo:
“Entende o Ministério Público de Contas que dentre os critérios de julgamento previstos no art. 15 da Lei de Concessões, o único que atende ao princípio da modicidade tarifária é o tipo licitatório menor tarifa. Por esse critério o julgamento é realizado de forma eminentemente objetiva, vencendo a licitação aquele que oferecer o serviço nos padrões da especificação técnica com o menor custo possível.” 

Mas por que não se adota este critério em Campos? Haveria algum motivo para dispensá-lo? 

Parece-me, no mínimo, contraditório valer-se de um critério de pagamento de outorga, mantendo-se um programa de subvenção de passagem. O Município e o concessionário seriam ao mesmo tempo credores e devedores um do outro, em detrimento da população.

Ora, se o critério da menor tarifa fosse empregado, dispensando-se, portanto, o pagamento pela outorga, não me impressionaria ver o programa de subvenção perder o sentido diante de propostas que fixassem a passagem em R$ 1,00 em todo o município e para todos os usuários, não apenas para os cadastrados como atualmente se faz.

Mas seria arriscar demais o crédito político auferido com o programa, ainda mais que para o cidadão comum importa é pagar menos, sendo irrelevante o fato de se empregar dinheiro público para subsidiar o uso do transporte. Além disso, o pagamento da outorga seria mais uma boa receita para o município, livre das amarras da legislação dos royalties que veda seu emprego na remuneração de pessoal. Assim, com esta operação, o dinheiro para subvencionar as empresas poderia ser oriundo dos royalties, ao passo que a outorga seria remunerada com capital privado, podendo ser gasto com maior liberdade."

8 comentários:

Jornalista Desajustado disse...

Nao possuo vasto conhecimento jurídico, mas, cá do meu canto, pergunto eu:

Será que já nao é hora de se ter uma visao com outros olhos sobre essa história de passagem a 1 real - e outros benefícios?

Tem que ser um político muito louco pra ir contra o populismo do Sr. Anthony - e ainda ameaçar sua própria empatia com os eleitores em geral...

Mas, será mesmo que não é hora de se dar um limite, digamos que de 50%, a qualquer benefício que o Estado venha a (querer) arcar para a população que não seja sua obrigação raiz?

Afinal, pouco informado a respeito eu sou, mas ACHO que bancar o "transporte público" nao é o dever nato do Estado. OU É?

A conta superficialmente demonstrada noutro comentário ontem ilustra isso: quase R$ 1.000,00 por ano de economia PARA CADA passageiro. Seria maravilhoso, não fosse um preocupante golpe que se arquiteta para um futuro em breve.

Nao seria essa uma modalidade de VOTO PRÉ-PAGO?

Ate onde eu (pouco) sei, o Estado deve dispor de pavimentação adequada, infra estrutura em geral, escolas, creches, hospitais... Mas bancar tamanho desconto na passagem é quase que perpetuar um grupo político no poder.

"Quase" pra ser bem modesto no adjetivo.

Com um limite de 50% (no mínimo) de custeio, o eleitor não teria uma discrepância tão grande entre o que ganha e o que pode vir a passar a gastar, caso o grupo que defende essa promessa eleitoral venha perder.

Se continuar assim, daqui a 4 anos, quando a passagem poderá vir a sofrer um reajuste de 20% a mais (considerando inflação de 5% ao ano), o governo atual defenderia sua permanência no poder com um projeto que tira a passagem de R$ 3,30 pra 1 real.

330% DE DESCONTO, CARO AMIGO!

E os hospitais?

E as creches e escolas?

E o combate à dengue e demais campanhas de saúde?

É obrigação do Estado arcar com o transporte público ou SÓ EU que estou vendo nascer o VOTO PRÉ-PAGO com o transporte (caótico e imundo) público dessa cidade para perpetuar até futuros "postes" que algum político venha a querer eleger?

Como sempre, preservo minha identidade. Mas acho que este assunto deveria sobrevir à pauta.

Luiz Oliveira disse...

Gostaria de parabenizar o blog pelos temas relevantes que discute e pelo trabalho social que desenvolve. A precisão das informações,a repercussão dos debates e a credibilidade do blog foi construída através da seriedade que o Prof. Roberto Moraes concede a seu informativo.

Quero aqui manifestar minha indignação e repúdio, quanto à forma absurda e inescrupulosa de fazer política que o casal de "inhos" se utiliza.

Não há qualquer comprometimento com o povo campista, com o bem-estar social, os interesses coletivos, enfim...

Esse processo licitatório, do transporte coletivo, é uma prova dos métodos sujos utilizados para vilipendiar a máquina pública com a desculpa de se fazer justiça social com políticas demagogas e populistas.

O problema é que a ignorância tapeia as pessoas e os incultos (tolos dependentes) aplaudem as fraudes, maracutaias, falcatruas, etc.

Será que um dia nossa Campos terá solução???

Lamento ser pessimista...


Roberto Moraes disse...

O subsídio à passagem é uma questão complexa.

Porém, vejo mais como solução do que como problema, desde que, obedecido uma série de princípios.

Para mim este não é o principal problema.

A especulação imobiliária empurra os pobres para a periferia, para os bairros e distritos longe do centro e depois quer que estes trabalhadores se virem para morar o transporte.

Daí que isto traz problemas até para quem empreende porque a mão de obra fica cara com as pessagens que eles têm que bancar, mesmo que parte.

Assim, o subsídio, ao contrário do que se imagina, acaba interessando não apenas ao pobre mas, também, a outros setores que assim ganham dos dois lados com a especulação e o preços exorbitantes dos terrenos nas áreas ditas mais nobres e depois trazendo o pobre para vir trabalhar a preço subsidiado.

Muitas prefeituras Brasil afora, por conta do diagnóstico acima, mais qté do que a questão eleitoral, está empreendendo alguma forma de subsídio.

Portanto, a meu juízo, a discussão principal é sobre a qualidade do transporte, a fiscalização sobre a prestação dos serviços e sobre os valores subsidiados e pagos pelo poder público.

Neste processo está a questão da licitações. Assim, o Cleber enfrenta a questão da forma de licitar, que poderia ser pelo preço que todos nós pagaremos, através do poder público.

A questão merece aprofundamento.

Abs.
Roberto Moraes.

Jornalista de Passagem disse...

Compreendi seu ponto.

Mesmo ciente de que isso acontece noutros lugares, quase sempre são locais de populaçao inferior a 100mil e cidades com orçamento a "anos-luz" de distancia de nossa cidade, o que torna a questao destes exemplos menos preocupante que a nossa(a meu ver e com meu minusculo conhecimento a respeito).

Fiquei a ter certo temor sobre o que isso pode vir a gerar, porque com a dinheirama que se derrama sobre empresas "particulares"/privadas é tamanha que, possível seria estruturar o subúrbio, a periferia e todo lugar que seja, para fomentar o comércio e o consequente progresso.

Que o plano de passagem barata é benéfico ao usuario, isso nao questiono mesmo! Ate porque, faço uso do serviço (nao com o benefício em si, mas faço - e concordo plenamente que deveria se extender a toda população e nao so aos cadastrados).

Enfim, é so um dado preocupante que se abre uma vez que o governo pode usar facilmente este recurso para manipular a massa: "se eu perder a eleiçao, a passagem sobe". "Se o Cabral vencer, a passagem sobe"... e por ai vai...

E vindo de quem vem, isso nao aconteceria SÓ no transporte, pois a gente sabe que nao se dá ponto sem nó.

Mas o debate, nestes termos e formas, é sadio e satisfatorio, intelecto e emocionalmente.

Roberto Moraes disse...

Tente ver a situação por outro ângulo, que não apenas da crítica ao fisilogismo político-eleitoral.

Embora se deva observar a questão, nós temos que ter o cuidado de não estar reproduzindo preconceitos dos endinheirados que vivem à sombra do poder e questionam qualquer uso dos recursos públicos para o cidadão que mais precisa dos governos.

Não é verdade que as prefeituras que menos de 100 mil habitantes usam mais este artifício. Ao contrário. Saindo de nossa região com a fortuna dos royalties, a maioria das cidades entre 50 e 100 mil habitentes tem orçamento limitado e não entra nesta questão assim.

Quem está subsidiando diretamente a passagem são cidades de porte médio como a nossa e algumas capitais ou cidades metropolitanas.

Algumas fazem diretamente como Campos e Cabo Frio em nosso estado reduzindo o valor e dando cartão.

Outras segurando o preço da passagem e criando programas de integração para quem necessita de mais de um ônibus e paga apenas uma passagem, a difrença é toda bancada pelo poder público.

Em nosso estado os moradores das cidades da região metropolitana se beneficiam deste programa integralmente bancado pelo governo estadual. São milhões de passagens pagas às empresas.

Volto a dizer o que está em jogo aí é a mobilidade e o custo do transporte da mão de obra. Se você for ao site da Firjan (e tambem CNI) vai ver diversos estdudos e pesquisas falando disto e defendendo não apenas passagens mais em conta como infraestrutura de transporte para garantir e viabilizar seus negócios.

Os economistas e urbanistas chama isto de deseconomias urbanas que só é evitada com bons projetos de transporte urbanos (ônibus, trens, etc.)

No fundo mais do que o usuário trabalhador quem ganha com este subsídio é o setor empresarial, que como disse ganha dos dois lados, especulação imobiliária, subsídio para o fluxo dos seus trabalhadores e, ainda de uma terceira forma, com a construção de novas infraestruturas, seja no centro, seja na perifeira.

É a necessidade de acesso ao centro (mesmo com toda a chamada descentralização)que gera a mobilidade e a condição de passageiro de ônibus, ou qualquer outro meio de transporte e não a melhoria necessária nos espaços de moradias nas áreas periféricas.

Infelizmente, a velha mídia não permite este debate mais amplo, ela fica repetindo a mesma questão, como se fosse o caso de falar mais alto e repetir para fazer um surdo entender o que você está dizendo e não tentar entender e ouvir outros argumentos. A não ser que seja (e na maioria das vezes é uma questão de intere$$e).

Sds.

Jornalista de 1 Real e meio disse...

É... termino usando o bom e velho "acredito que ambos os lados tem alguma razão".

Seu argumento é fortalecido pela comprovada execução noutras cidades e na óbvia presença do progresso economico causado pelo mesmo.

No entanto, ainda assim não consigo ver apenas com bons olhos toda proliferação populista de benefícios, investindo em massa o capital do municipio em detrimento de outras áreas de importancia igual/superior,como nossa caótica saúde mesmo depois de tantos prefeitos médicos que tivemos.

Ainda acho que isso, num futuro não muito distante, será o grande trunfo eleitoral - digo que aqui, em Campos, parece ser usado para isso, diferente de outras cidades, como voce exemplificou, que usam isso com o intuito progressista.

Diante de um quadro tão complexo e que sofre de "timidez midiátia", por razoes "intere$$seiras", como vc mesmo disse, encerro minha participação neste precioso debate igualando-me ao "Luis Oliveira" : "Lamento ser pessimista..."

Roberto Moraes disse...

Há diferença e não são poucas, entre o uso eleitoral das políticas públicas, à oferta de condições mínimas de sobrevivência e vida digna à população de forma a estimular sua emancipação.

Não se deve ater ao "discurso único" do questionamento às políticas sociais, em detrimento de outras políticas também necessesárias.

Contrapo-las faz parte de uma estratégia que deve ser rechaçada.

Porém, o principal meio de tornar as políticas osciais emancipatórias é a educação de qualidade e oferta de maneira ampla e de qualidade.

Neste campo há que se identificar a diferença e o que se faz, mesmo em cidade até aqui endinheirada como a nossa com um dos piores Idebs do estado.

Além disso, como já falei, não se pode restringir o debate da política pública de transporte coletivo, objeto desta postagem na discussão sobre o subsídio ou não.

Ela é um dos mais importantes direitos do cidadão. E, no nosso caso, do cidadão que não possui carro, que mais precisa dele, portanto, cabendo mais que nunca controle sobre sua qualidade, sua extensão, pontualidade, gratuidade para os estudantes, etc.

Em outros tempos, sem o subsídio, o tema, estaria gerando imenso debate, porque infleunciaria no preço a ser pago diretamente pelo cidadão.

Aí está a noção de cidadania que precisamos desenvolver de considerar como nosso o que é público (de todoss) e não apenas o privado.

Só a luta pelo que é coletivo poderá desenvolver na população esta consciência, que fora daí, parece concessão política e eleitoral e assim, retornaríamos, ao tema inicial, que como vimos, precisa ser considerado de forma mais ampla.

Sds.

Anônimo disse...

Numa das fotos do edital confundiram
shoppingestrada com a podium da fiat repare só.