quinta-feira, janeiro 29, 2015

Macaé como líder do trabalho escravo é um caso que merece ser melhor estudado como exemplo do "precariado"

O trabalho análogo ao de escravo fiscalizado pelo Ministério do Trabalho e do Emprego (MTE) e pelo Ministério Público do Trabalho, historicamente, vinha sendo uma herança escravocrata, mais comum no trabalho rural, distante da cidade do controle das autoridades. (Veja mais detalhes da notícia aqui).

Nessa linha em todo o estado, os casos mais flagrantes aconteciam no interior do município de Campos (de grande extensão territorial) e nos municípios vizinhos de São Francisco do Itabapoana e pontualmente, outros.

O fato do município vizinho de Macaé, base da indústria do petróleo na região aparecer como o novo recordista no país, em número de casos identificados pela fiscalização de trabalho análogo à de escravos, acende um amplo sinal vermelho, para uma nova realidade.

Pode-se atribuir a ela aquilo que vem sendo chamado e confirmado como a precarização do trabalho, agora  cada vez mais, de uma forma geral e não específica, por setor de atividade.

Mesmo considerando que os dados expõe uma realidade das terceirizações e quarteirizações de "novos trabalhadores" do setor da construção civil que pulam de cidade e região, em busca do emprego e da renda, o caso traz à tona uma discussão que qualifico que é mais ampla.

O caso de Macaé é emblemático, porque se trata de um município que convive com um setor de alta tecnologia, com inovações de um setor de ponta como o de óleo e gás, em termos de automação e mesmo de gestão.

Sempre se trabalhou com o simbólico de que o velho e degradado se referia ao hercúleo trabalho braçal do corte manual de cana-de-açúcar, ou ao chamado "vapor do diabo", dos fornos e das caldeiras das usinas de açúcar.

Porém essa recente estatística desabrocha com dados da exploração do trabalho no setor que mais se valorizou e lucrou nesses últimos anos nas grandes e médias cidades, não apenas brasileiras.

Esse setor imobiliário promove a especulação fundiária, valoriza os terrenos centrais das cidades, expulsa permanentemente os pobres para a periferia mais longínqua, sempre atrás dos lucros ampliados com o trabalho precarizado de nordestinos, gente oriunda de nossos campos, ex-cortadores de cana, etc., que hoje são, serventes, gesseiros de obras privadas e públicas de diversos tipos.

São trabalhadores que convivem com incertezas e insegurança crônicas de uma vida mutante no espaço e no tempo, em meio ao cotidiano das cidades apartadas.

Ele buscam trabalho decente, mas, são indecentemente recrutados e tratados. Há hoje quem os considere uma nova classe social, à margem do sistema, com pouca capacidade de ação, sem representação social e sindical, vivendo amedrontados, relegados, se tornando apenas visíveis nos números dessas lamentáveis estatísticas.

Enquanto isso, no topo do sistema temos uma elite de construtores que buscam menores custos e lucros a todo o tempo e hora e estão aí a reclamar, inclusive judicialmente, das listas que precisam ser divulgadas dos produtores deste tipo de trabalho precarizado.

Quem se dispõe a ouvir a história dessas pessoas? De onde vem? Que esperanças ainda trazem? Que noção possam ainda ter de Justiça? Quais os motivos que os fazem ainda nos dias atuais viver das sobras até do que resta de trabalho, em troca de pequenas e insuficientes rendas e condições de trabalho que as fazem ser qualificadas como "trabalho escravo"?

Quem estuda o "precariado" desde 2011, como o professor e pesquisador inglês, Guy Standing, diz que o precariado é hoje um aglomerado de vários grupos sociais diferentes, nos quais se inclui os imigrantes na Europa e os migrantes em nosso Brasil. Mas não somente.

Standing enxerga que a precarização avança para outros tipos. De um lado os sobrantes do antigo trabalho hierarquizado e tradicional, do antigos operários e de outro, os escolarizados acima da média que não conseguem se colocar em trabalhos proporcionais às suas qualificações. Estes também crescem e estão aí a pressionar pelas mudanças não mais e apenas do mundo do trabalho, mas do processo civilizatório.

O sistema capitalista vive se reorganizando, reinventando e buscando as brechas da legalidade, para construir novas formas de exploração. Assim alegam se tratar de problemas pontuais e consideram tudo isso, como exceções surpreendentes. Desta forma, essas estatísticas do mesmo jeito que aparecem, elas somem, quase na velocidade da luz e das fragmentação das notícias pós-modernas.

Assim, eu insisto que vale aprofundar o conhecimento sobre essa realidade que nos cerca. Estranhamente, ela parece unir no tempo e no espaço, as diferentes situações de vida e trabalho, entre os municípios de nossa região.

Por aqui, a dinâmica econômica se transfigurou entre o doce do açúcar e a força do petróleo, para tudo permanecer como sempre foi, entre escravos, subempregos privados e públicos das angels e facility que tutelam o homem e suas vontades.

Essa violência ainda será superada, mas, precisamos não apenas conhecer essa realidade, mas, continuar a nos indignar, enquanto reunimos forças para a sua superação.

3 comentários:

Anônimo disse...

olá roberto moraes, acredito que seja de seu conhecimento a proposta da prefeitura de campos de se construir um parque tecnológico nesta cidade em parceria com algumas instituições de ensino superior. gostaria muito de ver sua opinião sobre este assunto, pois a exemplo de outras cidades do interior paulita que desenvolveram projetos como esses, campos também pode se beneficiar tendo um parque de alta tecnologia na cidade e atrair para este município, varias industria de ponta que buscarão sinergia com empresas e start-up recém saidas de incubadoras da região e de outros locais.

douglas da mata disse...

Roberto, o trabalho chamado escravo rende 12 bilhões de reais por ano no Brasil.

É claro que suas vertentes rurais são mais emblemáticas, tanto pela fragilidade dos laços institucionais pelo interior, tanto pela pressão exercida pelas elites rurais junto às populações mais frágeis.

E a mídia canalha gosta de expiar suas próprias culpas (e de seus anunciantes que usam esta mão-de-obra) falando apenas no interior...

Mas o fato é que o CAPITAL lucra horrores com o trabalho precário em qualquer canto: Seja pagando menos de 1 dólar por dia a crianças em Bangladesh, um pouco mais a bolivianos em SP e um outro tanto nas confecções clandestinas nas cidades-porto italianas, geridas pela máfia, mas que alimentam as marcas chiques do gran mondé da moda.

Só cretinos e outros tantos ingênuos para acreditarem que escala econômica de produção ou setores que detêm processos tecnológicos mais complexos estejam à salvo desta prática predatória...

Qual nada...é tudo a mesma merda...

Anônimo disse...

Toda mão-de-obra é escrava. É a exploração do homem pelo capital. Hasta la victoria, siempre!!