terça-feira, março 26, 2019

Sobre as bases portuárias para apoio à exploração de petróleo offshore no Sudeste

Um leitor do blog solicitou nos comentários de uma nota minha opinião sobre as bases de apoio portuário que servem às atividades de exploração offshore de petróleo, de forma especial,  relacionadas à concorrência que a seu ver existiria, entre o projeto do TerPor da empresa EBTE em Macaé e o Porto do Açu para os próximos anos.

Por conta do possível interesse de outras pessoas no tema eu resolvi transcrever abaixo a minha longa resposta. Para começar, eu informei que a minha avaliação era mais no plano macro e envolvia o que passei a chamar do Circuito Espacial do Petróleo e dos Royalties no ERJ (CEPR-RJ).

Há um processo em curso para ampliação das bases operacionais que dão apoio logístico às operações offshore de exploração e produção de petróleo no litoral sudeste.

As limitações das bases de Imbetiba (Petrobras) e do Rio (terminais da Triunfo no Caju) para a Petrobras e Niterói (NitShore) com vários terminais  que atendem a petroleiras e privadas e para-petroleiras que fornecem equipamentos e serviços a essas atividades, ampliam o potencial do Porto do Açu.

Logística integrada para exploração offshore. Tese do Autor [3],
Figura, nº 34. P.344 em que cita apresentação da Brasco Offshore, ago. 2014.
Vale lembrar que isso varia um pouco conforme a localização das sondas mais plataformas e o município base dessas empresas. É entre eles que a logística se desenvolve. Também não são uniformes as cargas. Algumas dependem de maior retro-área, enquanto outras, dependem de um transbordo abrigado.

Isso ocorre mais ao norte no ES - onde o Açu leva maior vantagem - quanto a direção sul, na Bacia de Santos, mais ou menos próximo aos terminais portuários de Rio/Niterói.

Há ainda que se considerar que o apoio offshore para a Bacia de Santos no litoral paulista e o Pré-sal naquela região até aqui continuou a depender dos terminais portuários da Baía da Guanabara (Rio e Niterói).

Por razões diversas, o Porto de Santos visando manter o seu maior fluxo de navios de cargas (contêineros e graneleiros) criou dificuldades para esse tipo de operação naquele complexo portuário, onde há 54 terminais portuários operando o mais diferente tipos de cargas.

Cargas de apoio offshore movimentam muitos rebocadores e, de certa forma, reduzem a trafegabilidade para os terminais de maior movimento que pretendem fixar e ter o Porto de Santos como principal hub do Brasil.

Assim, tudo que se explorou e descobriu em termos de poços e campos de petróleo nos últimos anos na Bacia de Santos e Pré-sal saiu especialmente das bases de apoio instaladas nos terminais portuários do Rio de Janeiro e Niterói.

Outros pontos do litoral sul fluminense e norte paulista foram procurados para montar novas bases de apoio offshore. Porém, o recorte de um litoral sinuoso e com a Serra do Mar muito próximo à praia, incluindo as várias unidades de conservação ali existentes, impediram até aqui esse processo. Angra dos Reis no ERJ e São Sebastião foram alternativas estudadas, mas que não avançaram.

Porém, nos últimos dias, um consórcio da subsidiária de Petrobras PB Log, o terminal portuário Tecon da CSN, na Baía de Sepetiba [junto ao Porto de Itaguaí] e ainda uma empresa de aviação (helicópteros pela CHC) ganharam uma licitação para operar a base de apoio offshore para atender as movimentações de cargas para o mega campo de Libra, que equivale a quase uma bacia petrolífera.

A base portuária da BrasilPort (grupo Edson Chouest) instalada no T2 do Porto do Açu até se interessou em participar, mas em função da proximidade desse terminal com o campo de Libra, acabou desistindo. 

Essa base portuária integrada (marítima, aérea e rodoviária), conforme a estrutura que seja montada poderá conquistar adiante uma hegemonia, para ter parte importantes das bases de apoio offshore que hoje operam nos terminais portuários de Rio e Niterói e assim melhor atender a Bacia de Santos e o Pré-sal daquela região.

Esse processo poderá reduzir paulatinamente, a demanda de apoio das bases portuárias do Rio de Janeiro e Niterói, mas também dependente das corporações que movimentam cargas e de suas localizações. Algumas possuem instalações e contratos em Niterói e podem manter ali as suas operações. Outras poderão migrar.

Numa estimativa mais geral, hoje, é possível afirmar que a tendência é que todas essas bases portuárias possam operar de forma conjunta e simultânea, só que aí terão menos concentração, onde cada uma atenda a clientes já definidos e outros que ainda chegarão.

Essa decisão sobre o apoio portuário ao megacampo de Libra não altera muito a situação do Açu e nem de Imbetiba. O Porto do Açu mexeu foi com a base portuária de que atendeu ao ES ao ficar com boa parte dessa demanda.

Nesse contexto, depois dessa volta (porque não cabe a meu juízo avaliação apenas de um terminal em relação a outro, é preciso olhar o geral) o caso do Terpor, se depender, unicamente, de movimentação de apoio a exploração offshore, terá imensas dificuldades para buscar investimentos e se viabilizar, para além dos graves impactos socioambientais de sua instalação.

Aliás, os terminais portuários em todo o mundo tendem a possuir múltiplas atividades para movimentação de cargas. A dependência de um ou outro setor como eram antigamente não comporta mais. 

Para isso teria o projeto do Terpor teria que se sustentar em outras atividades, como aliás fez, em seu último EIA/Rima em que busca o licenciamento ambiental. Ali, a EBTE apresentou propostas de atividades para ser base de transbordo de petróleo,  base de recebimento de LNG e gasodutos para viabilizar uma unidade de processamento de gás natural, equivalente a Cabiúna, entre outras atividades, porém numa área limitada e junto à área urbana de Macaé. 

Porém, a ampliação dessas atividades aumentam de outro lado os impactos socioambientais decorrentes da vizinhança com área urbana e ainda com a proximidade com o Parque Nacional Ambiental de Jurubatiba. Dessa forma, uma vantagem do uso múltiplo do terminal carrega junto uma enorme desvantagem que é o aumento exponencial dos impactos socioambientais.

Ainda assim, considerando o cenário político atual de liberação e de menor regulação sobre atividades econômicas é possível que o Terpor possa tanto buscar investidores como se viabilizar, mesmo que menor. Ou não.

A articulação entre poder econômico e político e ainda os interesses das corporações é que definirão onde e como conseguirão usar o território e essas instalações.

Porém, no geral, eu reforço a interpretação de que a tendência é a de um aumento do número de bases operacionais de apoio às atividades offshore na região Sudeste, sendo elas um pouco menores e menos densamente utilizadas. Vale ainda observar que a integração modal (intermodalidade) com articulação do marítimo com as rodovias e os trens podem potencializar umas bases portuárias em relação às outras.

Espero ter respondido à sua indagação, depois de tantas voltas. Porém, eu precisava aprofundar o assunto e levantar outras relações sobre o tema.

Há uma tendência para quem observa de longe a questão de ter um raciocínio quase sempre de comparação e disputa de projetos e negócios. Porém, não se deve esquecer que a lógica do capital e das corporações são norteadas pelos seus ganhos. O território eles apenas usam.


Resposta complementar:
(Diante de nova indagações e questionamentos do interlocutor eu estendi um pouco mais a resposta).


Os interesses inter-capitalista são muito grandes nesse tipo de negócio que envolve forte investimentos em capital fixo. São setores chamados de intensivos em capital. Os interesses corporativos invocam nesses casos grandes volumes de recursos.

Nele há poucos concorrentes, assim, sempre será mais provável que eles juntem seus recursos e esforços para um acordo, do que imaginar hipóteses de apostas em projetos individuais, em que cada parte terá mais custos e mais riscos. Essa lógica não se sustenta.

Dessa forma a discussão locacional sobre os empreendimentos também são dependentes dessas articulações. Tanto entre quem tem poder econômico, quanto quem tem poder político. E ambos  articulam entre si e tomam as decisões sobre o uso do território.

Todo esse processo sempre se dá numa escala acima das disputas locais, onde apenas se reproduzem os interesses de grandes corporações grupos e donos de capital.

Quanto às atividades econômicas do Circuito Espacial do Petróleo em Macaé e região, elas continuarão a passar por mudanças espaciais e de atores. O "boom" do setor entre 2011 e 2012, em especial num único município, não deverá se repetir por uma série de motivos que caberiam em outro texto.

É da praxe do poder político construir expectativas e esperanças. Esse poder depende disso, mesmo que a realidade seja um pouco ou bem distante do desejo.

A análise apenas um pouco mais profunda dessas novas "dinâmicas econômico-espaciais-políticas" desse processo dão pistas claras sobre o que é retórica e o que pode ser concreto e real.

Sigamos acompanhando o mundo real e as articulações.

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