domingo, junho 01, 2014

Transposição do Paraíba do Sul gera arguição sobre sua origem na região

A professora de Geografia e mestranda em Engenharia Ambiental pelo IFF, Dayana R.C. Vilaça, questionou o blog, sobre a não abordagem do tema do uso da água do Rio Paraíba do Sul. Por email disse:

"Queria te pedir um favor! Porque sei que seu blog tem repercussão e leva informação para muita gente de nossa região.Coloque em seu blog as discussões acerca da Transposição do rio Paraíba do Sul (eu não vi se já tem...Mas onde procurei não encontrei...). Estive num simpósio em São Paulo na semana passada que tratava desta temática e percebi que o projeto está encaminhado e que vai sair do papel. Além de tantos absurdos... Ainda ouvi que o CEIVAP não está sendo levado em consideração como instância primeira de gestão e decisão.Acredito no seu blog, em suas discussões e por isso peço que divulgue as informações. Precisamos nos unir para impedir que os estragos sejam irreversíveis."

Eu devolvi sugerindo que ela mesmo fizesse isto para o blog, atualizando nossos leitores-colaboradores. Hoje, a Dayana Vilaça respondeu:

"O rio está bem degradado lá pra cima, eutrofizado, assoreado,... Muito difícil ver aqueles cenários. Quanto à sua proposta, pensei que você poderia iniciar a discussão mostrando aos seus leitores a importância do Rio Paraíba para a própria existência física da planície em que moramos. Montei um resumo baseado numa pesquisa de 4 geólogos. Segue em anexo. Acho que já dá pra iniciar uma boa discussão. A vazão do Rio Paraíba foi importante na construção da planície e continua a ser importante para a manutenção do equilíbrio ambiental em toda a região."

Abaixo o primeiro texto sobre o assunto da Dayanna Villaça:

A formação Geológica da Baixada Campista
Autora: Dayana R.C. Villaça - Licenciada em Geografia; pós Graduada em Educação Ambiental; mestranda em Engenharia Ambiental tudo no IFF.

Já que o tema é a transposição do Rio Paraíba do Sul. Que tal começarmos do início?

Na academia estas informações são muito difundidas e por isso acredito que seja importante que elas cheguem à população em geral, a fim de que compreendam a importância do Paraíba não só com relação às suas águas, mas como construtor da fisiografia de nossa região.

Alberto Lamego (1945) foi um dos primeiros a estudar a foz do Rio Paraíba e a afirmar que a planície conhecida como Baixada Campista é na verdade o resultado de duas forças conjuntas: a do rio e a do mar. Recentemente quatro geólogos: Martin, Domingues, Flexor e Suguio remontaram todo o processo a partir da técnica de datações de radiocarbono, levando em consideração a influência causada pelas variações do nível do mar sobre o continente em direção aos terrenos pleistocênicos (mais antigos).

Figura 1- A planície há cerca de
5.100 anos antes do presente. 
Segundo os pesquisadores, na fase inicial (Figura 1), o Rio Paraíba do Sul (que antes terminava praticamente nas imediações do atual bairro Fundão em Campos) passou a desaguar numa grande laguna e construiu um delta (foz) intralagunar (Martin et al, 1997). As setas contornando o que Lamego (1945) chamou de ilhas barreiras indicam a direção das correntes marinhas atuantes. O contorno tracejado identifica a linha de costa e a foz atual.

Naquele primeiro estágio, o delta (foz) do rio Paraíba do Sul era bem diferente do atual, ele possuía vários canais distributários, ou seja, desaguava em vários pontos da paleolaguna. A saída para o mar (desembocadura A) só foi alcançada por um desses canais no segundo estágio, entre 5.100 e 3.900 antes do presente (Martin et al,1997). 
Figura 2- Rio Paraíba do Sul com uma
saída direta para o mar no período
entre 5.100 a 3.900 antes do presente.

A partir dessa saída para o mar, o rio Paraíba do Sul passou a depositar de sedimentos nos terraços arenosos holocênicos, o que configurava a fase de construção da planície. Quando o mar avançava em direção ao continente e/ou recuava, as condições hidrodinâmicas sofriam alterações devido à mudança na direção das ondas, passando a configurar fases de erosão. 

Até chegar às características apresentadas pela planície da Baixada Campista nos dias atuais, o Rio Paraíba do Sul passou por inúmeras modificações, como o desvio de sua foz para o norte e o abandono dos seus canais tributários que desaguavam na laguna.

Figura 3: Planície Costeira do Rio Paraíba
do Sul de 2.500 anos antes do presente 
É importante lembrar que, além do trabalho do rio, houve ainda a importante participação do mar na configuração da planície a partir dos períodos de transgressão e regressão do e das deposições de sedimentos marinhos ao longo da costa (MARTIN et al, 1997).

Conforme pode ser visto a importância do Rio Paraíba do Sul para a Baixada Campista vai além de seus aspectos qualitativos, pois boa parte dos territórios dos municípios de Campos e de São João da Barra foram construídos geologicamente pelo rio Paraíba do Sul.


REFERÊNCIAS
LAMEGO, A. R. O Homem e o Brejo. Rio de Janeiro: Conselho Nacional de Geografia/Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1945.
MARTIN, L.; SUGUIO, K.; DOMINGUEZ, J. M. L.; FLEXOR, J. M. Geologia do Quaternário Costeiro do Norte do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. CPRM. Fapesp, Rio de Janeiro, RJ, p. 1-104, 1997.
SOFFIATI. A.A. Gerenciamento Ecológico dos Canais do Norte Fluminense. Revista VITAS- Visões Transdisciplinares sobre Ambiente e Sociedade-www.uff.br/revistavitas Nº 1, setembro de 2011.

4 comentários:

Anônimo disse...

Do texto, leigo que sou, me saltou aos olhos a informação de que o CEIVAP não está sendo levado em consideração.
Se verdadeira a notícia, o Comitê acabou. E por analogia, todo os outros comitês de bacia.

Todos os integrantes do CEIVAP devem declinar do posto.

Se as decisões estão sendo tomadas JUNTO COM o CEIVAP e os técnicos e representantes estão se omitindo ou sendo tragados pela força política de alguns, o momento é de protestar e dar visibilidade.

douglas da mata disse...

Roberto, aqui vai um comentário de um leigo total no tema:

01- Quem detém o poder e o martelo para evitar cisões federativas, dado o potencial explosivo que o uso da água carrega em si, é a União. Não há como equilibrar as demandas das unidades federativas e seus interesses sem um arbítrio fortemente hierarquizado.

Os comitês são interessantes, mas não avançam porque simplesmente não podem avançar.

02- Há um hermetismo alarmista na academia, como sempre. Isto é bom (e mal). Eles funcionam como "grilos falantes".

Não há "equilíbrio" em ecossistemas, e a própria resenha trazida por você, provocada pela geógrafa, é um exemplo. Estes ambientes tendem a mudanças cíclicas ou espiraladas, sendo-nos impossível determinar que há um equilíbrio só porque hoje nos sentimos confortáveis nestes microssistemas.

O rio tende ao avanço e ao recuo, assim como a Terra oscila períodos quentes e outros de eras glaciais.

A questão é determinar o quanto o fator Homem acelera estes processos.

Anônimo disse...

Respeitando todas as opiniões, mas, comparemos esse impasse a um fato concreto:
Suponhamos que no quintal de nossa residência encontra-se uma nascente. E que, por centenas de anos essa água, sirva para abastecer milhoes de vizinhos.
Ocorre que de repente o proprietário desse imóvel onde se localiza a nasce te, passa a necessitar dessa água.
Nesse caso específico, tal proprietário, não poderia fazer uso de tal água ? Penso que sim.

douglas da mata disse...

Errado, caro comentarista das 08:42.

Nossa Constituição define com clareza a questão do uso e propriedade das águas.

Rios que cruzam vários ou mais de um estado são da alçada da União e de legislação federal, sem prejuízo das responsabilidades compartilhadas na sua preservação e manejo, seja por regulamentação das agências nacionais, autarquias federais, estaduais e municipais.

Mas estas atribuições e responsabilidades estão subordinadas e subsidiárias à da União.

SP não tem nascente. O Brasil tem a nascente do Rio Paraíba.

SP tem a responsabilidade (junto e derivada da União) de proteger o trecho do rio que passa em sua geografia.