terça-feira, agosto 09, 2016

O caso Rafaela da Silva é fruto de políticas sociais e não da meritocracia!

Já disseram parte do que vou dizer de outras diferentes formas, mas penso que vale repetir ainda de outra maneira, bem ao estilo do pensamento construído em rede: a grande e sofrida Rafaela Silva é fruto das políticas sociais que podem salvar ou afundar o país!

A judoca brasileira medalhista de ouro é Silva. É de comunidade de baixa renda. Sofreu e ainda sofre todos os tipos de discriminação. Teve que fazer muitíssimo mais para arrancar um lugar ao sol.

Interessante observar que o caso dela é logo apropriado pelos que defendem a meritocracia como exemplo, quando o que se mostra é muito mais rico em análises.

A meritocracia não reconhece as entradas variadas no sistema. A meritocracia ao invés de valorizar a necessidade de políticas sociais que reduzam as desigualdades na partida, se atem à chegada para poucos, quando o que se deseja é que ela seja para muitos, ou, pelo menos em concepção para todos. Todos deveriam ter o mesmos direitos.

Porém, o caso de Rafaela é ainda mais emblemático, nestes tempos bicudos de ajustes fiscais e de rompimento com as "escadas" e de suspensão de direitos sociais e políticas públicas de inclusão que podem reduzir mais desigualdades na entrada do sistema que reforçam o discurso da meritocracia.

O caso da Rafaela nos traz a comprovação que aquilo que lhe permitiu agora ter méritos foram as políticas de inclusão social e não o inverso.

A medalha nestes casos seriam sempre consequências naturais de muitos outros Silva, Souza, Pereiras, etc.

O sistema que enaltece a Rafaela pela meritocracia é o mesmo que vai deixar morrer milhares com potencial semelhante, por falta de acesso às políticas básicas de renda mínima, bolsas e outros apoios que poderiam reduzir as diferenças, na disputa pelo mérito, que para a grande maioria é apenas o de sobreviver.

Por tudo isto, o caso da Rafaela, com as marcas de sua origem e trajetória, nos traz tantos exemplos e coisas positivas, que a única coisa que deveria ser fortemente evitada - e digo até rechaçada - é este discurso da meritocracia, quando este nega a igualdade de condições para a sua obtenção.

PS.: Atualizado às 12:26: Para incluir a ótima charge do Duke, sobre meritocracia citada no comentário da professora Guiomar Valdez no perfil do blog no Facebook.

5 comentários:

Anônimo disse...

Caro Roberto,

O sucesso da Rafaela da Silva não é fruto das "políticas sociais", e sim de uma ação 100% desenvolvida pelo ex-judoca Flávio Canto que, assim como um número pequeno de ex-esportistas, optaram por criar e desenvolver ações de inclusão social nos esportes que os projetaram.

Nossos governantes (embora não tenha votado em nenhum deles à época) esmeraram-se em "conquistar" a organização da Copa 2014 e das Olimpíadas 2016 com o discurso do legado. Estes mesmos governantes não preocuparam-se em fomentar o esporte, seja na base seja no alto-rendimento, e sim construir as mega-arenas que temos hoje. A história do Pan 2007 se repete...

A meritocracia a que você se refere (de forma pejorativa) é o que distingue o Flávio Canto, o treinador dela - que reconheceu uma oportunidade na pequena criança rebelde, e vários outros, além da própria Rafaela, humilhada e ofendida após Londres 2012, a lutar, se desenvolver e perseguir os seus objetivos no esporte.

Na vida nada vem de graça.

Abraços,

Roberto Moraes disse...

Os "meritocratas" são sempre obtusos.

Políticas sociais sim. E elas podem, são e foram desenvolvidas em parcerias, mas nem por isto deixam de ser políticas sociais. O projeto é de uma ONG, mas as parcerias e as bolsas envolvem os governos.

Mesmo se não envolvessem, a questão é reduzir as desigualdades e fazer inclusão social e isto é política, que se desdobram em projetos, programas e ações. O que o texto disse é que sem os projetos sociais e igualdades de oportunidades não cabe falar em meritocracia.

Evidente que ninguém falou em nada vir de graça, mesmo para estes que enxergam a economia na frente das pessoas. As empresas vivem pendurados nas isenções que quebraram o ERJ em R$ 38 bilhões. É a bolsa empresário.

O treinador da Rafaela viu sim, o potencial dela a partir de um projeto escolar. Além disso, mas recentemente ela e centenas de outros atletas foram incluídos no Plano Medalha, Bolsa Podium e diversos outras para avançar nas competições do esporte de alto rendimento.

Impressiona a obtusidade destes liberais. É para eles que o texto que questiona a meritocracia merece atingir, porque gostam do estilo "self-made-man" e por isso querem transformar as exceções para dizer que quem quiser pode chegar lá.

Vou repetir não para os obtusos, mas para a reflexão mais geral:
"O caso da Rafaela nos traz a comprovação que aquilo que lhe permitiu agora ter méritos foram as políticas de inclusão social e não o inverso."

Anônimo disse...

Parabéns ao anônimo.

Conheço de perto o projeto na Rocinha e NUNCA foi sequer beneficiado ou auxiliado pelo Estado ou seus representantes, exceto em 2014 quando houve intenso trânsito de caçadores de votos que prometiam "ampliação do projeto".

Graças a Vale, IBM, Qualicorp e SporTV o projeto saiu da mente do sr. Canto para ser a realidade que é.

Em uma das minhas passagens pelo núcleo Rocinha, percebia o diferencial em alguns atletas mirins, quando ao bater as 17hs a grande maioria partia para as suas casas e a meia dúzia que ficava até após o horário se esforçavam para aprender um pouco mais, treinar um pouco mais. O melhor exemplo do mérito na prática.

Graças a um ensino deturpado e errático, somente já no fim da adolescência fui de fato compreender o que significava a medalha de "honra ao mérito" que meu pai possuía no quadro e daí então pude compreender do porquê ele chegava tarde em casa e como isso foi fundamental para que conquistassemos nossa casa, comprada com muito sacrifício.

Muito bom seu comentário, caro Anônimo.

Anônimo disse...

Tá certo o professor Roberto, sem políticas sociais não há saídas. As empresas poderiam fazer mais do que fazem só com descontos de impostos. O que interessa é dar apoio aos jovens para que tenham mais oportunidades. A Rafaela Silva me representa.

douglas da mata disse...

Se o patriotismo é o último refúgio dos canalhas, a meritocracia é o primeiro dos fascistas.

Primeira grave, eu repito, GRAVE MENTIRA:

Todos os apoios privados são deduzidos dos impostos das empresas, ou seja, a dinheiro público vem na forma de renúncia fiscal.

Mesmo assim, lá nas ONGs e outras "projetos", mesmo com parte dinheiro público nunca é exigida a Lei 8666, nem os rigores da burocracia estatal. Vale tudo em nome do "projeto", enquanto os hipócritas e cretinos solapam as políticas sociais, fingem que não veem o que se passa no "terceiro setor". Tudo em nome da ilusão de que ali se faz melhor e com menos (pura propaganda).


Segunda mentira: O esforço individual leva ao mérito! Afinal, o que é mérito, como quantificar e quem legitima ou deslegitima a conquista de cada um?

Pelé treinava, se submetia como bom moço a todas as ordens, babou ovo dos militares, ganhou fusca (comprado com dinheiro público) de Maluf, sabia lidar com a mídia e disse para todo mundo que ele era o melhor do século.

Ok, compra a imagem quem quer.

Garrincha bebia, fodia todas as mulheres que encontrava (ou quase todas), sofria toda sorte de preconceito, tinha os joelhos fodidos, gagava para a mídia e ganhou uma Copa "sozinho" (a de 62)...

Pelé era o bom moço que rejeitou sua filha até depois do DNA e da decisão do processo que levou ao STF.

Garrincha nunca renegou nenhum filho, ainda que não tivesse grana para bancá-los.

Mérito é a palavra que inventamos para te tirar todas as oportunidades, e depois, se você, ou alguém, conseguir algo, dizemos que era possível a todos, e a culpa é do "perdedor".

Algo como dar um canivete para um e uma motosserra para outro, e esperar o mesmo desempenho para derrubar uma árvore de 3 m de diâmetro.

Afinal, o que é mérito?

É o primeiro refúgio dos fascistas, o primo-irmão da eugenia.