sábado, dezembro 01, 2012

Fluminenses & cariocas: interior & capital

Não se trata de bairrismo. Muito menos de xenofobia, adjetivo dado não apenas a quem tem ojeriza a estrangeiros, mas a quem pertence a culturas, crenças ou apenas lugares diferentes.

O campeonato de futebol, mesmo sendo estadual, é chamado de Carioca e não de Fluminense, apesar da naturalidade de quem mora no estado, ser homônimo do time de futebol, atual campeão brasileiro.

Aliás, muita gente não sabe, e este blogueiro não sabia até algum tempo, que esta denominação é referente à palavra latina "flumen" que quer se referir a fluvial, dos rios. Já carioca, em tupi significaria "kari iwa" homem branco e "oca" a casa. Assim, o termo carioca se referiria a "casa do homem branco".

Os detalhes são filigranas que servem apenas como ante-sala dos problemas de identidade entre os moradores da capital e do interior em nosso estado, que possuem o mesmo nome de Rio de Janeiro.

O mesmo acontece com São Paulo, onde os moradores da capital são paulistanos e do estado paulistas. Aqui de forma daquele estado todos são genericamente chamados de paulistas, enquanto que na referência externa, nós todos somos chamados de cariocas.

O morador de toda a área metropolitana que vai da Baixada Fluminense ao Leste, incluindo Niterói, São Gonçalo e Itaboraí já se consideram mais cariocas que fluminenses.

Porém, o carioca, desde que a bela cidade deixou de ser capital federal, na década de 60, e depois de ser cidade-estado, com a fusão na década seguinte, ainda não consegue se ver como morador que compartilha o estado onde mora, apenas com as diversidades naturais de todos os estados entre moradores da capital e do interior.

Em 2004, um movimento na capital tentou pressionar por uma "desfusão". Os créditos dos royalties entre outras questões aquietou o debate. Na ocasião escrevi um artigo sobre o tema repercutido na coluna do Merval Pereira em O Globo.

O debate sobre a mudança na legislação que rege a distribuição dos royalties trouxe de forma pontual e tangencial a questão à tona. Ontem, 30/11/2012, o jornal O Globo trouxe um cadernos especial, de 12 páginas: "Especial - Desafios do Rio".

De que Rio o caderno se refere? Só a capital ou todo o estado? O caderno fala de novos projetos, da importância dos investimentos na produção de petróleo e energia. Se refere a gargalos, mas, tudo de forma estanque.

A junção do interior com a metrópole é feita quando se fala da produção do petróleo: "Se fosse um país, estado seria o 18º maior produtor de petróleo". Porém, quando trata dos problemas e apresenta soluções elas são quase que exclusivas da capital e do seu entorno.

Seria importante se pensar o estado como um todo. Não por bairrismo ou coisa que o valha, mas, porque efetivamente (e por variados motivos) vivemos uma inflexão econômica, mesmo que baseada na riqueza do petróleo ou dos royalties, da economia fluminense em direção ao interior. Neste sentido, seria interessante pensar o território estadual de uma forma mais integrada e não a capital somada ao interior.

Não é difícil imaginar que parte dos problemas e das soluções que a capital e o interior buscam possam ser simultaneamente identificados no outro de forma a se suplementarem.

O debate político e ideológico que perpassa o tema pode ser muito bem travado em paralelo - e não cruzado - às discussões sobre a necessidade se aperfeiçoar as políticas públicas para um desenvolvimento menos desigual e mais integrado entre fluminenses e cariocas.

4 comentários:

Anônimo disse...

Professor:

O Rio da Carioca, que dá o nome aos nascidos na antiga Guanabara, está hoje praticamente todo subterrâneo. Levou este nome que o senhor já traduziu porque em sua foz na Praia do Flamengo ficava uma casa dos portugueses (justamente a "casa do branco"). Quem quiser ver um pedacinho dele, vale uma visita ao Largo do Boticário no Cosme Velho. Em minha época de faculdade de arquitetura fiz várias aquarelas retratando aquele belo local.

Quanto à importante questão de pensar o território fluminense como um todo, vale registrar um fato que demonstra o que muitos cariocas ainda pensam sobre o Rio: no programa de televisão do PMDB para o governo do estado, várias personalidades deram seu depoimento em apoio ao então candidato Sergio Cabral. Me lembro de pelo menos duas pessoas que declararam ser o candidato Cabral "a melhor opção para os cariocas".
É isso. Mesmo inconscientemente as pessoas pensam o Rio como a Guanabara. E num programa político que supostamente é feito por pessoas que deveriam saber que não é assim, ainda deixam passar falhas como essa que, se não tiram votos do interior, demonstram que muitos cariocas estão preocupados com o próprio umbigo.

Maria Amelia disse...

Brilhante análise. Gostei muito.

Ralf Manhães disse...

Roberto,

Excelente texto. Infelizmente não temos essa cultura de Estado Fluminense, de cidadão fluminense. O avanço da cultura carioca do Rio capital vem esmagando os resquícios culturais do antigo Estado. Não é só na região do entorno da capital fluminense que isso é notado, conheço muitos macaenses e até msm campistas que se denominam cariocas, alguns por ignorância e outros por falta de identificação com a terrinha ou por reproduzirem a mídia da capital. Falta a identidade de cidadão fluminense, e creio que uma das poucas cidades que ainda resiste a essa opressão cultural midiática é Campos, seja por bairrismo, pela história própria ou pela distância da capital. Como polo regional Campos teria a possibilidade/dever de discutir esse tema, de recuperar a a identidade cultural do Norte Fluminense. Parabéns por tocar nesse tema.

Rodrigo Roger disse...

Fluminense - cidadão nascido em qualquer cidade do Estado do Rio de Janeiro

Carioca - cidadão fluminense nascido na cidade do Rio de Janeiro(capital)

Iguaçuano cidadão fluminense nascido na cidade de Nova Iguaçu

OBS.: todo carioca é fluminense,mas nem todo fluminense é carioca