sexta-feira, abril 25, 2014

A crise no transporte público e a passagem de 1/4 de século em Campos

O texto abaixo foi publicado aqui pelo blog há uma semana, já na entrada no período de Páscoas, recessos e feriados. Passado estes dias e sendo retomada a vida cotidiana, em meio aos problemas descritos, o blog decidiu republicar o artigo.

22 questões para refletir a grave realidade do transporte público e sua relação com o poder e a política em Campos

O número antes de ser interpretado como uma provocação é apenas uma coincidência e reflete a enorme teia de questões, que embora extensa e cruzada, pode ser facilmente compreendida. E, mais que isto, comprovada e corrigida. Vamos por item para facilitar a exposição e a leitura do que chamo como reflexões iniciais sobre o assunto:

1) Há a necessidade de se aprofundar as razões que levaram o transporte público em Campos a chegar ao ponto caótico que se encontra hoje. Há que se compreender quais e quem são os possuem interesses neste processo.

2) O problema é antigo, mas, estava circunscrito e tinha uma outra dimensão. A urbanização acelerada, embora, já percebida desde a década de 90 de forma acentuada, começou a ganhar os contornos atuais, ao final da primeira metade da década passada (pelos idos de 2004/2005).

3) Assim, cresceu a demanda pelo transporte urbano, quase na mesma proporção em que reduziu a demanda para o complexo e variado transporte distrital.

4) O fenômeno coincide com a entrada das vans neste circuito de serviços de transportes chamado de alternativo, nascido para tender demandas dos bairros afastados até o centro comercial na área urbana. Aos poucos se expandiu para os distritos com dezenas, depois centenas de vans vindos de fora da região.

5) Outro ciclo deste processo se iniciou em 2009, quando a prefeita eleita Rosinha começa a colocar em prática o chamado transporte cidadão, a passagem de um real. O caos dos primeiros dias foi sendo administrado com o "estratégico" cadastramento da população dos bairros urbanos e dos distritos.

6) A decisão foi os poucos produzindo mudanças previsíveis para quem pensa a cidade e se preocupa com sua realidade e com os seus cidadãos. Novas possibilidades de mobilidade geram novos fluxos, relações de trabalho, mudança de hábito de consumo, etc.

7) Isto significou, de um lado oportunidades de trabalho (positivo) pelo barateamento das passagens e o ir-e-vir diário entre o distrito e o centro e de outro (negativo), o esvaziamento ainda maior da população distrital, em função das novas relações sociais geradas por estas mudanças.

8) Além disso, o comércio distrital foi se reduzindo e sendo paulatinamente amofinado, até à sua extinção, diante das facilidades geradas pelo fluxo diário (ir-e-vir) das pessoas trabalhadores e estudantes, que aproveitando a passagem a valor reduzido de (R$ 3, 4, 6, 7 para R$ 1) em qualquer trecho em direção ao centro da área urbana.

9) Os geógrafos chamam este fenômeno de fator de aglomeração que tende a gerar adensamento e concentração.

10) Na maioria das cidades é um fenômeno com características bem impactantes do que num município como Campos dos Goytacazes com 4 mil km². Não há nas regiões Sudeste, Sul e Nordeste município com tamanha área, apenas nas extensas regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil.

11) Além da grande área territorial, o município de Campos tem enormes distâncias entre seus limites territoriais. Próximas de 120 km e 130 km (por exemplo distância entre Morro do Coco e Serrinha -direção norte-sul - ou Farol e Santo Eduardo - na direção leste-oeste.

12) Junto deste processo a partir também de 2005 há um fenômeno nacional com repercussões locais, muito significativas, especialmente, em cidades-pólo regionais como Campos, a questão econômica gerada pela inclusão social (programas de renda mínima), redução gradual do desemprego, crescimento de renda com economia informal, etc.

13) O fato gerou, quase naturalmente, o aumento da mobilidade e do fluxo de pessoas, superior à realidade anterior. Pessoas com renda, interesses em trabalho, estudo, sonhos, etc. demandam mais transportes para locomoção, efeito este que se soma aos citados anteriormente.

14) Mais renda, mais consumo, consumo com maior sofisticação, significando novamente centralização pela procura do comércio na área urbana central onde este produtos são encontrados. Agora o efeito não apenas ligado ao fator de aglomeração, mas também ao fator de dispersão do consumo, conhecido dos planejadores urbanos.

15) Outra consequência de mais trabalho e renda foi a ampliação da frota de veículos licenciados no município. Em 2005, eu tive a oportunidade de novamente alertar as autoridades, em atuação no Conselho Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo que a razão de crescimento do número de veículos licenciados era de mais de 5 mil por ano, fora, os "capixabas". Na época donos de concessionárias de veículos informaram a este blogueiro que, na ocasião de cada dez carros novos comprados, sete eram emplacados como sendo do ES. Mais este fato ajudou a entupir as nossas estritas ruas e avenidas de carros. Os engarrafamentos de raros passaram a ser rotina e não apenas os carros ficam engarrafados, mas também os ônibus. Assim, eles andam menos e as pessoas esperam mais para pegá-lo e muito mais para chegarem espremidas aos seus destinos.

16) As autoridades sabiam e continuam sabendo disto. Eu mesmo tenho registrado aqui no blog e em outros espaços, textos e estudos com estas análises e alertas. Diversos outros estudiosos vêem fazendo o mesmo. Ainda assim, o descaso permaneceu durante todo este tempo.

17) A administração atual apostou que o subsídio da passagem a um real e a nova e ampliada "fonte de receita" das empresas de ônibus seriam suficientes para dar conta do problema. Deste, 2009, a prefeitura colocou nestas empresas quase meia centena de milhões de reais. Os resultados são pequenos diante da realidade modificada e resumidamente descrita acima.

18) A gestão atual apostou ainda nas vans como respiro para este sistema, ao mesmo tempo, que, da mesma forma que na área de obras públicas do município, passou a se articular com grandes empresas de ônibus de fora para avaliar a possibilidade atacarem o problema no atacado. Chegaram a começar a este processo com a Viação Itapemirim atendendo a ligação para o Farol durante o verão. O esquema com as vans repetiu que já havia ocorrido na região metropolitana fluminense, de forma especial entre 2003 e 2006.

19) O desdobramento natural disto foi “encomendar” a gente ligada a estas empresas o desenho de um edital de licitação que valorizasse as empresas grandes e pudesse criar condições para as empresas locais se juntarem de forma depende às maiores para continuarem a operar no município. Da mesma forma que nas licitações de obras públicas, onde as grandes empresas e consórcios ganham as licitações e terceirizam para as construtoras menores locais. A prefeitura articulou e imaginou que as pequenas empresas locais aceitariam o processo da mesma forma que as empreiteiras locais. Parece que não e a luta contra o edital de licitação que começou com questionamentos de técnicos e advogados com conhecimento de direito público foi aprofundada por gente ligada às empresas de ônibus local em acompanhamento do processo no Tribunal de Contras do Estado (TCE-RJ).

20) Difícil acreditar que a população mais esclarecida no município não consiga compreender o desenrolar deste processo.

21) Também não é difícil estimar que há interesse em deixar conflitos se instalarem para diante do Ministério Público Estadual e do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) forçar a solução que interessa neste instante, tanto sob o ponto de vista político para colocar responsabilidades em outros, quanto, de vantajosos contratos com grandes empresas. Acompanhem os desdobramentos que se seguirão para confirmar ou não a hipótese acima.

22) Diante de todo este quadro, não há como não repudiar o pouco caso dos que dirigem há mais de 1/4 de século, desde 1989, de forma direta ou indireta, este município. Eles conhecem bem toda esta realidade. Efetivamente, não parece, mais uma vez, existir muito interesse em alterar e modificar esta realidade do transporte público no Município de Campos dos Goytacazes. Mais uma vez, percebe-se interesse sim, em manter a cidade como reduto eleitoral e depois, como uma espécie de capitania hereditária, e ainda, como fonte e base poder político e econômico, interessada em seu grande orçamento (caixa), sendo o 14º maior orçamento entre as 5,5 mil cidades brasileiras, em função das receitas dos royalties do petróleo.

Conclusões:
Como se vê o problema não surge assim de uma hora para outras. De mais a mais a grande maioria esmagadora dos que estão aí trabalhando na gestão sabem de tudo isto muito bem. Ou teriam a função e o salário para isto. Parece que que há uma leniência, um descaso em se dedicar às questões do município (visto como província) em função de outros e sabidos interesses. É importante que a população como um todo reflita sobre isto.

Eles não dedicam tempo e estudos para ler estes cenário da realidade municipal (apenas brevemente exercitada acima) para a busca de soluções parciais e principal para reduzir o sofrimento da população. No máximo observam onde e de que forma eles podem manter as relações econômicas que lhes interessam, junto do controle político absoluto sobre o eleitorado em seu reduto.

O caso do transporte público não é único (pode-se citar a educação e a saúde) com problemas pendentes e graves necessitando que a gestai tenha olhar e ação de quem cuida e não de quem usa a população. O município tem dinheiro, mas, tem escasso corpo técnico (há o que se tem chamado de déficit de governo) e zelo e amor pela nossa terra e pelos campistas.

A disputa eleitoral estadual é um direito, mas, falando de forma cidadã, não há como desejar voos mais altos, se o dever de casa não está sendo cumprido, tendo o município tanto dinheiro e condições de assim fazer. Caso contrário, daqui a pouco anos, o discurso em relação à outra e mais alta esfera de governo o discurso se repetirá.

Diante dos graves problemas graves que afligem a nossa população que continua diariamente sofrendo, agora ela começou a se manifestar, porque já identificou que sem pressão não haverá solução rápida e nem adequada.

Este texto tem a simples função de juntar diversas pontas no campo técnico e político, evidentemente sob a minha ótica, mas em diálogo com diversos interlocutores, e entendendo que não há discussão e nem solução sem as duas abordagens (técnica e política), para um maior enfrentamento da questão.

É oportuno ainda que atentemos para o fato de que necessitamos ainda sair do debate polarizado e maniqueísta, raso e superficial, que não ajuda a entrar no âmago e no mérito destas graves e urgentes questões.

Junho de 2013, com os debates e manifestações nascidas das demandas de transporte e mobilidade urbana retornou em 2014, mais cedo em Campos do que em outros locais.
PS.: Atualizado às 10:50 de 26/04/2014 para correção de alguns períodos.

3 comentários:

Anônimo disse...

Num país com inflação na média de 5% ao ano, dificilmente algum trabalhador, ou, empresa, suportaria ficar desde 2009, sem ter reajuste. Enfim, o subsidio, a complementação da prefeitura, para com as passagens, para com essas empresas de ônibus, não ocorre desde a implantação da passagem de R $ 1,00. Ninguém aguenta essa situação. Por esse motivo, rosinha, estaria sendo responsável pelo sucatemento dessas empresas de ônibus. Enfim observemos, e, fiquemos atentos, quanto ao tratamento que rosinha, dará as novas empresas que assumirão o transporte coletivo, em Campos. Será que o subsídio, continuará valendo os valores de hoje; ou será que sofrera um gêneroso reajuste, por parte da prefeita ? Suspeita-se que tais empresários sejam "laranjas". Desse grupo podemos esperar de tudo.

Anônimo disse...

O caos se completou nas empresas de ônibus . Greve dos rodoviários por tempo indeterminado. Querem entre coisas, aumento de salário. Como aumentar salários com o preço das passagens, congelado ? Enfim, agora reflitam, a prefeita quer, ou, não quer sucatear as empresas de onibus ? Qual a intenção dessa prefeita com essa omissão ? Suspeita-se que empresários laranjas de certo grupo político, estaria com uma mega frota de onibus, para assumir o transporte em Campos.

Anônimo disse...

http://www.blogdopudim.com.br/?p=19239