segunda-feira, fevereiro 04, 2013

Nem todos apreciam a redução da taxa de desemprego no Brasil

Esta postagem tem a função apenas de aguçar o já atento senso do leitor-colaborador deste blog. A grosso modo falando seria difícil imaginar que algum brasileiro não estivesse comemorando as baixas taxas de desemprego no Brasil.

Porém, em economia os interesses são sempre muito grandes e diversos. Assim, o blogueiro localizou numa matéria do caderno de economia de O Globo, uma entrevista com um "especialista em mercado de trabalho" José Márcio Camargo, que é da Opus Investimentos, que ao falar sobre qualificação profissional soltou as pérolas:

"Com taxa de desocupação em 5,5% a abertura de mais vagas pode contribuir para a elevação dos preços e dos bens e serviços".

"A taxa de desemprego está muito abaixo do sustentável, tanto do ponto de vista de pressão inflacionária quanto da competitividade".

Estando atento a estas observações é que se vê mais claramente que, em se tratando de políticas públicas, há sempre que se avaliar a quem ela se destina e a quem a política pública pode beneficiar.

PS.: Atualizado às 13:42: Apenas para ajustar o texto.

6 comentários:

Ranulfo Vidigal disse...

Caro Roberto, por trás do raciocínio do "analista" está a suposição de que aumentos reais de salários, acima da produtividade da economia geram compressão da taxa de lucro dos capitalistas e, assim sendo, redução das extraordinárias margens de ganhos das empresas e seus acionistas. Estes "analistas" não aceitam a recuperação recente do salário mínimo e se preocupam muito, quando o exército de trabalhadores sobrantes tende a ficar tão pequeno, que não consegue regular ( para baixo) o valor médio dos salários dos trabalhadores. A título de exemplo, basta lembrar que a Inglaterra aboliu a diferença salarial entre homens e mulheres em 1970, enquanto aquí na Casa Grande, as diferenças ainda persistem.

Roberto Moraes disse...

Bem observado Ranulfo,

Sem querer ser maniqueísta, mas, sem poder deixar de comentar, há os que trabalham pela inclusão social e melhorias das condições de vida e redução das desigualdades e os que sonham e trabalham pelos exércitos de reserva como reguladores dos baixos salários em nome desta tal produtividade nunca repartida.

Sds.

Roberto Torres disse...

O analista econômico é aquele cara que quer que interesses específicos de uma classe social sejam percebidos como imperativos incortornáveis da economia como um todo.

Fosse o caso de inaugurar guilhotinas,não haveriam melhores candidatos.

douglas da mata disse...

Meus caros, Roberto Moraes, recentemente me presenteou com um livro chamado O Enigma do Capital (e as crises do capitalismo), de David Harvey, da Boitempo.

A percepção de todos é correta: Trata-se de como disse Torres de criar ambiente ideológico para justificar o que disse o Vidigal, completado por Moraes.

Os fluxos de capitais gerados como excedentes nos países que emitem moeda e dívida procuram taxas de juros convidativos para apreciar moedas nacionais(sem qualquer regulamentação), ganhar na arbitragem(mercado cambial, onde a banca ganha sempre, porque aposta nas duas posições: alta e queda),deprimir a produção nacional e achatar a renda para aumentar as remessas das transnacionais.

Dentro de suas sedes(países centrais), a renda da classe trabalhadora vai perdendo renda para alimentar a acumulação, com raras exceções como o Brasil, e não à toa, novo alvo dos "analistas".

A solução da banca para a depauperação da renda, quando enormes exércitos de reserva se formam é criar alavancagem do consumo pela moeda fictícia(crédito), que possibilitam outros ganhos na proliferação deste mercado de arbitragem de riscos alucinantes!

Cada ciclo, quando estes cadeias irreais estouram, o capital volta a origem, não sem antes devastar Estados e orçamentos, empregos e vidas!

E o remédio: mais austeridade fiscal, mais superávit para alimentar outros "perus de natal"(como diz Delfim).

O efeito disto tudo sobre a Democracia é óbvio, mas não perceptível pela maioria: Total controle da vida política pelos estamentos econômicos que assumem ares de cânones inquestionáveis.

Vejam que o juro serve para tudo: desde o combate a inflação até para a crise cíclica!

E por que? É o juro que alimenta o fluxo de capitais!

Assustador.

Roberto Moraes disse...

Douglas,

Você foi conciso e preciso.

Eu só completaria no comentário sobre efeito disto tudo na democracia, analisando as artimanhas para o controle da informação e formação do discurso único através das mídias.

Quais os espaços para reformar um sistema como este já que não acredito na hipótese da revolução?

douglas da mata disse...

Roberto, o autor remete a soluções, mas não cheguei lá ainda.

Mas eu tinha, e tenho, minhas intuições pessoais, que consegui lapidar com a leitura o ferramental teórico oferecido por ele:

Se o fluxo é o problema, ou seja, o que alimenta o sistema, é preciso interrompê-lo, e isto só pode ser feito com a recuperação das soberanias nacionais, através do poder tributário sobre estes fluxos.

Na outra ponta, os setores comprometidos com esta mudança têm que alterar a submissão de orçamentos públicos a estes fluxos, por paradigmas construídos para servi-lo(superávits primários, juros para conter inflação, etc).

E por fim, os países que hoje apontam para o deslocamento do eixo central deste fluxo devem mudar o padrão que o orienta, ou seja, a moeda referência(dólar/libra/euro).

Não é mais possível suportar no mundo inteiro os efeitos do déficit dos países que se auto-endividam em moedas que eles mesmos emitem.

Mas este processo é lento, doloroso e talvez mais complicado que uma ruptura institucional aventada por você.

Parte destes fluxos têm origem para-estatal (elisão fiscal) e contra-estatal (crime), e se misturam poderosamente. Mexer nestes nichos de poder não é simples, e nenhuma sociedade ficará impune.

Veja o "mercado de arte", por exemplo. Ou denominações religiosas, ou o ramo imobiliário.

Há poucos meses a promotoria de NY passou a mão na cabeça do HSBC(inglês), pego lavando narco-dinheiro mexicano, e sob o "argumento" da estabilidade do sistema financeiro estadunidense e mundial. O maluco nisto tudo é que é verdade, ou seja, os narco-dólares, de fato, deram estabilidade estrutural ao sistema financeiro desde 2008.

Então, as mudanças serão mais violentas e instáveis que as revoluções como conhecemos, que ao menos, tinham atores conhecidos, hora, e dia para acabar!

Ah, e claro: o sistema político deve reunir as condições de mudança de estamentos normativos nos países e entre eles, como forma de determinar que os para-sistemas de apoio ao fluxo sejam alterados:

01- oligopólios de mídia;

02- latifúndio;

03- especulação urbana imobiliária;

04- desigualdade contributiva(tributária);

05- transferência de renda para compensar achatamento salarial, e perdas pela automação, transferindo parte dos ganhos de produtividade ao trabalho, ou a mão-de-obra excedente.

06- fim do sigilo bancário.

07- um tributo sobre movimentação financeira, tipo CPMF, para "marcar" qualquer transação, e permitir, por uma simples regra de três, saber o volume total transferido de lá para cá.

Bom, estas são só as minhas impressões. Não são certezas.

Eu creio que, paradoxalmente, o capitalismo nunca esteve tão forte, mas ao mesmo tempo, tão ameaçado, porque seu núcleo central não mais reside na interação de múltiplos sistemas de produção, com tarefas divididas ao redor do mundo.

A produção é, agora, acessória!

Ele virou fim em si. Nem Marx imaginaria que a dialética de superação viesse de forma tão antropofágica.

No entanto, como eu disse, vai ser um processo doloroso e lento.