sexta-feira, maio 22, 2015

A China, o Açu e seus significados dentro do acordo bilateral

Além da ferrovia transoceânica entre os Portos do Açu, no Rio de Janeiro e Matarani, no litoral do Pacífico, no Peru, há outras negociações que envolvem uma das pontas deste acordo Brasil-China.

Pelo acordo assinado na terça-feira, a China se comprometeu a realizar em um ano (ate maio de 2016), os estudos complementares sobre a viabilidade técnica, econômica e ambiental do projeto da ferrovia com extensão de 4,7 mil km, sendo 4,4 mil km, em território brasileiro.


A ponta do Pacífico na ferrovia deve sair primeiro
Como o blog já comentou aqui e aqui, consideramos que se tudo caminhar como partes desejam, eu acredito que a saída pelo lado do Pacífico sairá bem primeiro que a ligação com o Porto do Açu.

O raciocínio para essa conclusão é simples. Poderíamos, de forma similar ao caso da ligação da China com a Europa, em que dá denominação histórica da Rota da Seda, passarmos a chamar esta como sendo a Rota da Soja.
Infográfico da FSP em 13-05-15

A Rota da Soja irá se estabelecer com a ferrovia transoceânica, em primeiro etapa, porque a ligação da área de produção do agronegócio fica mais próxima (cerca de dois mil km - caso da distância Cuiabá até Porto de Matarani) litoral do Peru, do que do Porto do Açu.

Embora, no caso da soja de Tocantins e Goiás, as distâncias entre o litoral do Atlântico e Pacífico sejam quase iguais, mas, aí também a vantagem da saída pelo Pacífico seja maior, porque grande parte da exportação seja para a China e Ásia, portanto com rota bem menos desde o porto do Peru, do que com pelo Pacífico, no Açu.

O caso do transporte do minério, este que sai do Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais fica mais próximo do Porto do Açu, muito embora, a distância depois a ser percorrida de navio até a Ásia seja maior pelo Açu, do que pelo Peru, no Pacífico.

Porém, com o minério de ferro cotado abaixo dos US$ 60, tanto um lado quanto outro, ampliam a pressão sobre o peso da logística de transporte desde o ponto de sua extração ao local de seu beneficiamento. Assim, não é simples, concorrer com a mineradoras australianas, e desta forma, só um bom estudo de viabilidade econômica para mostrar as oportunidades e os gargalos.

Outros negócios do Porto Açu com os chineses
Há que se observar que nos negócios Brasil-China, além do modal ferroviário, a Prumo Logística Global S.A. que controla do Porto do Açu participou ativamente da reunião acontecida no início da semana no Palácio Itamaraty, em Brasília, do encontro do Conselho Empresarial Brasil-China, entre empresários chineses e brasileiros.

Na ocasião, segundo matéria do Valor Online, o presidente (CEO) da Prumo, Eduardo Parente, entregou cerca de 80 folders com informações sobre o Porto do Açu, visando captar projetos para a área que a empresa possui junto aos seus dois terminais. Na ocasião também foi dito que "mais de uma dúzia de companhias chinesas esteve visitando o Açu: se tudo for concretizado a brincadeira começa na casa de centena de milhões".

Foi também informado que os chineses se mostraram interessados em outros tipos de acordos que passam por assumir fornecimento e montagens de estruturas para o porto, em troca de participações acionárias nos negócios.

T Mult junto do Terminal 2 do Porto do Açu
Fonte: imagem aérea da empresa em maio de 2015.
Entre os casos foram citados ainda parcerias discutidas para trocar serviços de dragagens do terminal de petróleo e minério de ferro (T1) para aumentar a profundidade de 19 para 24 metros e assim poder receber maiores embarcações. A dragagem dos canais de atracação é um tipo de atividade que exigirá um esforço quase permanente no Porto do Açu. Outras parceria foram conversadas para o fornecimento e montagem de estruturas do terminal de contêineres": no T-Mult, junto do Terminal 2.

Em outra direção, do Brasil (Açu) para a China, se decidiu a saída da montagem de um projeto naval. Trata-se da integração dos módulos dos FPSOs P-67 e P-70, saíram do Consórcio (joint-venture) Integra, formado pela OSX e pela Mendes Jr. que tem uma base de montagem junto ao terminal 2 do Porto do Açu e que agora vai ser feito pela Chinese Offshore Oil Engineering. O contrato inicial, avaliado em US$ 1,8 bilhão. As embarcações, unidades replicantes que serão instaladas nas áreas de Lula Norte e Iara Horst, no pré-sal da Bacia de Santos. (Fonte: PetroNotícias - 22/05/2015)

Os interesses e as parcerias chinesas pelo mundo: da produção ao consumo
O blogueiro identificou em sua pesquisa em portos da Europa, Espanha, Holanda e Bélgica que os chineses operam por concessão muitos terminais de portos importantes como Roterdã, Barcelona, Antuérpia entre outros.

O objetivo é simples: facilitar a movimentação de mercadorias que interessa ao mercado chinês tanto para as suas exportações, quanto para importações. Assim, a China que já possui grandes navios para as trocas comerciais, operam toda a logística de cargas, desembaraço aduaneiro, o recebimento, estocagem e distribuição em ZAL (Zona de Atividades Logística).

As ZALs junto aos portos, possuem diversos grandes galpões que, no caso espanhol, também estão articulados à ligação com o consumo com redes de lojas em diversos e bem localizados quarteirões. As lojas são montadas em estruturas similares e administradas por casais também de jovens chineses.

É possível que o desenho que esteja sendo pensado para o Açu possa ser semelhante. Os chineses legalizam seus negócios e assim, fazem incrivelmente, um processo em que operam as três etapas do circuito: produção-circulação-consumo, também chamada da tríade marxiana que analisa e interpreta a formação do valor no modo de produção do sistema capitalista em que vivemos.

Assim, os chineses trabalham com uma lógica em que a etapa da circulação das mercadorias tendem quase à zero aproximando de forma quase inimaginável há alguns anos, a etapa da produção e do consumo.

Desta forma, os chineses operam uma cadeia de valor que os permitem garantir e controlar os mercados na ponta do consumo e não apenas produzir com altíssima produtividade na China.

Com a atuação chinesa cada vez mais forte também na logística de transportes, onde constroem grandes navios conteineros a custos baixos em seus estaleiros, e agora, também participando da infraestrutura e da operação portuária em portos importantes no mundo, a China amplia imensamente a sua presença e as suas vantagens competitivas mundo afora.

Assim, também, simultaneamente, consegue manejar áreas estratégicas do comércio mundial entre as nações e ainda, se necessitar para enfrentar concorrência em cada uma das três etapas, pode transferir ganhos ou tarifas entre as três partes do circuito.

Capitalismo de Estado e seus enlaces
Observar a relação destes fenômenos da Economia Global e como ela já interfere na economia regional é hoje um dos desafios de nosso país e estado. Ao ler com mais atenção a lista dos 35 acordos firmados na relação bi-lateral China, se observa perfeitamente qual a linha adotada pelo capitalismo de estado chinês que organiza e hierarquiza as suas linhas de atuação.

A China assim avançou de seus interesse básico anterior por recursos minerais, energia e alimentos para outras áreas de infraestrutura que são as bases das cadeias de valor que poderão à frente ser expandidos com mais facilidade.

Desta forma a China, também cria possibilidades de atender os interesses do Brasil em seu esforço de inserção global e de entradas nestas cadeias de valor. Porém, sendo uma economia menos centralizada que a chinesa e lidando com tantos interesses, é difícil imaginar até onde a visão estratégica não pode ser comprometida com a captura de nossos excedentes ao se abrir para estas parcerias, mesmo que inicialmente seja exclusivo de dinheiro de fora investido aqui.

De outro lado com uma elite econômica nacional pouco vocacionada a ousar, fazer e empreender o novo, o caso da articulação Brasil-China, parece encaixar com uma luva, na hipótese em que as relações governo-governo e setor produtivo (com seus similares em ambas as nações), parecem ampliar a base capitalismo de estado (nas duas pontas) com seus enlaces (capitalismo de laços, Lazzarini, Sérgio, 2010) nos negócios que estão se mostrando nos acordos firmados.

É necessário continuar a ampliar a investigação sobre este fenômeno para sair do debate superficial seja no campo da política, da economia e mesmo da planejamento e do desenvolvimento regional. Este caso reforça a posição de que é cada vez mais difícil analisar a conjuntura sem uma observação global, considerando estas etapas como as bases mais contemporâneas da reestruturação produtiva mundial e da expansão do modo de produção capitalista.

O blog e o blogueiro aguardam críticas, comentários que ajudem ao aprofundamento das análises sobre o assunto. A conferir!

PS.: Atualizado às 14:04: Para pequeno acréscimo.

3 comentários:

douglas da mata disse...

Há uma outra questão:

Uma parte da ferrovia, chamada de nova, já existe, e dependendo da bitola dos trilhos, o que virá será uma interligação de ramais que antes não se comunicavam(no lado brasileiro).

Máykon Leite disse...

Este traçado que você se refere na imagem já foi alterado, a ferrovia hoje passará por (cidade e população)
Uruaçu GO 36.949
Barro Alto GO 8.701
Brasília DF 2.562.963
Cabeceira Grande MG 6.453
Unaí MG 77.565
Brasilândia de Minas MG 14.226
Pirapora MG 53.379
Várzea da Palma MG 36.329
Corinto MG 23.901
Cordisburgo MG 8.667
Baldim MG 7.917
Lagoa Santa MG 52.526
São Gonçalo do Rio Abaixo MG 9.782
Santa Bárbara MG 27.850
Ponte Nova MG 57.361
Viçosa MG 72.244
Muriaé MG 102.074
Itaperuna RJ 95.876
Cardoso Moreira RJ 12.540
Campos dos Goytacazes RJ 472.300

douglas da mata disse...

Valeu, Máykon.